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Eu nunca entendi a lógica que você criou para jogos de tabuleiro, principalmente quando envolviam a sua preciosa faca, ou adaga como você gostava de chamar

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Eu nunca entendi a lógica que você criou para jogos de tabuleiro, principalmente quando envolviam a sua preciosa faca, ou adaga como você gostava de chamar. Se eu ganhava você fazia um corte no meu braço pois não aceitava perder, mas seu eu perdia você me cortava da mesma maneira como se fosse um brinde.

Não sei quem te traumatizou mais, sua mãe, seu pai, sua madrasta, sua avó ou os malditos brinquedos, eu só sei que meus traumas não se comparavam com os da sua infância. Você conseguiria esquecer da fábrica se aquilo não ouvesse acontecido?

MALDITOS! MALDITOS! MALDITOS! BRINQUEDOS MALDITOS! VOCÊS MACHUCARAM MEU TETE! MALDITOS!

Minha crise de asma atacou hoje porque você trouxe alguns brinquedos cheios de poeira, então você simplismente surtou achando que eu ia morrer e culpou os pobres brinquedos. Agora eu estava num canto da cama abraçando meu travesseiro, enquanto eu observava você quebrando violentamente os brinquedos. Você estava os amaldiçoado com vários nomes possíveis, parecia estar realmente furioso com eles.

Tudo que eu precisava era da minha bombinha de asma e cinco minutos em silêncio, mas ao que parece você desconhecia a existência da famosa bronquite asmática — doença hereditária, créditos a minha falecida mãe.

— Fogo, gritos, brinquedos, mamãe, fábrica, papai, quer brincar Tete? Tete não pode brincar com brinquedos defeituosos, brinquedos defeituosos devem ser DESTRUÍDOS! — Ele joga uma boneca de porcelana na parede, que se espatifou em cacos pelo cômodo. — MALDITOS, BRINQUEDOS MALDITOS! NINGUÉM QUER BRINCAR COM DEFEITUOSOS!

Dessa vez ele começou a pisar com tudo em outras bonecas, as quebrando em vários pedaços de diversos tamanhos. Essa bipolaridade dele é realmente sinistra, nunca se sabe quando ele vai mudar — os brinquedos só estavam um pouco empoeirados, ele não precisava ser tão agressivo.

— Mamãe dizia que ninguém gosta de brinquedos defeituosos, eu sou defeituoso Tete? SOU? — Ele grita logo soltando uma espécie de rugido de raiva depois, quando todos os brinquedos já estavam quebrados ele finalmente me olha. — Ou será que nós dois somos defeituosos Tete? É por isso que ninguém brincava conosco?

Eu provavelmente infantaria em saber que esse maníaco me conhecia desde pequeno, mas adivinha? De novo minhas emoções pisavam na minha razão, me fazendo não pensar direito.

Os olhos intimidadores do garoto se encontraram com os meus, ele estava bufando de raiva. Sua respiração estava desregulada, seus cabelos que sempre permaneciam arrumados estavam desordenados. Sua expressão caótica não suavizou nem por um mínimo segundo, com um passo na minha direção meu coração começou a acelerar.

— Tete, eu ainda quero brincar — o moreno disse dando passos pesados na minha direção enquanto segurava o cabo da adaga com força, olho para a faca já sabendo o que o maior faria.

CARTAS! — Berro tomado pelo desespero fazendo ele me olhar surpreso mas ao mesmo tempo confuso. — Vamos jogar cartas! Que tal? Vai ser legal! Cartas não tem defeitos! Cartas são legais, não é Jungkook?

Longos minutos em silêncio vieram a tona mas sumiram graças a uma risada maliciosa, que invadiu meus ouvidos, ele estava gargalhando como se eu dissesse a coisa mais engraçada do mundo — parecia que eu era um piadista profissional fazendo um stand-up elaborado.

Eu nem imaginava que estava chamando uma cópia do coringa para jogar baralho, o rei de copas estava rindo da minha tentativa de não levar uns cortes.

— CARTAS, copas, espadas, paus e ouros não se comparam ao coringa — ele começou a cantarolar me dando as costas e indo na direção da porta. — Quando você joga com o coringa tem que por um sorriso no rosto Tete! Perdendo ou ganhando, nunca deixe de sorrir! Ou então o coringa vai por um sorriso no seu belo rostinho! Há Há! O papai amava cartas!

Ele começou a girar igual a um pião gargalhando, o barulho dos cacos de brinquedos frágeis no chão soavam todas as vezes que você pisou por cima deles com seu coturno preto.

— Vamos jogar todos os tipos de jogos com CARTAS! Você merece brincar Tete! Nós merecemos brincar, Há Há!

— Vamos sim, que tal você ir lá pegar as cartas ein? Não podemos perder tempo! — Sorrio tentando disfarçar meu nervosismo.

— Certo, certo! Você merece brincar Tete, brinquedos defeituosos tem que ficar com outros brinquedos defeituosos! — Ele balançou a cabeça de um lado para o outro de uma forma esquisita, como na síndrome de Tourette.

Mais uma risada ecoou pelo quarto antes dele sair saltitando pela porta, apenas suspiro fundo soltando todo o ar que eu nem sabia que estava prendendo em meus pulmões. Finalmente eu tenho paz aqui.

De relance pude ver um dos cacos de porcelana da boneca, aquilo poderia ser útil no futuro. Estico meu corpo na beirada da cama pegando um caco afiado e logo decido guardá-lo escondido debaixo do meu travesseiro, se eu conseguir cortar a garganta dele com isso posso dar um jeito de fugir.

Mas antes eu tenho que me livrar dessa coleira.

Já tinham se passado três semanas desde que eu cheguei aqui, não faço idéia do que está acontecendo no mundo lá fora. Meus irmãos? Será que eles estão me procurando? Até onde eu sei, o irmão do namorado da minha irmã é polícial, eles devem estar me procurando certo?

Antes do meu pai virar alcoólatra e sumir do mapa ou da minha mãe morrer, nossa família vivia jogando baralho — seja para passar o tempo e/ou para fazer disputas apostando nossas tarefas domésticas. A vida era ótima e admito ter aprendido uns bons truques que podem me ajudar, se eu reencontrar o Dylan tenho que agradecê-lo por me ensinar a roubar no Truco.

— Para de ser besta garoto, você tem que agir! — Falo para eu mesmo enquanto pensava numa maneira de escapar, meus traumas de infância me deixam incapaz de pensar em situações que estou sob pressão.

Era só esquecer tudo o que eu passei por um momento certo? Eu não consigo pensar em nada nessas condições, meu físico está até bom comparado ao meu psicológico que está se fudendo mais a cada segundo.

𝐋𝐮𝐱𝐮𝐫𝐲 → ᴛᴀᴇᴋᴏᴏᴋ ' Onde histórias criam vida. Descubra agora