Prólogo

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Elena

Há onze anos

      Querido diário, hoje estou feliz por saber que verei Christopher novamente. Ele já não me manda bilhetes como antes, já não se comunica comigo, sei que o colégio em que ele está restringe muitas coisas, que está focado nos estudos como os pais dele mesmo disseram, mas nos dois últimos verões ele viajou com a família ou foi para uma escola de verão. Quero acreditar que ainda somos os melhores amigos, mas sinto que já não sei nada sobre ele.
       Christopher não veio me visitar uma única vez, nem nas férias de Natal, nem no verão, ele não ligou, não deu nenhum sinal. Eu também não podia estar à espera dele todos os dias, também ia visitar meus primos e tios algumas vezes e acabamos por nunca nos encontrar. Evan, o seu avô e também meu atual melhor amigo, disse que talvez ele precisasse de espaço, afinal ele recebeu a notícia de que sua avó tinha morrido nos primeiros meses em que começou a estudar naquele colégio caro.
       Eu dei o tempo que precisava, mas tenho saudades dele e as coisas não são as mesmas. Tenho muita coisa para contar e também estou ansiosa para ouvir o que ele tem a dizer. Espero que possamos nos aproximar novamente. Ele ainda é o meu melhor amigo, e eu o amo muito.

      Fecho o meu diário e guardo debaixo do colchão para a minha irmã não pegar. Sei que Christopher não virá para cá, então tenho que ir atrás dele. Evan sempre disse que algumas pessoas são orgulhosas demais para pedir desculpas, nunca foi o caso do Christopher, mas estou disposta a salvar a nossa amizade.
       Procuro uma roupa melhor para ir na casa dos White. Não vou para lá com muita frequência, na verdade, costumava brincar com Christopher na mansão do Evan, porque a minha mãe é empregada dele, e os pais do Christopher nunca foram com a minha cara. Na verdade, muita gente não vai com a minha cara, mas como a Emma, falecida esposa do Evan e avó do meu melhor amigo, costumava dizer, nunca iremos agradar todo mundo e está tudo bem, o importante é estarmos bem conosco mesmo.
       Escolho o meu vestido de girassol e sandálias brancas para combinar com o elástico nas minhas tranças e com a minha bolsa de flor. Ganhei essa bolsa de presente no meu aniversário de quinze anos, Evan comprou para mim. Christopher não me parabenizou, eu mandei um postal de aniversário na vez dele, mas nunca tive resposta.
      A casa dos White não é muito longe da mansão do Evan. Nós moramos numa pequena casa dentro da mansão porque a minha mãe trabalha para senhor White. Ela cuida de mim e da minha irmã sozinha. Eu não me lembro do meu pai, apenas lembro que ele nos abandonou. Evan é como um pai para mim, até paga os nossos estudos.
      Vou para a casa dos White e os seguranças me deixam entrar porque eles me conhecem. Não preciso perguntar onde Christopher está porque ouço risos na piscina. Caminho lentamente até lá e vejo meu melhor amigo com pessoas que nunca tinha visto antes.
       Christopher cresceu bastante. Eu costumava ser mais alta que ele, mas agora ele está gigante e continua magrinho. Ele está sentado na espreguiçadeira com um refrigerante na mão. Há três outros meninos com ele. Uma loira muito bonita que usa uma saia rosa e cropped branco, um moreno de bermuda azul e camisa branca mais baixo que Christopher e o outro, vestido todo de preto e cabelos castanhos despenteados. Eles notam a minha presença e Christopher não parece muito feliz em me ver.
      Ele sempre ficava feliz ao me ver.
       — Oi! — aceno para todos, já perto deles.
       — O que você faz aqui? — pergunta quem eu achava ser o meu melhor amigo.
       — Quem é ela? — a loira pergunta.
       — É a filha da empregada. — Christopher responde.
       — Filha da empregada? — pergunto. É verdade, mas ele nunca me chamou assim.
