Vênus se revela

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Nosso segundo encontro após a separação de quase um ano, aconteceu em um ambiente elegante, casamento já costumeiro dos estilos, rústico de madeira envernizada escura, parede de tijolos à vista com a ostentação dos inúmeros lustres chiques, parecidos com as joias que cobrem as mulheres da Índia.  No local, acontecia uma confraternização qualquer e por acaso, nossa mesa era umas das poucas que não tinha vínculo com aquelas pessoas. 

— Porque tudo isso? Porque esse ambiente? — Indago aborrecido.

— Joaquim, você não percebe o que temos hoje em nossas mãos? Eu e você somos tão parecidos na mesma medida em que somos completamente opostos. — Ele ameaça segurar minha mão e se retrai em seguida. —  Quando estávamos juntos, você vivia num pedestal, um homem que parecia ser feito de algum cristal raro... Lembra-se de como era, de quantos banhos vocês tomava e de quanto aborrecia-se com qualquer coisa que ficasse deslocada por milímetros? — Ele aponta para meu copo. — Como seu copo, agora. 

— Você sabe que sou assim... não me atormente por isso.

— Eu sei... hoje só queria ter uma única chance de explicar o que aconteceu comigo. Não te amo e não vou mentir para você. — Ele me atira na cara. — Queria compreender o que sua cabeça pensa hoje, hoje entende? Eu sei que há algo novo.... Tá eu gostei de você e me atraía no começo, mas você me afastou com esse seu jeito estranho. Agora... me interessa... Joaquim...Desde a primeira vez que nós nos juntamos, teve um propósito e não sabíamos.

— Xavier, eu sinceramente... 

— O que tem a perder? — Ele me interrompe.

— A paciência. — Devolvo com desprezo. —Devia procurar um psiquiatra. Ou Pacheco. 

— Vai ter me lembrar todas as vezes desse nome? Olha, ele me viu sofrer por sua causa. Pacheco não era o homem certo.

— Ah sei... — Não acredito no que ouço e sorrio com desdém. — Vamos lá: gostei de você e você achou que tinha um "algo" mais, então ficamos juntos e você percebeu que eu não atendia suas necessidades, correu para os braços do seu sócio e também não ganhou dele o que esperava ganhar. Aí volta pra mim. 

— É que eu sou um pouco diferente... — Ele baixa o olhar timidamente, numa postura que não está em conformidade com sua expressão arrogante de sempre.

— Você é um safado. Não vou voltar atrás.  

— Ah Joaquim, você era tão falante, gostava de conversar e eu não tinha paciência com seus assuntos, eu... eu tinha essa necessidade diferente. Me sinto estranho por comentar.

— Sabe, Xavier, me lembro de todos esses detalhes e nossas conversas, aliás, os diálogos que eu tinha comigo quando você saía fora do plano. Fala de minha estranheza, mas não é muito diferente.  Posso perguntar uma coisa? — Ele assente com a cabeça. — O que exatamente quer comigo?

— Eu tenho alguns segredos, não é algo que eu posso sair por aí comentando e mesmo que eu aceite, preciso confiar inteiramente... você me entende? Sabe quando você sente a alma de outra pessoa? Olha, eu não me humilharia se não tivesse notado algo novo. Joaquim, talvez você só esteja meio perturbado ou com ideia de vingança, porque quase me estrangulou na sua cama, mas eu aceito o que quiser. Apenas me aceite. Me escravize, me tenha. Por favor.

O rosto dele cora num tom escuro, ele contrai os ombros e as coxas, fechando-as e apertando.

O movimento, falatório em volume alto em que todos querem se fazer ouvir, era algo que nos perturbava, isso nos fez interromper a conversa e jantar em silêncio. Evitamos os olhos nos olhos. Não haveria mãos nas mãos e nem romantismo. Ele pareceu-me disposto a dar-me mais do que oferecera no último encontro em minha casa e nisso, eu realmente achei algum interesse.   

ProfundoWhere stories live. Discover now