Supernova

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Cooller sentia os olhos das pessoas em si, a deixando desconfortável.  Ela já se sentia uma completa estrangeira na capital do reino. Com todos lhe encarando daquela forma, então... ela se sentia um fosforo aceso em meio a neve do inverno mais intenso. A garota puxava consigo um cavalo com oito patas e crina membranosa, quase como uma barbatana. O animal trazia consigo uma carroça ornamentada, indicando a procedência da entrega.

É do Palácio.

As pessoas murmuravam enquanto a encaravam. Aquele era finalmente o dia. Por isso havia uma fila enorme em cada um dos arcos espalhados pela praça central. Cada fila dava a um portal, onde, com a ajuda de cristais mágicos,  demônios que serviam a rainha diretamente realizavam o procedimento padrão do torneio. Técnicas passadas de geração para geração sobre como manipular aqueles cristais que só apareciam durante o torneio. As pessoas faziam fila para entregar oferendas aos seus entes queridos e seus competidores favoritos.

A baixinha não pegou fila. Ela caminhou pela praça, parando diante de um dos demônios que serviam a rainha. Ignorando os olhares curiosos dos civis sobre si, a garota suspirou e encarou o homem a sua frente com seriedade.

- Eu vim fazer as oferendas –

O homem, entediado, se quer a encarou. Ele permaneceu a olhar para o cristal a sua frente, analisando os demônios do atributo daquele portal. Os portais se abriram de acordo com um atributo. Haviam seis atributos no Inferno, mas haviam doze portais. Organizar todos os concorrentes da região com apenas um portal para cada atributo seria demais. Iria acabar o tempo e não daria para que todos fizessem as suas oferendas. Como o torneio fora criado pelos deuses antigos daquela dimensão, as suas regras também foram manipuladas por eles. Cada região, tanto do reino principal, quanto dos banidos, recebia portais para que os remanescentes pudessem presentear os concorrentes e eles tinham até o início da terceira fase do torneio para depositar as suas oferendas.

Elas seriam transportadas para o mundo humano através do livro e do contrato entre humano e demônio. As oferendas eram transportadas e armazenadas em dimensões particulares. Graças ao contrato, uma pequena dimensão momentânea é criada para cada dupla do torneio que alcançava a terceira fase do mesmo. Haviam oferendas obrigatórias que cada demônio deveria receber.

E era exatamente isso que Cooller estava transportando naquele momento.

- E para quem seria? –

- o príncipe Stiles –

Instantaneamente, o ambiente ao seu redor mudou drasticamente. O que antes era um ambiente barulhento com vozes por todos os lados, bem fomo passos, sons alegres e descontraídos como uma verdadeira praça deveria ser, fora tomada por um silêncio mortal. O único som ouvido eram os dos passos das pessoas, ou de suas asas, mas todos sons que escapavam de suas bocas desapareceram com a resposta da garota. Os seus olhos, antes vidrados na carroça atrás dela, agora estavam vidrados na própria garota

- você... você quis... dizer B-Balck Star? – o homem a sua frente parecia temer até mesmo pronunciar aquele nome.

- O regicida? –

- o traidor! –

- quem faria oferendas para ele? –

- quem essa pirralha acha que é para fazer oferendas a um criminoso? –

- essa vadia mirim está querendo morrer? -

Os comentários quebraram o silêncio,  em sussurros e murmúrios que Cooler preferia não ser capaz de ouvir. Ela sabia como era estar do outro lado da história. A garota sabia como era ser alguém que desconhecia a verdade. Era se esconder atrás da distância e do esquecimento para proferir ofensas e maldições  mas quando a oportunidade de se aproximar da verdade surgia, aquelas pessoas corriam de medo.

Não demorou para que as teorias da conspiração sobre ela voltassem a correr. Desta vez, pela boca do povo e não dos guardas. Pessoas que nunca lhe viram na vida questionavam a sua índole e a sua devoção a coroa. Lhe acusavam de traidora, de cúmplice de assassinato, até mesmo de amante de traidores.

Cooller não poderia se importar menos com as palavras que escorriam daquelas bocas venenosas.

- sim. Eu trouxe as oferendas de Black Star – ela confirmou com a voz firme e com segurança em seu tom.

Se aproximou da carroça que puxara e lhe puxou a lona que a cobria, revelando duas enormes caixas de mármore negro com detalhes em ouro e pedras preciosas negras e arroxeadas. O homem responsável pelo transporte das oferendas pelos portais engoliu em seco, compreendendo do que se tratava.

- ah, certo. Certo. Entendi. São as oferendas obrigatórias, certo? – inquiriu nervoso, movendo os dedos agilmente pelo cristal a sua frente, marcando os detalhes da entrega.

