dó dhéag

61 13 11
                                    


And the crashes are heaven
for a sinner like me

.°୭̥°

Em vez do sedã preto que costumava me apanhar em casa todas as manhãs, Louis escolheu o carro antigo com o qual quase me atropelara na semana anterior. Agora menos atordoado do que no dia em que o encontrei pela primeira vez, pude observar melhor o Mustang Shelby GT: a pintura preta com detalhes dourados reluzia como nova, e o interior com volante de madeira, bancos de couro escuro e um rádio com grandes botões redondos cromados parecia ter acabado de sair da fábrica.

O começo da viagem foi silencioso. Nada surpreendente, já que aquele era Louis. Estávamos em uma avenida movimentada, andando havia uns bons dez minutos, quando ele enfim resolveu quebrar o silêncio.

- Como se sente?

- Envergonhado. - Mantive o rosto virado para a calçada, observando as pessoas e as fachadas dos prédios passarem pela janela como um borrão. - É proibido ter um ataque histérico na casa do chefe.

- É mesmo? - Eu senti, mais do que vi, o sorriso em sua voz. - Segundo quem?

- A fila do seguro-desemprego.

Eu o espiei pelo canto do olho. Ele lutava para não rir. Ok. Talvez tivesse entendido que eu não era louco, apenas tivera um momento de descontrole, e fosse me manter como seu assistente.

Relaxei no banco, mas fui incapaz de parar de admirá-lo. A luz amarelada do painel fazia seus cabelos brilharem. A parte da frente lhe caía ao redor do rosto, emoldurando as bochechas que eu queria muito beijar. E depois lamber.

Balancei a cabeça e repreendi meu cérebro, lembrando-o de que não era permitido ter pensamentos envolvendo lambidas e o meu chefe.

- Posso fazer uma pergunta? - Ele se inclinou um pouco para examinar o retrovisor antes de mudar de faixa.

- Claro.

- Aquela visão, sobre me ver morrer... - começou, o rosto absolutamente tenso.

- Não foi uma visão - me apressei. - Eu misturei a imagem do videogame com um sonho e fiz a maior confusão.

- Um sonho? - Um pequeno V se formou entre suas sobrancelhas. - Você sonhou comigo?

Ah, só umas três ou quatro mil vezes.

- Não - menti, encarando a lanterna vermelha do carro da frente. - Foi só um daqueles sonhos esquisitos que eu tenho. Já estou acostumado. Ou deveria estar. Não sei o que deu em mim pra gritar daquele jeito. É que... às vezes o que eu sonho é tão real, tão nítido, que eu fico com a sensação de que realmente está acontecendo. Eu sei que nada daquilo é verdade. - Pelo menos sabia, até eu te encontrar. - Mas ainda assim me confunde. Acho que tudo que aconteceu hoje de manhã no seu escritório me fez te colocar no meio desses sonhos.

- Os seus sonhos são sobre morte? - A inquietude lhe encrespou a testa.

Por quê? Por que ele não podia, pelo menos uma vez, deixar passar? Por que tinha que prestar atenção em tudo o que eu dizia? Por que ele não podia ser como a Gemma?

- Não exatamente - acabei respondendo. - É mais como coisas que poderiam ter saído de um livro. Castelos, lutas de espadas... - Você.

- É mesmo? - Ele se virou para me encarar, suas sobrancelhas se arqueando tanto que quase atingiram o couro cabeludo.

- Também não precisa me olhar como se eu tivesse dito que viajo no tempo por meio de um celular, né?

Ele piscou algumas vezes antes de voltar a se concentrar no que acontecia na avenida. E então começou a rir.

When The Night Falls. {H.S - L.T}Where stories live. Discover now