Capítulo 1 - O ataque I

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Uma noite estrelada iluminava uma aldeia ocupada por missionários jesuítas, mas não havia nem padres nem curumins contemplando o espetáculo. Todos, exceto a vigília, dormiam.

Três colonos e um índio estavam de prontidão, com os olhos atentos ao entorno da aldeia. O que nenhum deles podia imaginar era que a ameaça não despontaria de fora.

De dentro de uma das ocas, um doente despertou com fome e surpreendeu o companheiro ao lado, devorando seus membros superiores com uma avidez que nenhum canibal já havia demonstrado. Os gritos rasgaram a noite.

Despertos, colonos e guerreiros tupinambás se armaram para a defesa, tentando detectar alguma invasão. Entretanto, não tinham qualquer chance de vencer o ataque – apenas porque não podiam entender o inimigo.

O inimigo não caía com uma flechada. Muito menos com uma oração.

O chefe Tibiriça, um tanto atordoado pelos gritos e desequilibrado pelo sono, conseguiu carregar seu arco a tempo e acertou a coluna de um colono. Mas não pôde fazer mais que isso. Após o disparo, o pomo de adão do chefe fora arrancado com dentes muito afiados.

Estranhamente, havia mais de um esfomeado. Com o olhar vazio e a boca cheia de dentes, foram estilhaçando os aldeões sem fazer distinção de cor, lança, pólvora, água benta. Nem todos foram devorados, mas nenhum seria salvo. Naquela noite, Deus não estava ali.

Corpos MísticosWhere stories live. Discover now