- Exatamente –

- o baú grande na vertical seria a sua armadura, certo? – indagou, ainda nervoso, tentando ignorar os olhares das pessoas ao seu redor.

- ele vai mesmo fazer? –

- não tem opção.  É obrigação dele. Mas pior é a garota. Se ela não trouxesse a oferenda, ele não teria que fazer – murmuravam as pessoas, ainda perplexas com a atitude da garota.

- sim. A rainha me entregou sua armadura e sua arma para que ee trouxesse aqui – comentou a garota de cabelos curtos, observando o homem engolir em seco, ainda nervoso, meneando em compreensão.

- São ordens da rainha  - havia um tom misericordioso na voz da mulher.

- pobre criança.  Foi encarregada de uma tarefa tão odiosa –

- por que nenhuma guarda real não deu cabo da carroça? Assim livrava a garota e todo o reino -

- e o baú na horizontal é a sua arma de guerra – ditou Cooller com tranquilidade e o homem meneou, temeroso.

Ele piscou os olhos, finalmente se dando conta de um detalhe. Olhou para os dois homens ao lado do portal atrás de si, confuso. Os dois lhe encararam com temor no olhar. Ele piscou os olhos, confuso, mais uma vez, e lançou uma careta de questionamento para eles, que apenas engoliram em seco, confusos, sem entender a sua expressão estranha.

- vocês dois. O que estão esperando? Peguem os baús e preparem para o transporte interdimensional – ralhou o demônio diante do cristal e, nervosos, os dois se aproximaram da carroça.

- É melhor terem cuidado com esse equipamento. Um novo rei pode estar sendo escolhido, e Black Star é um dos favoritos dentre os reinos banidos, e um dos mais fortes competidores. Não vão querer danificar o seu equipamento, vão? Ou ele se torna o novo rei, ou não. Mas mesmo que não volte como o novo rei, ele ainda é forte – alertou Cooller com uma seriedade ameaçadora no olhar tranquilo.

Os dois homens menearam em compreensão, assim que subiram na carroça para descer o baú de mármore que continha a armadura de Black Star, dois homens seguraram em suas mãos os parando.

- hey, hey, hey! Para quê a pressa, pessoal? – um terceiro demônio soou zombeteiro enquanto se aproximava do homem responsável pelo transportador – não é como se todos nós estivéssemos ansiosos para que o regicida coloque as mãos nesse equipamento de guerra –

- O que está fazendo? – inquiriu a garota encarando o homem recém-chegado com frieza no olhar.

- não podemos deixar um peso tão grande ser jogado nas costas de uma pobre garota indefesa – ele sustentava o seu ar de zombaria.

- não sinto peso algum. Tudo o que sinto é honra, senhor...? – ela respondei surpreendendo as pessoas.

- honra?! Sente honra em servir a um traidor?! Sente honra a entregar o equipamento de guerra do assassino do seu amador rei?! – ela sentou a zombaria encobrir a raiva do mais velho.

- o senhor não sabe, mas sou pupila do lorde Star. E é com muito gosto que trago não apenas a sua armadura e sua arma, como também um oferenda minha para ele – a fala da menina gerou a perplexidade no ambiente.

- uma... oferenda sua? –

- sim. Pode colocar aí. Trago comigo uma carta para ele, bem como a sua comida favorita: torta de radamanthys – a garota apontou para uma cesta que havia no lugar em que o condutor da carroça deveria se sentar.

- que caralhos, garota! Você tem merda na cabeça?! – exclamou um dos homens que havia segurado as mãos de um dos transportadores, lhe fitando com fúria.

Cooller não pareceu se importar.

- você deve ter um curral inteiro de merda no lugar do cérebro – a resposta da garota surpreendeu a todos – quem você pensa que é para ousar interferir no torneio? Se quer era um participante. E mesmo que fosse, não teria mais direito de interferir no mundo humano, uma que estaria aqui –

O homem se enfureceu.

- Quem eu penso que sou?! Eu sou o cara que vai colocar um fim nessa palhaçada! Para começo de conversa, Black Star não deveria ter direito ao torneio. Nem ele e nem nenhum dos filhos dos banidos – o homem proclamou com autoridade na voz.

As pessoas ao seu redor concordaram consigo com exclamações e meneios de cabeça.

- eu não consigo entender porque a rainha não o proibiu de entrar no torneio. Ele estava preso. Deveriam ter queimado o seu livro enquanto ainda estava preso! – o homem voltou a soar como uma autoridade, enquanto abria os braços, pedindo por apoio.

