Capítulo 2

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Quando André abriu os olhos, ele já não estava mais em seu quarto.

O rapaz se encontrava em um cômodo quadricular, nenhuma porta ou janela à vista, as paredes pintadas de azul-bebê, com desenhos de nuvens estampados por toda a sua superfície; uma lâmpada amarelada descia do teto, iluminando o local de forma precária, e grama sintética cobria o chão inteiro, cutucando seus pés descalços.

Uma imitação barata de como seria o lado de fora.

— Boa noite, velho amigo!

Aquela voz o fez congelar, seu coração parando de bater.

A centímetros de onde ele estava, sentado em uma poltrona laranja berrante, se encontrava a criatura mais bizarra que André já viu em toda a sua vida.

Era um homem muito alto, beirando os dois metros de altura, totalmente careca, com a pele pálida feito papel, olhos dourados faiscantes e dentes negros e pontiagudos. Como se sua aparência horrorosa não bastasse, ele estava vestido em roupas que fariam qualquer estilista ter um ataque cardíaco: por baixo do velho jaleco médico, ele usava uma camiseta vermelha com a estampa de uma espiral, largas calças azuis com listras amarelas e um par de tênis pretos imundos. Para completar o estranho visual, um boné com hélice cobria sua cabeça, a hélice girando por conta própria.

Uma poltrona roxa se encontrava ao lado dele, esperando para ser usada.

— Como vai, meu paciente favorito? — A criatura acenou, um sorriso de orelha a orelha. — Vamos, sente-se! Não temos a noite toda!

Com o sangue correndo gelado em suas veias, André se aproximou da poltrona, sentando-se roboticamente. Em meio aos gritos de sua mente, ele conseguiu forçar um sorriso.

— Boa noite, Dr. Garcez...

O médico piscou, como se surpreso, para então soltar uma gargalhada. O som era de arranhar os ouvidos.

— André, você sabe que não precisa ser formal...apenas me chame de Bob!

— ...desculpa, Bob...

— Não tem problema, amigo! Imagino que a barriga vazia esteja te incomodando.

Como num passe de mágica, uma mesinha redonda apareceu entre as poltronas, uma travessa cheia de pães de queijo surgindo sobre ela.

— Aqui, pegue um petisco antes de começarmos! — Bob sorriu.

O sorriso de André hesitou, seu estômago se amarrando em um nó; duvidava que pudesse manter qualquer coisa dentro de si, mas recusar não era uma opção.

Ele esticou o corpo, pegando um dos pães e dando uma mordida minúscula. O sabor era parecido com plástico, quase tão artificial quanto o resto da sala.

Claramente satisfeito, Bob estalou os dedos, uma prancheta surgindo em suas mãos. Ele pegou uma caneta de debaixo do boné, seu sorriso ainda firme e forte.

— Vamos começar com o básico primeiro. — Seus olhos dourados pousaram em André. — Está se hidratando direitinho? Tomando muito líquido?

André engoliu, sentindo o pedaço de pão arranhando a garganta.

— Uh, sim, claro que sim!

"Café ainda conta como um líquido, certo?"

— Perfeito! — O estranho médico anotou sua resposta. — Comendo três refeições ao dia?

OneirofobiaWhere stories live. Discover now