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[2.228 palavras]

      Sem cores, é assim que me vejo

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      Sem cores, é assim que me vejo.

Sem tantas cores no mundo que façam com que minha dor diminua. Isso deixa tudo menos... Doloroso. É incerto explicar.

Hoje faz 24 horas que me despedi dele, meu pai, e ainda lembro-me do ar rarefeito que impregnou o cemitério enquanto todos pareciam não notar. Eles estavam focados demais no defunto uniformizado, que descia lentamente no caixão, para perceberem a órfã respirando com dificuldade.

Os enterros, em alguns lugares, são celebrados com champanhe e música, porque o fim não é exatamente sinônimo de tristeza a eles, diferente de mim. Uma sobrevivente.

Todos os que vieram em sua despedida tinham, de certa forma, conhecido o homem que um dia ele foi. Homens, mulheres, idosos e até mesmo algumas crianças acompanhadas de seus familiares. Ele era um cara que fazia o bem sem ver a quem, trazia comida para casa, brincava comigo e dançava com mamãe antes de dormir. Na infância, a criançada se divertia quando ele vinha me buscar. Fingiam que seu corpo era uma montanha e o escalavam, papai nunca se importou já que conseguia carregar todos.

— Meus pêsames — todos me dizem. Pessoas que nunca vi, que nunca verei, me saúdam com pesar e pedidos lamentosos.

— Ele foi um grande homem. Deve se sentir honrada e com orgulho — dizia outros. Em sua maioria, os adultos. Eles são os que mais se aproximam para puxar conversa, mesmo que minha aparência e voz negassem qualquer tipo de contato.

— É. Ele foi sim — eu respondia desanimada, ou: — Sim, obrigada — aos que falavam "meus pêsames".

Na minoria, crianças e adolescentes da minha idade, não tão intrometidos, aproximam-se de vez em quando para esboçar um sorriso triste ou um olhar significativo de um "sinto muito", mas são essas pessoas que mais me afetam. Saber que ao voltarem para suas casas terão os pais inteiros, enquanto o meu só há uma parcela, me chateia profundamente.

— Obrigada pela presença — digo, e repito no automático aos presentes que estavam em torno de mim. Aos poucos, um a um, saíam com suas próprias famílias.

O padre, também amigo de papai, foi o último a ir embora me dando a oportunidade de dizer adeus a quem nunca pensei precisar dizê-lo. Primeiro a mamãe e agora você, meu velho, meu melhor amigo...

— Sua história foi pequena, papai, mas isso não quer dizer que não foi épica. Descanse em paz. Onde estiver, saiba que estarei bem e espero que você também esteja. Adeus — enquanto eu saía dali minha mente trabalhava incansavelmente.

Eu tinha trabalho a cumprir.

Dizem que há cinco estágios do luto: negação, raiva, barganha, depressão e, enfim, aceitação. Mas, mediante a realidade que me encontro vou inserir um sexto estágio nessa lista, vingança. E foi por isso que me despedi de meu velho.

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