- é isso aí! –

- deviam ter queimado o livro e ele juntos! – exclamou uma mulher, exaltada.

Cooller bateu o pé diante do homem e suspirou, fazendo neve escapar dos seus lábios junto a uma neblina grossa.

- Vocês.... estão proferindo em voz alta que não apenas se mostram contra a coroa, como também contra os deuses? – a voz da garota soou fria e autoritária.

Algumas pessoas engoliram em seco. Ir contra a coroa, em alguns aspectos, era sinônimo de traição e, como deveria ser, era tratado judicialmente como tal. Mas ir contra as regras do torneio sagrado era pior ainda. Era traição para com os deuses. E como a coroa era fiel aos deuses, também tratava tal crime com punho de ferro. E o crime de traição contra os deuses tinha uma punição pior do que a de traição a coroa. O demônio que traía os seus próprios deuses, era capaz de trair qualquer demônio. Sendo assim, sofrendo a pior punição possível. Pior do que trair a coroa, pior do que assassinato, pior do que abuso sexual, pior do que escravidão. Aquele que traía os deuses era banido perpetuamente da dimensão. Da dimensão que sustentava as suas habilidades de regeneração e magias. Fora do inferno, os demônios possuíam apenas a sua força física para sobreviver a outra dimensão.  E não havia livros para lhes fornecer magia ou qualquer outra coisa.

Aquele que era banido do inferno morria nas mãos de criaturas ainda mais fortes, existentes em outras dimensões

- Nãos9mos contra os deuses. Somos contra a ideia absurda de alguém como ele ter direito a... –

- Os Deuses deixaram bem claro. Todo aquele que tem os seus poderes trancafiados em livro TEM o direito de participar do torneio – a garota lhe cortou a fala, fazendo as pessoas ao redor se sentirem intimidadas.

Ela conhecia não apenas as leis, como também as leis sagradas.

- Eu sou uma ex competidora do torneio. Enfrentei Black Star. Perdi. E agora estou seguindo os seus passos. E não vai ser nem você e nem ninguém que vai me impedir de fazer esta oferenda –

O homem se sentiu desafiado.

- ah, não? Você é só uma criança. Nós somos quatro  adultos. Queime a carroça! – o homem diante da garota se virou contra a carroça,  bem como os companheiros.

Os dois assistentes do responsável pelo transporte das oferendas se agastaram da carroça em um salto, atingindo um prédio e uma estátua da praça, se apoiando na lateral deles com os pés, se abaixando. Cooller se abaixou e saltou o mais alto que conseguiu, realizando um mortal e unindo os polegares e os indicadores, formando um losango com os dedos. Ela colocou as mãos diante da boca e suspirou. Do símbolo que desenhou com as mãos enorme cristais de gelo surgiram, cercando a carroça com um prisma de gelo.

As magias de luz, terra e vento atingiram o gelo e foram desviadas para cima, deslizando sobre as paredes de gelo e se encontrando no topo do escudo, onde atingiram umas as outras e explodiram. A garota enfim caiu sobre o prisma, parando no topo da ponta aguda do encontro das quatro paredes, encarando os adultos com um olhar gélido.

- eu prefiro fazer isso de forma pacífica. É uma desonra a pupila de um príncipe causar alvoroço em praça pública -

- Então não cause – o homem que disparava luz das pontas dos dedos saltou, surgindo atrás dela, pronto para atravessar o ombro da garota com um disparo, o qual ele usaria o seu controle sobre a sua magia para fazer o disparo afinar e crescer, decepando o ombro da mais nova.

Os disparo a acertou no ombro de forma quase certeira.

Quase.

Cooller se abaixou antes do disparo, girando o corpo e erguendo o pé em um chute, suspirando.  A neblina que escapou dos seus lábios viajou até sua perna, criando uma extensão do gelo do escudo da carroça e congelando o braço responsável pelo disparo de luz, prendendo metade do corpo do homem ao escudo, uma vez que fora congelado.

Uma esfera de pedra com espinhos surgiu diante dos olhos de outro dos homens e fora disparada contra a garota. Cooller cuspiu na sua direção e um bonecos de neve surgiu diante dela. O boneco moveu as mãos grossas para a pedra, a agarrando. O braço de neve fora dilacerado pelo impacto, mas o corpo do boneco parou o ataque, surpreendendo o homem.

