últimos momentos

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Trecho do livro "Mais Pesado que o Céu", no qual o autor retrata os últimos momentos de Kurt Cobain de uma maneira perturbadora e detalhada:

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Trecho do livro "Mais Pesado que o Céu", no qual o autor retrata os últimos momentos de Kurt Cobain de uma maneira perturbadora e detalhada:

Dois dias antes, nas horas que antecediam a alvorada de terça-feira, 5 de abril, Kurt Cobain havia despertado em sua cama, os travesseiros ainda com o cheiro do perfume de Courtney. Ele havia inalado pela primeira vez essa fragrância quando ela lhe enviara a caixa de seda-e-renda em forma de coração, apenas três anos antes: ele ficaria cheirando a caixa durante horas, imaginando que ela a havia tocado as partes íntimas de seu corpo. No quarto, naquela terça-feira, o aroma dela se misturou com o cheiro ligeiramente picante de heroína cozida — este também era um cheiro que o despertava. 

Fazia frio na casa e por isso ele tinha dormido com as roupas do corpo, inclusive seu casaco de veludo marrom. Em comparação com as noites que ele havia passado dormindo ao relento em caixas de papelão, até que não estava tão ruim. 

Ele estava usando sua confortável camiseta "Half Japanese" (fazendo propaganda de uma banda punk de Baltimore), suas calças Levi's favoritas e, quando se sentou na beirada da cama, amarrou os cadarços do único par de calçados que possuía — um par de tênis Converse.

A televisão estava ligada, sintonizada na MTV, mas o som estava desligado. Ele caminhou até o aparelho de som e colocou para tocar o disco do R.E.M., Automatic for the People, reduzindo o volume para que a voz de Stipe soasse como um sussurro agradável ao fundo — mais tarde Courtney encontraria o aparelho ainda ligado e este CD na bandeja. Ele acendeu um Camel Light e caiu de costas na cama com um bloco de tamanho A4 apoiado em seu peito e uma caneta vermelha de ponta fina. O pedaço de papel branco o deixou num breve transe, mas não devido a um bloqueio de escritor: ele havia imaginado essas palavras durante semanas, meses, anos, décadas. Ele parou apenas porque até uma folha tamanho A4 parecia muito pequena, muito finita. Ele já havia escrito uma longa carta pessoal á sua esposa e filha, rapidamente rabiscada no papel enquanto estava no Exodus; ele havia trazido esta carta até Seattle e a havia enfiado sob um dos travesseiros impregnados de perfume. "Você sabe, eu amo você", escreveu ele naquela carta. "Eu amo Frances. Eu sinto muitíssimo. Por favor, não venha
atrás de mim. Eu sinto muito, muito, muito." Ele havia escrito repetidamente "Eu sinto muito", enchendo uma página inteira com esse pedido de perdão.
"Eu estarei lá", continuou ele. "Eu protegerei você. Não sei onde estou indo. Simplesmente não posso mais ficar aqui." 

Tinha sido muito difícil escrever aquele bilhete, mas ele sabia que esta segunda carta seria igualmente importante e ele precisava ter cuidado com as palavras.
Ele a endereçava "Para Boddah", o nome de seu amigo de infância imaginário. Ele usava caracteres minúsculos, deliberadamente, e escrevia em linha reta sem ajuda de pautas. Ele compunha as palavras muito sistematicamente, certificando-se de que cada uma fosse clara e fácil de ler. Enquanto escrevia, a iluminação da MTV fornecia a maior parte da luz, já que o sol ainda estava nascendo.

 Enquanto escrevia, a iluminação da MTV fornecia a maior parte da luz, já que o sol ainda estava nascendo

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Nirvana ➳ Kurt CobainWhere stories live. Discover now