2. Alex

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Eu não precisava pegar o ônibus, meus pais poderiam me trazer. Cada um tinha seu próprio carro e o tempo para tal, mas eu pegava por Zoe.

Ela bateu o carro da mãe e foi proibida de dirigir. Fiquei chateado com a sra. Carter, pois ela pareceu mais preocupada com o valor do conserto do automóvel do que com a filha com um corte na testa e uma lesão no braço esquerdo.

Então eu pegava o ônibus toda manhã e sentava ao lado de Zoe. Revezávamos a janela e ouvíamos música. Ela não tinha um gosto específico além de Nirvana, os Ramones e Michael Jackson, então usávamos meu iPod.

Quando entrei naquele monstro amarelo no primeiro dia de aula do último ano ela não estava lá. Eu liguei e foi direto pra caixa postal: "Oi, se você não é da minha família ou o Alex, você provavelmente ligou pro número errado, mas se quiser ouvir isso pessoalmente, deixe seu recado."

É claro que ela chegaria atrasada. É claro que ela chegaria faltando 30 segundos pra primeira aula, suja de cereal e ainda vestindo parte do pijama. E é claro que eu adorava isso nela. Algumas pessoas a chamavam de Zoe Furacão, como se isso fosse uma ofensa, mas era a melhor parte de estar perto dela: a sensação de sentir seguro no olho de um furacão. Era essa a sensação. Qualquer coisa poderia acontecer e no final, você provavelmente iria rir muito.

Mas desde o verão ela parecia um pouco distante, agindo como se algo a incomodasse, ou se estivesse escondendo alguma coisa e eu não sabia o que. Depois do acampamento notei que como ela me encarava quando achava que eu não estava olhando e se virava rapidamente quando eu encarava de volta. Pensei que talvez ela não tivesse gostado que eu a tivesse abraçado na nossa barraca, mas isso era besteira, certo? Nós prometemos que sempre seríamos amigos.

Decidi não insistir na história, ela poderia me contar quando quisesse e ela sabia disso. Sempre havíamos sido o lugar seguro um do outro. Claro que eu sabia o ranking dos sorvetes favoritos dela.

- Já matamos a primeira aula por causa do seu atraso, melhor não perdemos matemática, você sabe que não pode ser dar ao luxo - falei com tom brincalhão, mesmo sabendo que era verdade. Zoe lutava com a matemática desde os primórdios.

- Você tem zero habilidades sociais - rebateu ela, sem tom brincalhão.

- Por isso somos amigos, não é? - Ri forçado, de repente sentindo como se algo estivesse errado.

- É, provavelmente é por isso - falou Zoe com um brilho diferente nos olhos. Definitivamente havia alguma coisa errada e eu ia descobrir o quê. Assim que ela se acalmasse um pouco. Zoe nunca deixava a situação com os pais a afetarem assim, por isso desconfiava que era outra coisa. Mas o que ela sentiria necessidade de esconder de mim? Seu melhor amigo e pessoa favorita?

***

Candice e Zoe estavam sentadas na nossa mesa quando fui para o almoço. Reconheci o cabelo castanho-avermelhado todo bagunçando do outro lado do refeitório.

- E aí, galera? - Galera? Agora eu é que parecia um esquisitão.

Zoe me olhou e depois continuou comendo suas batatinhas. Tinha um Burger King e um McDonald's na rua da escola.

- Zoe, eu e você poderíamos fazer uma dieta livre de carboidratos juntas, você não acha? - Candice perguntou e eu franzi a testa. Que coisa mais rude de se dizer.

- Carboidratos fazem bem pra saúde. Algo a ver com glicogênio e energia - argumentou Zoe, desinteressada.

- É - concordei -, o glicogênio adquirido pela ingestão de carboidratos se liga à partículas de água quando armazenados, e quando se faz esse tipo de dieta restritiva você perde essa energia de uso imediato e perde massa magra. Suas unhas ficam quebradiças, seu cabelo cai, mau-humor.

- Você é mesmo muito inteligente,baby - disse Candice e me beijou. Seu cabelo loiro e na altura dos ombros roçou no meu rosto.

Zoe revirou os olhos, não sei se para o que eu disse ou para demonstração pública de afeto. E isso porque eu estava tentando ficar do lado dela nessa.

- E como é que você sabe tanto sobre carboidratos? - quis saber minha namorada.

- Ah, Candy, li em um site, eu acho. E gosto de biologia - respondi com um sorriso fraco.

- Sabe, Zoe, você fica bem sem os óculos. Você está sempre se escondendo por trás dessas lentes e tudo - comentou Candice. - Nós poderíamos cortar seu cabelo num channel ou algo assim.

Deus do céu. Candice falou do cabelo e dos óculos?

- Obrigada, Candy, mas eu gosto do meu cabelo do tamanho que está e preciso dos óculos pra enxergar.

- Você não está usando eles agora. E poderia usar lentes - tentou Candice.

- É, isso não vai acontecer - encerrou Zoe. - Hoje estou com dor de cabeça, cheiro a leite azedo e não estou no clima de segurar vela, então, se vocês me dão licença - falou Zoe se levantando.

- Foi algo que eu disse? - perguntou Candice, inocentemente.

Caraca, eu era péssimo como mediador.

Nós Podemos Ter TudoWhere stories live. Discover now