Laminas de vento voaram na direção da garota, que saltou, desviando do ataque. As lâminas cortaram o gelo que prendia o homem de Lumus, o libertando. Os dois saltaram o mais alto que conseguiram, enquanto que o homem de Erathus socava o chão e abria bem os olhos, criando uma magia da classe Gigano com os olhos. Os outros dois criaram cada um uma magia de classe Gigano. Uma clava de terra, uma lança de luz e uma cimitarra de vento foram direcionados contra o escudo da garota. A menina se colocou mais uma vez sobre o escudo e abriu os braços, preparada para se defender.

Os olhos do homem de Erathus foram cobertos, as mãos do homem de Lumus foram atadas uma a outra e os braços do homem de Harus foram atados rentes ao corpo. Cooller parou os seus movimentos, encarando os três agressores com curiosidade, os vendo completamente impossibilitados de soltar magias quando fios de prata inutilizaram os seus métodos de invocação. Os mesmos fios de prata os ergueram do chão e os sustentaram no ar.

Um suspiro cansado escapou dos lábios da jovem de cabelos longos.

- que porra é essa?! – exclamou um dos homens.

- eu estou, realmente, indignada com essa situação – a voz jovial soou realmente desgostosa, apesar da tranquilidade em seu tom de voz.

- E quem é você, porra? –

- eu nem em treinamento para guarda real estou, ainda. E já tenho que fazer o trabalho deles – a mulher jogou os cabelos por sobre os ombros e levou o pirulito a boca.

- E de qual lado você está? – inquiriu Cooller para a mais velha.

- do certo. Transportador, prepare a oferenda para o transporte – ditou a mulher e só então Cooller notou os fios de prata de sua mão.

- Quem é você? – inquiriu a garota vendo a mais velha, que ainda não era uma adulta lhe direcionar um olhar de julgamento.

- Darwini. Kalli Darwini do Clã Caeros –

- senhorita... o gelo – os assistentes do transportador se aproximaram, receosos –

Com um olhar desconfiado, Cooller abaixou as mãos e o gelo se desfez, liberando a carroça para que eles pegassem os baús e a cesta. Kalli estalou os dedos e dois homens da guarda real surgiram ao seu lado, se ajoelhando.

- levem esses três para o meu pai. E diga-lhe que eles foram contra as regras do torneio e atacaram a protegida da rainha. O resto ele vai descobrir sozinho, de todo jeito –

- Sim, senhorita Darwini. – os dois homens despareceram em um salto.

Os três homens amarrados por fios de prata desapareceram em feixes de luz.

- E você, protegida. Como se chama? – a Darwini se aproximou da mais nova com classe.

- Maximk. Cooller Maximk. Não possuo Clã - a mais velha ergueu brevemente a sobrancelha em compreensão.

- Acho que é por isso que não reconheço o seu estilo de magia –

- Deve ser –

- Enfim, vai mesmo fazer uma oferenda para esse cara? –

- sim. Algo contra? –

- Muito. Mas não posso ir contra o torneio –

- Você era uma participante, como eu – acusou Cooller, tentando reconhecer a morena, além do seu sobrenome.

- Sim. Eu era. Eu perdi para o dono dessa armadura – respondeu apontando com o pirulito para o baú na vertical.

- ah, sim. Foi você que vi no salão em que a rainha analisa o torneio. Você perdeu quando ele desbloqueou a forma de batalha dele – a garota comentou, inocente, e uma expressão de desgosto surgiu na face alheia.

- Isso mesmo. Mas me diga, por que a rainha não veio entregar a armadura do príncipe ela mesma? Ela me explicou a história sobre a morte do rei. – inquiriu a membro do Clã Caeros observando a mais jovem suspirar.

- A rainha fora informada que dois de seus filhos estão lutando-

Kalli se viu surpresa.

- E quem são? –

Cooller suspirou.

- o príncipe Stiles, membro do Clã Star e descendente da rainha Medusa, e a princesa Lydia, membro dos Clãs Martin e Lahey, herdeira do falecido rei Lucio Lahey, o Fera Dourada – Kalli arregalou os olhos.

- a princesa Lydia?! – exclamou, perplexa.

- isso –

A morena mais alta mordeu a unha do polegar, pensativa.

- As magias de Black Star são fracas contra o elemento Luz. E a princesa Lydia ainda tem aquela técnica – murmurou, analítica.

- mas não sabemos se ela pode usar aquilo no mundo humano. Ela pode ainda não ter desbloqueado essa magia – comentou Cooller, igualmente analítica.

- tem razão. Mas, se ela já tiver essa magia em seu livro... Black Star pode estar para voltar ao Inferno –

Cooller meneou em compreensão.

- E é disso que a rainha tem medo –

Kalli a encarou, surpresa, mais uma vez.

- ela tem? –

A mais nova apenas meneou em concordância.

Batalha de ReisWhere stories live. Discover now