       — Você conversa com os empregados? — o despenteado pergunta.
       — Claro que não. Ela deve estar aqui por outro motivo. Talvez para nos servir. — Tanto desdém na sua voz, que parece que o Christopher que eu conheço foi substituído por um clone malvado.
       — Eu não sou empregada.
       — Filha da empregada, empregada é. Pode me trazer uma limonada? — a loira pergunta.
       — Eu já disse que não sou empregada. — empurro ela na piscina.
       — Sua maluca! — ela grita dramaticamente. — você sabe quanto custou essa saia? — e ela grita e grita sem parar até senhora White vir para a piscina ver o que se passa.
      — Se não queria nadar, não ficava perto da piscina. — Digo para a loira mimada.
      — O que aconteceu aqui? Porquê essa gostaria, Ivy? — senhora White pergunta.
      — Ela me empurrou na piscina. — A idiota aponta para mim.
      — Ela me chamou de empregada.
      — Quando a sua mãe pede a sua ajuda, você não ajuda? — Senhora White olha para mim, os olhos muito azuis e repletos de repreensão.
      — Ajudo, mas...
      — Então você é uma empregada. — Ela cruza os braços. — Agora deixa o Christopher ter um pouquinho de paz com os seus amigos. Vai fazer alguma coisa útil. — Vira para a tal Ivy. — Querida, já vou mandar trazerem uma toalha para você, está bem? — ela volta para dentro, pela porta deslizante perto da piscina.
      Christopher olha para mim. — Não volta a atacar os meus amigos, sua esquisita.
      — Acha que sou esquisita? Quer ficar com esses seus amigos?
      — Procura alguém do teu nível. — O menino de cabelos escuros diz. — Deixa o Christopher em paz.
      Eu quero chorar, mas não posso chorar agora. Também estou com muita raiva porque ele sempre me defendeu e sempre esteve do meu lado, mas agora está contra mim.
      — O que foi? Vai chorar? — o despenteado levanta da espreguiçadeira e imita um bebé chorando.
      Todos riem de mim, incluindo Christopher. Envergonhada, decido ir embora e choro o caminho todo. Lágrimas de tristeza, de dor e de raiva também. Devia ter ficado no meu canto, se Christopher se afastou é porque obviamente encontrou amigos melhores.
       Evan está na biblioteca quando vou atrás dele. Sua biblioteca é grande e repleta de livros, tem até alguns para mim, mas dificilmente leio. Ele me vê chorar e fecha seu livro, sentado no sofá preto.
      — O que foi, querida?
      Quando eu era mais pequena ele costumava me colocar no seu colo, agora que tenho quinze anos, já não tenho esse privilégio.
      — O Christopher me tratou muito mal. Eu vou me vingar dele.
      — Elena!
      — Devia ter contado para os amigos dele que ele tem um diário. — Sento ao seu lado.
      — Não precisa disso. Ele vai entender que errou vai pedir desculpas. Acredita. — Toca o meu ombro para me consolar.
      — Ele mudou.
      — Pode ser verdade, mas eu não imagino um mundo em que vocês dois não terminam juntos e me dão muitos bisnetos.
      — É impossível. Ele é... era o meu melhor amigo. Nunca olhei para ele de outro jeito. E agora parece que já não me suporta.
      — É apenas a adolescência. Nessa fase vocês passam por muitas coisas, muitas descobertas, mas tudo vai se resolver.
      — Vou esperar ele me pedir desculpas.
      — Ele gosta de você, então voltarão a ser os melhores amigos.
      Eu coloquei isso na minha cabeça, acreditei que iria acontecer. Afinal, antigamente sempre que alguém na escola me fazia chorar, Christopher me consolava e dizia que eu era muito especial e que iria cuidar de mim. Aquele Christopher ainda tinha que existir.
      Mas não aconteceu.
      Ele ficou cada vez pior.
      Christopher passou a me desprezar por motivo nenhum. E eu perdi toda a minha fé na nossa amizade. Foi aí que percebi que nada dura para sempre.

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