Capítulo 7

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Aslan havia decidido se casar comigo, mesmo eu não sendo mais virgem, mesmo sabendo que eu não estava conforme o acordo. o casamento para os turcos era completamente diferente dos casamentos para os ocidentais, para nós brasileiros. Tudo se tratava apenas de acordos entre as famílias. Amor, paixão, atração... Nada disso se fazia presente num casamento turco, nós éramos movidos apenas por interesses. Nossa cultura foi constituída através de um império, o império Otomano.  Com isso, nós aprendemos a lidar com as situações de forma diferente, visando o bem-estar de nossas famílias, de nossas gerações, era algo cultural, trazido de geração em geração, era nossa essência, nossas raízes. E Aslan havia aberto mão disso, havia um acordo estabelecido entre nossas famílias, e tudo deveria acontecer conforme estava no acordo. E uma parte crucial desse acordo era que, eu, a futura noiva de Aslan deveria ser pura e se manter assim até o casamento. No entanto, Aslan não se importou com isso,  ele abriu mão do seu direito e honra como homem turco ao me aceitar como eu era, e eu tinha uma dívida com ele. Eu seria eternamente grata a ele por isso.

Um dia antes do casamento acontecer, algo muito importante para a noiva era feito. A noite da henna.
Uma espécie de despedida de solteira para a noiva onde as mulheres da família e amigas da noiva vão até a casa dela. Inclusive Jess estava lá segurando uma vela como as outras mulheres que ali estavam que se resumiram em minha mãe, minha avó, minha futura sogra e a governanta da casa que também era turca.

A mãe de Aslan trouxe consigo o pó de henna para o evento.  No centro da sala de estar envolta por velas a meia luz, me posicionei sentada vestida com roupas típicas  vermelhas da cabeça aos pés com um véu da mesma cor. minha futura sogra trás consigo uma bandeja de cobre com a henna vermelha, eu me mantenho com  a palma das mãos para cima, minha sogra coloca sob minha mão enquanto me mantenho com a cabeça baixa um punhado de henna dissolvida em água. Na outra mão, Jess, a única mulher solteira ali coloca outro punhado de henna. Ainda segurando minha mão, minha sogra coloca sob minhas duas  mãos uma moeda de ouro turca, em seguida, minhas mãos são cobertas por luvas.

Minha sogra começa então a cantar uma canção turca enquanto as outras mulheres a acompanham segurando velas andando ao meu redor. E eu precisava chorar. A música era triste, de despedida, uma forma de me despedir de minha família e amigos para iniciar uma vida nova ao lado do meu futuro marido. Eu chorei, e muito. Aproveitei o que estava acontecendo comigo para desabafar ainda mais e me lamentar por tudo o que estava acontecendo comigo. Guilherme não saia de meus pensamentos, e foi então que entendi, naquele exato momento que eu não pertencia aquele mundo, ao mundo ao qual eu nasci e cresci. Eu era turca. Não por nascimento e sim por sangue, eu pertencia a outra gente, a outro povo. O maldito sangue, a maldita cultura me separou de quem eu era, de mim mesma. Por uma aventura, por um descuido, eu havia jogado fora a pequena chance que eu tive de me tornar livre. Eu estava carregando um filho de outro homem que não era o meu futuro marido, eu estava presa ao casamento, a cultura, a família e desta vez eu não tinha mais sonhos de liberdade.

🇹🇷🇹🇷🇹🇷❤️❤️❤️

Já o dia do casamento, ao contrário de como era aqui no Brasil, para nós era algo mais intimista, simples. Vesti meu vestido de noiva num modelo solto  de mangas longas, mas que não marcava em nada   o corpo, meu penteado era preso, apenas uma mecha lateral estava solta, maquiagem leve, e um grande nervosismo. O juiz de paz foi levado até minha casa, e em breves instantes já estávamos casados. Outra parte importante da tradição, logo após o juiz nos declarar casados, eu precisava pisar no pé de meu marido, e ele no meu. Ao pisar em seu pé, Aslan soltou um leve rugido de dor, dito em expressão em nossa língua natal. E todos se alegraram, o motivo, aquela era uma demonstração de que eu mandaria no casamento. Coisas da tradição.
Após o casamento, uma pequena recepção na sala de estar de nossa casa. Apenas nossas famílias estavam presentes. Claro que os homens de um lado, e as mulheres do outro. Homens e mulheres não se misturavam em festas. 

Mas a todo o momento eu não parava de lembrar e pensar em Guilherme. Não com saudades ou carinho e muito menos amor, mas com dor, tristeza, raiva. 

Tudo o que eu não queria havia  acontecido. Eu estava sozinha, casada com outro, esperando um filho. Apesar do meu coração estar partido e dilacerado eu precisava ser forte, havia uma vida crescendo dentro de mim. E eu precisava lutar por ela.

Com o fim da recepção, após trocar de roupa, me despeço dos meus pais, dos meus avós, dos pais de Aslan e sigo com ele para um hotel resort onde ficaríamos uma semana numa espécie de lua de mel já que Aslan ajudava seu pai com os negócios da família na empresa de turismo e não poderia se ausentar mais que isso.

Chegamos no quarto do hotel no começo da noite, aos poucos o sol ia se pondo no horizonte e enquanto Aslan tomava um banho, olhando para aquela paisagem extraordinária da janela do quarto, me permito chorar.
Tudo o que havia acontecido comigo durante aquelas últimas semanas simplesmente estava me arruinando. Aos poucos eu sentia que estava perdendo as forças, que estava cansando de viver, de lutar. Eu estava presa num casamento ao qual não escolhi, numa vida que não queria para mim, e para piorar, eu estava presa em mentiras. Eu estava engando a todos, inclusive a mim mesma, presa em uma teia de mentiras e incertezas.

- Está tudo bem? – a voz de Aslan me tira de meus pensamentos mais profundos.

Rapidamente seco minhas lágrimas e tento me recompor.

- Evet!(sim!) Eu só estava... – digo ao me virar e o ver apenas com a toalha presa em seu quadril. – Pensando em, nada! -certo, aquilo me desestabilizou.

Eu nunca havia visto um homem assim, tão nu na minha frente. Nem quando me entreguei a Guilherme o vi nu, e, no entanto, Aslan estava ali, bem a minha frente coberto apenas com uma toalha, deixando seu corpo definido a mostra.
Aslan ergue uma sobrancelha. Eu estava fazendo papel de besta, confesso.

- Eu... Eu vou tomar um banho! - digo passando por Aslan apressada.

Ele me impede quando eu passo por ele  segurando gentilmente em meu braço. Nossos olhos se cruzam e minha respiração pesa.

- Sei o que todos esperam de nós essa noite, mas sei também que você não está pronta, que está assustada. Sila, apesar de nosso casamento ter acontecido assim, quero que dê certo, quero que sejamos felizes! 

E ao dizer essas palavras, Aslan me solta gentilmente. E antes que as lágrimas me dominassem ali mesmo, apenas faço que sim com a cabeça e sigo a passos rápidos para o banheiro do quarto. Ao entrar no banheiro e trancar a porta, me desmorono no chão e me sento aos prantos. Eu não o merecia, e foi ali que descobri isso.

Meu amor turcoWhere stories live. Discover now