02 - Gatos imaginários no cômodo

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Era com seu avô dizia: Quando se tem bons contatos, o talento não é o mais importante. Se o velho Richard Hopkins não tivesse razão nessa filosofia de vida tão distorcida, Thed podia estar certo que estava em apuros. Porque talento nessa profissão era mais do que evidente que ele não tinha. E ao parecer, nem ao menos a freira, que era seu principal contato a partir de agora, tinha simpatizado muito com ele.

Sua popularidade estava cada vez mais baixa, ele constatou, até mesmo uma mulher de Deus tinha uma má reação ao vê-lo... O que era aquela história de arrastar a Madre Superiora para fora assim que colocou os olhos dele? Bons modos não faziam parte do pacote para ser freira? Ele apostava todas as suas fichas que não existiam de que ela estava do outro lado da porta falando mal dele.

E não a culpava, de verdade, geralmente ele causava mesmo essa reação de repulsa nas pessoas. Mas pensava que isso era só com membros da alta sociedade. Imaginou que isso tivesse relação com a sua falta de roupas adequadas, ou até mesmo pela falta de segurança em seu trabalho. Sendo que ele nem sequer tinha sido posto à prova com as contas naquele Colégio.

Contudo, enquanto entreouvia os murmúrios das religiosas do outro lado da porta, começou a pensar que talvez tivesse algo a mais. O que mais? Ele se perguntou como se já não tivesse itens suficientes para se preocupar.

Ah, lá estavam elas de volta. E o único que Thed conseguiu descobrir ao olhar para as duas foi que a religiosa mais nova ainda conservava aquele olhar aterrorizado.

Será que ele tinha alguma sujeira no rosto?

Antes de levar discretamente a mão no rosto para verificar. A freira começou a falar com uma voz muito baixa.

- Me desculpe a grosseria senhor Hopkins, só tinha algumas dúvidas sobre o trabalho que precisei perguntar à Madre – e Thed chegou a pensar que talvez ela estivesse tão aterrorizada com números quanto ele.

- Senhor – interrompeu a Madre seus pensamentos. – Te apresento sua nova ajudante, Mary-Claire, vocês poderão trabalhar nos livros de contabilidade todas as tardes dos dias de semana, ela poderá esclarecer para você qualquer dúvida em relação aos números do Colégio, pois já está aqui a bastante tempo. Alguma dúvida?

Thed desde garoto sempre achou a Madre Superiora uma pessoa muito séria, mas agora também a achava muito boa. Caso contrário ela não teria dado a ele essa oportunidade fazer a contabilidade do colégio, muito menos disponibilizaria uma de suas freiras para ajudá-lo.

Não era só a Madre que estava ciente de que ele não era tão talentoso quanto deveria com os números. O caminho mais fácil seria dar-lhe as costas, como tantos outros amigos de eu avô fizeram. Mas a boa mulher fez justamente o contrário, ela lhe deu uma chance. Talvez a última. Por isso ele era grato.

- Mary, Theodore. Alguma duvida? – perguntou a Madre mais uma vez, já que ele, e a freira também, pareciam estar imersos em seus próprios pensamentos.

- Não. – disseram os dois em uníssono, ele um pouco mais animado do que a freira.

- Pois bem, se é assim deixo vocês a sós pra se conhecerem e começarem o trabalho de uma vez – disse a Madre antes de sair da sala discretamente.

Assim que a anciã saiu, se instalou um silêncio quase que palpável no lugar, a freira nem ao menos se mexia, continuava com seu olhar fixo no chão. E após trinta segundos vendo a moça quase como uma estátua de gesso, Thed acabou aceitando o fato de que seria ele quem ia ter que dar alguma direção à conversa.

- Vai ser um prazer trabalhar com a senhorita – ele falou.

E foi um comentário idiota por dois motivos: primeiro porque não estava sentindo prazer nenhum naquela situação; segundo porque se ela era uma freira, provavelmente não era uma senhorita. Mas isso ele não sabia ao certo.

ParaísoWhere stories live. Discover now