Capítulo 12

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Passei a noite inteira lendo poemas. O silêncio daquele casebre predominava a noite fria e nevosa. Depois de algumas horas lendo Clarice Lispector acabei pegando no sono e me esquecendo de fechar a porta o que iria fazer a claridade sobrelevar o cômodo.

Ao amanhecer, ouvi uma música alta vindo da sala, levantei-me e fui indo em direção a canção. Tocava A song about love do jake bugg, além de ter alguns traços parecido ao cantor, o suposto garoto mal educado também curtia as músicas do bugg.

Caminhei até a sala e me deparei com ele deitado no velho sofa encontrado no canto do casebre, com o som muito alto e seus olhos fechados, o garoto apreciava a musica, sentia o que ela transmitia enquanto liberava a fumaça do cigarro pela boca.
Fiquei durante um tempo o observando encostada na porta do quarto. Enquanto a musica tocava, ele largava um sorriso escondido em seus labios, parecia que aquela música
trazia lembranças boas e que o fazia muito bem.

Depois de alguns minutos, ele abre os olhos e olha para mim o observando, e logo depois se indireita no sofa e larga um sorriso.

- Acho que me empolguei com o som - Ele diz apontando para a poltrona - Pode sentar se quiser.

Fui em direção a poltrona e ao sentar ela fez alguns barulhinhos e reclamações e era evidente que a qualquer momento ela iria se desmanchar.

- Você tem bom gosto musical - me direcionei a ele sorrindo.

Ele sorri e também se direciona a mim.

- Essa musica me lembra uma época em que minha vida era completamente diferente.

Eu imaginava que aquela canção tinha alguma acepção para ele.

- Eu percebi, parece ter um significado para você - Digo arrumando minha franja bagunçada.

Ele olha fixamente para o chão em silêncio e depois de alguns segundos ele suspira.

- Ela era tão linda, parecia que nunca iria me deixar. Era recíproco - Ele pausa e se direciona a mim - Eu a amava tanto.

Permaneci em silêncio, sabia que não deveria perguntar algo sobre essa pessoa pois não tínhamos intimidade para isso. Eu era uma estranha hospedada em sua moradia e ele, um garoto que morava sozinho no meio do nada que me aceitou em sua casa. Não tínhamos proximidade, não iria comentar sobre o assunto.

- Ela era o amor da minha vida - Ele quebra o silêncio - Você já sentiu essa ligação e afeto por alguém?

Eu continuo em silêncio com a cabeça inclinada para os meus pés, apoiando meu braço em minha perna e torcendo para que a poltrona não se desmanchasse. Balanço minha cabeça negando e permaneço na mesma posição sem dizer uma palavra.

- Você não é de falar muito - Ele diz sorrindo.

Eu deixo um sorriso escapar e então me conduzo a ele.

- Eu nunca passei por isso, não sei o que é amar, reciprocidade e viver um romance igual essas histórias clichês.

- Mas não é clichê - Ele me interrompe - Se você nunca amou e não teve alguém que lhe fizesse se sentir única - Ele altera seu tom de voz - Não chame os relacionamentos das outras pessoas de "romance clichê". Não foi assim, foi singular, foi amor.

Permaneci em silêncio, ele não gostou do que eu disse, ficou bravo e não era a minha intensão ofender ou criticar o sentimento dele, eu só me expressei errado. Não tinha o porquê exprobar.

- Não foi minha intensão - Digo na tentativa de me explicar - Eu não quis menosprezar o seu sentimento, eu apenas não soube me expressar.

Ele ficou em silêncio e saiu da sala sem dizer uma palavra.
Continuei ali naquela sala empoeirada, sentada em uma velha poltrona caindo aos pedaços com uma luz fraca que transcendia  pela velha janela.

A tarde inteira o garoto não apareceu, permaneceu dentro do quarto, trancado e sem fazer um barulho sequer. Fui a cozinha, peguei um pacote de biscoito que ele havia comprado, sentei no sofá e liguei o som. Talvez ele saísse de dentro daquele cômodo e brigasse comigo ou apenas ignorasse a minha existência naquela casa.

O som era alto, uma caixa de som potente e ligada a bateria, pensei em não usar para manter a carregada mas não consegui evitar, eu precisava fazer algo, precisava me esquentar, então liguei o som e coloquei Snap Out Of It do Arctic Monkeys e comecei a dançar.

A musica estava muito alta, dançava e rodopiava ao som de AM até observar que havia alguém me olhando dançar. Era o garoto, encostado na porta e rindo.

- Você dança muito bem - Ele diz sorrindo com os braços cruzados.

Ruborizo por alguns segundos e baixo o volume rapidamente, coloco o biscoito inteiro na boca e tento me explicar de boca cheia.

- Olha só - Me direciono a ele - Não é o que você está pensando.

Ele me olha da cabeça aos pés e então diz:

- Eu sei o que vi, você estava dancando.

Eu volto para a cozinha com o pacote de biscoito vazio e coloco no lixo.

- Eu não comi o seu biscoito.

Ele se aproxima de mim calmamente e então cochicha

- Pode ficar tranquila, eu não irei contar a ninguém sobre seus passinhos de dança e em relação a os biscoitos.

Eu sorrio de volta e então me afasto do sujeito.

- Então, você poderia ao menos me falar seu nome? - Ele pergunta.

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