[3] Bolhas e Calos

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JEON

ALGUMAS HORAS ANTES...

Mamãe sempre dizia para não andar com sapatos apertados porque de um jeito ou de outro, causa bolhas e calos. Eu nunca levei isso a sério e na adolescência sempre fui teimoso e andei com tênis apertado, sapato muito justo e a maioria dessas coisas eu nem usava meia. Como era jovem, nada disso doía e só um hidratante floral era necessário para resolver a textura áspera. Quando a gente é adolescente e ainda por cima rebelde, tudo o que nossos pais falam parece ser protetor demais e nem requer tanto cuidado assim. Qualquer higiene que não fosse banho, fazer a barba, escovar o dente e cortar o cabelo, me parecia desnecessário. Às vezes eu me questiono como que, por alguns anos, fiquei conhecido no ensino médio como o "tatuado vaidoso"

Eu não era inteligente, não tinha nenhum talento e tudo o que restava era carisma e bons cuidados. Então sim, minha personalidade na adolescência era ter tatuagens. Isso me rendeu boas amizades, namoros e saídas aos fins de semana. Mas tudo isso, no fundo, sempre foi superficial para mim.

Eu só queria assistir anime e jogar videogame.

Por uma gigantesca sorte eu encontrei alguém que entendia aquilo da melhor maneira possível e, melhor do que isso, fazia essas coisas junto comigo. Jimin foi uma das minhas melhores companhias da nossa transição coletiva da adolescência para a vida adulta. Creio que, se não fosse por ele, eu só seria um técnico de TI – provavelmente morto –, virgem e que não sabe nem como combinar uma paleta de cores nas roupas. Ji sabia como oscilar do sociável para a introversão de uma maneira que conseguia manter a sua personalidade encantadora. Foi ele que havia me ensinado sobre moda, despertou uma das minhas maiores habilidades e ainda me apresentou as melhores coisas que a vida tem a oferecer.

Bem, esse final era o que eu pensava enquanto namorava ele. Depois eu percebi que sabia e podia aprender tudo isso sozinho. Bom, pelo menos eu acho.

Voltando aos calos e bolhas, agora eu entendo o que mamãe falava. A bota preta estava apertando o meu pé com uma força descomunal e se eu parasse para colocar algo mais confortável, ia fracassar. Motivo? Eu só levei aquelas malditas botas. Depois do meu all-star roxo, aquele calçado era meu sapato favorito, onde eu usava para todas as ocasiões e confiava caso precisasse correr, andar silenciosamente, matar algo ou até mesmo chutar e pisar em alguém. Em contrapartida, o all-star era leve demais para agredir uma pessoa.

Mas não sou tão agressivo quanto pareço ser, acredite. Minha altura, tatuagens e piercings são só uma camuflagem para que eu pareça um cara durão e ninguém mexa comigo. Muitos se assustariam se ficassem sabendo que meu maior medo é o escuro. Sim, o escuro. Em pleno apocalipse onde a presença de luz elétrica é – quase – nula, ainda mais na parte onde morava.

Fiquei surpreendido com a descoberta de que em Jinhae ainda havia a presença de eletricidade. Eu já tinha passado por umas cidades que algumas casas haviam geradores e assim podia-se ter alguma iluminação, mas era extremamente raro esse tipo de coisa. Quando encontrava, fazia questão de passar a noite e não precisar enfrentar uma floresta escura, uma estrada deserta ou uma casa com extrema probabilidade de ser invadida.

Voltando ao foco principal (eu me fodendo por ter levado só aquele par de botas), parei minha caminhada depois de seis horas em percurso. Já estava em uma distância bem considerável da área que vasculhei de Jinhae. Não demoraria muito para que logo saísse completamente da cidade, mas, até lá, o sol estaria nascendo novamente. Como era início da noite, me dei ao luxo de fazer uma parada perto da Ponte Lunar, lugar onde tinha uma ótima visão do corpo celeste noturno, mesmo sendo uma ponte de madeira pequena e que parecia desabar a qualquer momento.

The Last Sunset • JIKOOKOnde as histórias ganham vida. Descobre agora