21. Eu recebo uma sentença de morte e o cara das entregas é meu avô

773 103 158
                                    

Depois de ouvir o que Rachel me dissera, senti um zumbido nos ouvidos.

Eu sei que tinha passado os meus últimos dias quase implorando por uma migalha de atenção de Poseidon, mas saber que ele tinha dado as caras pessoalmente só por minha causa achei um pouco demais.

[Qual é, um bilhetinho bastava, não precisava aparecer! Deuses são mesmo muito dramáticos…]

O sótão ficava no último dos quatro andares da mansão, e a cada degrau que eu subia eu tentava ir mais devagar, não queria mesmo encontrar aquele cara.

[Nem mesmo o pior sermão de Quíron seria ruim o suficiente para me fazer preferir ter aquela conversa. Leo tinha tirado a sorte grande.]

Quando alcancei o sótão, pensei em inventar que eu não havia conseguido abrir a portinhola e lamentar o fato de não ter conseguido falar com meu caríssimo avô, mas antes mesmo que eu pudesse dar meia-volta e sair dali o mais rápido que eu conseguia, a porta se abriu e a escada desceu sozinha até onde eu estava.

— Isso é hora de se exibir? — Murmurei, começando a subir pela escada, até que alcancei o cômodo.

Ao contrário do que eu imaginava, o sótão não estava empoeirado e escuro, na verdade estava bem iluminado e não era nada bagunçado ou sujo.

Aos dois lados, encostadas nas paredes havia algumas mesas cobertas de objetos. Tinham espólios de guerra, objetos recuperados em missões, escudos e lâminas antigas (ou amaldiçoadas), dentes de monstros e outras bizarrices como sangue de górgona, um chifre de minotauro… Posso ficar nisso o dia inteiro. 

Nas paredes do sótão, tinham várias fotos e bilhetes escritos à mão… O santuário do Acampamento, onde eram colocadas lembranças de heróis que foram mortos. Meu coração apertou na mesma hora que percebi que eu poderia (e deveria) fazer algo para minha mãe e Samuel, os homenageando… Céus, eu queria chorar de novo.

Do lado oposto da entrada do sótão, havia uma janela cuja vista dava para um trecho do regato, a quadra de vôlei e o ambiente onde os campistas praticavam pintura, desenho e outras artes. Apoiado na janela e olhando para o lado de fora, estava ele.

Poseidon não era nada divino como eu imaginei: ele parecia um pescador quarentão, a barba e os cabelos escuros eram irritantemente da mesma cor dos meus cabelos e dos de minha mãe. Os olhos eram da exata cor do mar e sua pele carregava um bronzeado, como se ele passasse o dia inteiro pescando. E, ao contrário do que eu esperava, no lugar de uma toga azul, Poseidon estava vestido com bermuda, camiseta havaiana e usando chinelos de couro no melhor estilo apóstolo de Jesus Cristo.

— Achei que não viria. — Ele disse quando se virou para mim. 

— Olha, que coincidência, eu ia dizer a mesma coisa sobre você. — Retruquei, cruzando os braços e erguendo uma sobrancelha.

[E daí que aquele cara era meu avô? E daí que ele era o deus dos mares? E daí que ele podia me vaporizar se estalasse os dedos? Eu já tinha perdido minha paciência com ele.]

Ao contrário de me esmagar como se fosse um inseto, Poseidon deu um riso fraco, olhando para o chão.

— Já esperava que você fosse reagir assim ao me ver. — Ele não parecia irritado, na verdade, parecia estar se divertindo. Aquilo me deixou ainda mais sem paciência, nada me fazia ficar tão fora de mim quanto alguém que não me leva a sério.

— O que você quer? — Cortei-o, sem fazer esforço para esconder minha cólera. 

— Direta. — Ele levantou as sobrancelhas e depois tornou a me encarar. — Só preciso te falar algumas coisas, Melissa.

Diário de Uma Semideusa em Crise [ᚠ] Conheça suas origensWhere stories live. Discover now