Nairobe

Inconsolável

Novamente, os dias pareciam ter encontrado um ritmo comum,
como uma melodia já conhecida, como um caminho já
percorrido, e para Nairobe aqueles dias pareceram um bálsamo.
Era como se tudo fosse como antes. Mas não era.
Os mesmos rostos ao redor da mesa, a comida enregelando,
o irmão saindo displicentemente com sua foice reluzente, sua
mãe o acompanhando, Rodolfo e seu desprezo táctil. Não, as
coisas não eram como antes. Ela não era como antes, ninguém
ali era como antes... Nem mesmo sua mãe.
Depois da noite onde descobriu que era irmã de um... Como
dizer? Um "Senhor das Hecatombes", sua mãe parecia quase...
Quase... A palavra seria "humana". Uma angústia se instalara
no meio da sala, parecia ter substituído o sofá, se alastrado pela
mesa de centro chegando até à cozinha, ocupando todo o banheiro,
os quartos. Era como se sua mãe vibrasse em notas dissonantes.
Ela estava alerta, preocupada, os olhos mais atentos,
vivos. Como se estivesse prestes a ser caçada.
Sua mãe, com asas retorcidas, com todos os milênios da finitude humana em suas costas, com sua voz calma, agora parecia um animal acuado e assustado, sempre atenta. Nairobe sabia disso, sentia e podia contornar com as mãos no ar a vibração que se desprendia dela. E sentia pena. De todas as pessoas no mundo, sua mãe era a quem mais amava, e nesses dias, a mais distante, a única a quem não poderia acolher.
E ela a estaria evitando? Nairobe tinha a sensação de que cada vez que se aproximava, sua mãe se esquivava discretamente. Não, aquilo não seria possível.
As saídas noturnas ou matutinas eram constantes, a mochila nas costas e o tilintar dos vidros cobertos por panos roxos.
Aquilo era corriqueiro, mas ganhara outros significado para a menina. Agora, cada retorno de sua mãe para casa era um murro seco no estômago de Nairobe e ela sentia dó. Olhava para o lado oposto, cerrava os punhos, e suspirava se apiedando. Ela sabia bem onde aquelas almas estiveram instantes antes.
E aquilo... Bem, aquilo era quase insuportável.