Capítulo 4

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— Lady Benedict, a senhora não vem?— Levantei meu olhar encarando o mordomo a alguns degraus do térreo.

— Ah, sim, claro — Engoli em seco antes de segurar com as duas mãos na proteção de madeira que cerca a escada — Mas, senhor, permita-me perguntar algo.

— Tudo o que quiser saber, milady.

— Não há nenhum quarto no andar térreo? As escadas não me parecem seguras e temo por minha segurança até que consiga alguém para reformar alguns degraus.

— As escadas são perfeitamente seguras, eu mesmo cuido de fazer a manutenção.

Agora será ainda mais ofensivo não confiar nesses degraus velhos.

— Sendo assim, sou grata pelo seu esforço — Sorri tentando parecer gentil antes de começar a subir degrau por degrau fechando os olhos e esperando meu fim a cada ranger.

— Esse é o quarto que foi preparado para sua chegada.

— Preparado para minha chegada? Não dividirei o quarto com o capitão?

Não que eu anseie por isso, mas não me lembro de uma única noite em que meus pais não dividiram o quarto e em meus estudos foi dito que uma das principais ocupações de uma esposa é deitar-se com seu marido.

— Não saberei te dizer, apenas foi mandado que preparassem esse quarto para sua chegada — O homem abriu a porta sem muita dificuldade — Vou trazer suas malas.

Poucos móveis compõem esse quarto, uma cama de casal no centro do quarto e um baú em seus pés, uma janela com cortinas beges, uma porta que provavelmente dá para o lavabo e um grande espaço vazio.

Me aproximei da janela puxando a cortina, o quarto tem a vista para um belo e vazio jardim, assim como o jardim de entrada. Um pouco mais distante está o que parece ser um estábulo, com um grande espaço de terra vermelha em um círculo de cercas de madeira na cor branca.

— Tem muitos cavalos em Bertro?— Perguntei sem tirar os olhos da janela quando o mordomo retornou.

— Não muitos, eles são soltos quando se recuperam — O homem começou a dizer — O senhor gosta de cavalos selvagens então não costuma domesticá-los.

— Cavalos selvagens?

— Animais indomáveis, milady, são tratados nos estábulos do duque e em seguida voltam à natureza se assim desejarem.

— Eu gostaria de conhecer os estábulos o mais breve possível, na verdade tudo soube que há muito o que se ver em Bertro.

— Claro, quando o lorde Benedict retornar com certeza não haverá problemas em lhe apresentar tudo o que também é seu — Ele disse e disfarçadamente deu alguns passos retornando ao corredor — Vou deixar que descanse e logo alguém virá preparar o seu banho.

Quando a porta se fechou, andei pelo cômodo reparando nos detalhes apagados do quarto vazio, de repente as flores e os frutos que Francesca deixava em meu quarto me fizeram sentir a primeira sensação de saudade. O lar  colorido que cresci parece uma casa de espetáculos comparada a casa do duque.

Ouvi batidas na porta e murmurei uma permissão para que a porta fosse aberta.

— Minha senhora, fui encarregada de preparar o banho vim apenas verificar qual temperatura gostaria para a água.

— Bom — Eu nunca pensei sobre isso, ninguém em minha casa perguntava — Como meu marido gosta?

— Milord gosta de banhos frios.

Um arrepio subiu por minha espinha, ele não está aqui, não preciso me preocupar em agrada-ló por hora.

— Banhos mornos — Levantei às sobrancelhas confusa sem saber o nome dela — Acho que não fomos apresentadas.

— Eva, senhora — Me respondeu, Eva tem cabelos em um tom de ferrugem e bonitos olhos azuis, não deve ter mais que minha idade.

— Quantos anos tem, Eva?

— Dezoito, senhora.

— Então devemos deixar de lado todas as formalidades, temos enfim quase a mesma idade, completarei meus 18 anos em pouco mais de duas semanas — Sorri — Pode me chamar de Miriane.

— Não acho que eu deva, mesmo com a mesma idade ainda será a duquesa de Bertro e eu uma simples criada, não devemos confundir as coisas.

— Não vai haver confusão, cresci com tantos irmãos que já me sinto estranha em não ter alguém me chamando pelo primeiro nome. Não conheço meu marido e não sei como é seu temperamento, soube que homens são mais reservados quando voltam da guerra e às vezes não conseguem lidar com seus traumas, não sei o que esperar.

— Bom — Ela travou por um minuto — Miriane — Sua voz soou insegura em dizer meu nome — Não posso te dizer muito, apenas que terá que ter paciência para viver aqui, nem mesmo os criados mais antigos permaneceram desde o retorno do capitão e temo só estar neste emprego pois Deus me abençoou deixando-o distante.

Meu coração se apertou em insegurança e medo.

— Tão ruim assim?

— É o que dizem — Ela parecia louca para fofocar, mas retomou a postura — Irei esquentar a água, depois irei misturar a gelada até que se torne morna.

Depois do banho me vesti com um simples e leve vestido antes de me juntar ao duque para um jantar, a sopa estava mais caldeada que o normal e o único pão na mesa havia sido colocado em um prato de sobremesa ao meu lado.

Além de rala a sopa estava sem sal, nela não havia cenouras ou batatas, nem mesmo pimenta.

Comi com um pouco de dificuldade algumas colheradas, toquei meus lábios com o guardanapo pronta para anunciar que estava satisfeita quando olhei na direção do duque.

Vi a mão direito do senhor tremer quando tentou levantar o braço, sua mão balançou no ar algumas vezes antes que a colher batesse com força sobre o caldo da sopa fazendo um pouco de sujeira.

Coloquei o guardanapo ao lado de meu prato tentando não o ver tentar novamente, não queria constrangê-lo em sua própria casa.

Mas quando a colher caiu novamente desta vez sobre a mesa foi impossível não olhar em sua direção.

— Desculpe-me pela bagunça — Ele disse sem jeito por chamar minha atenção — Não sei se a velhice ou a doença fazem minha mãos tão descontroladas.

— Não há problema algum — Respondi de uma forma gentil.

— E também por essa comida tão sem graça, nossas cozinheiras foram pegas de surpresa com sua presença e não tiveram tempo de preparar algo melhor.

— Eu adoro sopa, não se preocupe — Menti.

Reparei que ele não tentou novamente comer, talvez estivesse mesmo envergonhado com minha presença.

— Fiz uma viagem longa nos últimos dias dormindo desconfortável na carruagem com minhas irmãs — Sorri para ele — Se me permite já vou descansar, quero acordar cedo para receber meu marido.

— Bom, não sabemos se ele virá amanhã, talvez leve mais alguns dias como eu já disse. Mas entendo que foi uma longa viagem, vá descansar senhora Miriane Benedict, esposa do meu filho George Benedict. Duque e Duquesa de Bertro, não imagina o quanto me sinto contente em saber que essa linhagem não irá morrer comigo.

— Quanto a isso não se preocupe, com certeza conhecerá seus netos — Fui otimista, mas a saúde do senhor dificilmente permitirá que isso aconteça.

— Que suas palavras se realizem, agora vá, vá descansar para que possam logo começar a colocar este plano em ação.

Cruel Capitão Opowieści tętniące życiem. Odkryj je teraz