a casa verde

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Hoje eu procurei por você no Google Earth e no Google Maps. Não achei nenhum resquício do que você era, uma casa verdinha de bonecas, bem cuidada, com um pátio cheio de flores, muros pintados de branco, ao lado do mar. Encontrei uma casa que não é mais você, um lugar abatido, feio, sujo. O que fizeram com você, minha querida? Você, que foi o meu lar durante os verões mais felizes da minha vida. Eu sonhava em te comprar para viver ao seu lado com os seus (os nossos) fantasmas. Eu tocaria suas paredes e diria quantas saudades eu havia sentido. Eu escreveria poemas sentada na varanda onde sentávamos nos finais da tarde daqueles verões gloriosos, lembrando das vozes, dos ecos que lhe percorreram naquela época. Eu entraria naquela garagem só para ver a garrafa pet cortada ao meio com um pincel dentro. Uma parte de mim morreria de saudades se visse algum móvel ou objeto no mesmo lugar daquela época. Descer os degraus da cozinha seria o suficiente para me fazer desabar. Eu lembro até dos potes que a vovó Leda mantinha nas prateleiras. Eu lembro da textura e da estampa do sofá-cama da sala onde eu dormia com a Dindinha. A porta sanfonada que dava para o quarto principal ainda existe? Acho difícil, afinal, não é mais você que existe, é outra casa. Foi a sua época mais feliz? Eu acredito que ninguém te amou como eu. Como é possível nutrir amor por uma casa, me pergunto, mas não era só uma casa, era a minha alegria. Eu perdi mais uma vez algo que nem era meu. Você viverá eternamente em minhas memórias e escrevo como se tivesse perdido um parente, porque perdi mais uma parte feliz da minha vida. Obrigada por ter me abrigado nos momentos mais genuínos, quando eu fui cuidada, amada e rodeada por quem realmente me amou e que não está mais aqui. Quando eu pensar em amor, pensarei em você, que simboliza isso da maneira mais pura. Quantas tardes passei pintando revistinhas na mesa da sala? Deitada na cama com a vovó Leda, brincando de boneca? A melhor Páscoa da minha vida foi aí, quando acordei com pegadinhas de coelho percorrendo a mesa, janela e chão... graças à mamãe. Quantos domingos fizemos churrasco? Quantas vezes coletei florzinhas roxas do seu jardim? Quantas vezes usei o caminho de azulejos vermelhos para desfilar? Quantas vezes usei aquela rede amarela nas árvores do pátio? E as onze-horas que tornavam o jardim mais lindo durante o dia? Sua sucessora não conseguiu ser tão boa quanto você e quando passamos pela rua dela pela primeira vez, minha dinda pediu para que adivinhássemos qual seria a nova casa. Ficamos meio decepcionadas quando descobrimos. Tive minhas memórias nela, adorei-a como tudo na minha infância, mas não era tão mágica quanto você. Amei-a, mas não como amei você. Ela também era uma casinha de bonecas, pequena, com um pátio enorme e serviu à minha infância com gentileza. Eu esperava te reencontrar, mas sei que esse reencontro seria diferente, afinal, você não é mais a mesma casa dos meus verões da infância. Agora, é a casa das memórias e só existe no passado, dentro de mim no agora.

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