Capítulo 2

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Olhando em frente ao espelho percebi o quanto eu estava infeliz, aquela parecia não ser eu.
Uma lágrima solitária caiu de meu olho direito e a única coisa que pude fazer era apenas a enxugar. Eu estava linda, uma noiva turca perfeita, mas era a mais infeliz de todas as mulheres. Como eu queria que fosse para Guilherme toda aquela preparação.

- Amiga, você está perfeita! - Jéssica, minha melhor amiga, e não turca, me diz através da chamada de vídeo. - Perfeita e triste!  Por que você não conta a ele? Ao seu noivo, sobre tudo, sobre o seu modo de pensar, sobre como se sente, que você não quer esse casamento, ele também cresceu aqui, quem sabe ele pensa assim como você!

- Não é bem assim Jess! - digo ao me sentar em minha cama.
- Aslan pode ter sido criado aqui, pode ser moderno, ter uma mente mais aberta, ser mais... flexível, mas no final das contas ele ainda é turco, tem sangue turco, e você não faz ideia como esse maldito sangue fala mais alto! - digo com pesar e revolta.

- Aí amiga, como eu queria te ajudar! Estar aí com você, ao seu lado. - Ela se lamenta.

Sorrio fraco.

- Só se você fosse turca, e da família! - digo, ela sorri.

- O que posso fazer é apenas torcer... Para que esse plano doido seu e do Gui dê certo! - ela diz ao cruzar os dedos.

- Shukran! - agradeço. - Agora preciso ir, já chegaram.

- Está bem, depois me conta como foi.

- Pode deixar! - desligo.

Colocando o celular sob a cama, me levanto, respiro fundo na tentativa de criar coragem e então saio do meu quarto, era hora de encarar a realidade.

Um passo de cada vez. É assim que desci os degraus da enorme escada caracol de casa. O chão estava tão polido que pude ver o meu reflexo nele, tudo parecia perfeito, a noite parecia agradável, mas aqui dentro do meu peito, uma forte e incômoda sensação de que aos poucos eu estava perdendo a guerra era predominante. Lutar contra a família, os costumes, a religião, não era tão fácil quanto parece. E pior ainda era lutar contra tudo sendo uma simples mulher.

À medida que me aproximei da sala de estar da casa, pude notar conversas paralelas e algumas risadas contidas. Meu coração se apertou ainda mais, e ao avistar ainda de longe todos sentados nos sofás da sala, a única coisa que eu queria fazer era sair dali correndo. Claro que eu e Guilherme tínhamos um plano, fugir, para bem longe onde não pudessem nos encontrar, onde seriamos felizes de verdade sem ninguém para nos impedir,  mas, eu precisava esperar. Guilherme, assim como eu havia acabado de completar dezoito anos, havia acabado de ser dispensado do exército, e estava tentando juntar um dinheiro. Por mais que sua família tivesse condições, eles não nos ajudariam financeiramente, então, o plano era aguentar tudo aquilo o máximo de tempo possível, até termos um bom dinheiro para fugir, e claro, eu também estava guardando o meu dinheiro.

- Ai está ela! - meu avô diz enquanto a realidade de onde eu estava me tira dos meus planos de fuga.

Ergo minha cabeça com os olhos ainda marejados e me deparo com três pessoas diferentes me olhando. O mais novo certamente era ele, meu noivo. Cabelos escuros, traços leves, pele clara, olhos claros num tom de castanho quase mel, semblante leve e contido, barba por fazer; era assim que meu futuro noivo era. Bonito, preciso admitir, mas não me chamava a atenção, em meu coração e mente só havia espaço para Guilherme.

- Sila, quero que conheça o senhor Mustafa, a senhora  Esen, e, Aslan! - meu avô faz as apresentações ao se aproximar de mim e me direcionar até eles segurando com delicadeza meu ombro até o centro da sala onde todos já me aguardavam de pé.

Faço apenas um leve aceno de cabeça e logo abaixo minha vista, aprendi desde muito cedo como uma moça de família deveria se portar.

- Estou muito feliz em lhe conhecer, Sila! - o pai de Aslan, o senhor Mustafa diz.

- Igualmente senhor! - digo ainda de cabeça baixa, aquelas palavras foram as únicas que eu disse durante toda a noite.

Em um certo momento, a empregada da casa trouxe o café. Como meu pai e avô já haviam acertado todos os detalhes do casamento, e isso incluía o dote, pulamos aquela parte das negociações. Segundo a tradição, a noiva tinha que preparar o café para o noivo, diferente do café brasileiro, o café turco era feito e servido com a borra, que se assentava ao fundo da xícara, entretanto, um pequeno detalhe fazia parte do café do noivo, ao invés de açúcar como era de costume colocar, no café do noivo, a noiva tinha que colocar sal. E como mandava a tradição, eu mesma servi café para todos, separando é claro o café com sal do meu noivo. Ele bebeu tudo e de uma única vez, sem fazer cara feia. Aslan havia passado no teste. Isso servia de sinal para sabermos que ele não iria reclamar de mim no futuro, que ele me aguentaria. Num futuro esse que não existiria. Após a degustação do café, meu avô decidiu puxar conversa, uma maneira silenciosa de mostrar que estávamos preparados para o segundo passo, o pedido oficial de casamento.

Ainda de pé, meu avô começou uma conversa sobre como os chás turcos têm feito sucesso no país e de como sua empresa estava indo bem, aquela era a forma que ele encontrou de dar início a cerimônia de noivado já que segundo as tradições, deveria começar com uma conversa paralela, leve, tranquila, e depois sim o que era preciso ser dito era falado.

- Bom... - o senhor Mustafa diz assim que tem chance. - Estamos aqui senhores Yusuf, Emir, para pedir a sua filha e neta em casamento para nosso filho, Aslan.

Há breves segundos de silêncio até que meu pai e meu avô fazem que sim com a cabeça, aprovando o pedido. Então todos se levantam dos sofás e ficam de pé.

- Bem-vindos a nossa família! - meu avô diz com um largo sorriso. E todos se abraçam, exceto eu e Aslan.

Em seguida, minha mãe trás consigo uma fita vermelha de cetim, e o pai de Aslan entrega a meu avô as alianças. Meu avô por ser o mais velho ali, envolve a fita de cetim nas alianças e então Aslan coloca minha aliança em meu dedo e eu coloco a dele no dedo dele. Vovô corta a fita ao meio e então é oficial, eu e Aslan estávamos noivos. Todos se alegram e festejam, todos estavam felizes, exceto eu. E por um breve momento ao levantar a vista pude perceber que meu noivo havia percebido isso.

Eu queria sumir, correr para bem longe, desaparecer dali, mas eu simplesmente não podia. Então tive que ficar, e ver tudo de perto, os planos que minha avó e mãe faziam com a mãe de Aslan para o casamento que seria em dois meses, os presentes que Aslan e seu pai me deram, os ouros e joias, o dote... Eu estava ali, mas minha mente estava longe.

E no final, quando eu pensei que aquilo não iria acabar, finalmente teve um fim. Após eu oferecer os chocolates que eles trouxeram e os servir em uma bandeja de prata, eles se vão dando fim assim á aquela terrível noite.

Meu amor turcoWaar verhalen tot leven komen. Ontdek het nu