26. Alex

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Qual o conceito de “tarde demais”?

 Depois da meia noite quando a carruagem vira abóbora e o sapato é perdido na escadaria de um castelo em um reino de centenas de mulheres (que por acaso não usam 33 - o quê?)?  

 Depois do horário de embarque num aeroporto lotado, o avião já pequeno no céu?

 O último trem que acabou de sair e que foi perdido por questão de segundos porque você parou para amarrar os cadarços?

 Um garoto que é melhor amigo de uma garota por cinco anos e aí se apaixona por ela?

 Eu não tinha um bom plano para conquistar alguém que já me conhecia mais que qualquer outro; com que ela me visse com outros olhos. Seria como tentar convencer um turista em Nova York a largar o binóculo com uma vista perfeitamente boa da Estátua da Liberdade e olhar através de outro.

 Mas era exatamente o que eu tentaria fazer.

 Mesmo que fosse minha vez de ir na janela, não reclamei meu assento quando entrei no ônibus e a encontrei lá - o que não era novidade. Ela raramente respeitava o nosso revezamento.

 Queria que ela percebesse as pequenas atitudes. Por outro lado, eu sempre acabava deixando a janela para ela.

 Veja bem, eu era o que se podia chamar de uma pessoa passiva. Mas estava trabalhando nisso.

 - Achei que Chloe ia te levar - comentei, me sentando.

 Zoe arregalou os olhos por um momento.

 - Esqueci… uma coisa - mentiu, obviamente. - Chloe me deixou em casa pra pegar e aproveitei o ônibus.

 Ela parecia ter se esquecido de que eu sabia reconhecer os sinais da sua falta de sinceridade. E não era muito boa nisso, também, então acho que qualquer pessoa seria capaz de dizer que ela estava mentindo.

 - Hum - falei um pouco incrédulo e dei um fone para ela. Sweet dreams começou a tocar. Ela fez uma careta.

 - Não reflete meu humor pela manhã, mas ok.

 Balancei a cabeça e pesquei meu livro da mochila. Eu achava rochas fascinantes, só não àquela hora da manhã. Acontece que Harvard não poderia se importar menos com isso. Tinha que aproveitar minhas oportunidades de estudar.

 A próxima música começou e percebi que deveria ter trocado quando Zoe reclamou.

 Eu podia me recuperar desse começo. A cada música que começava eu olhava para o lado para saber se deveria trocar. Mas Zoe já tinha cochilado. Estava tão bonita com a cabeça encostada na janela, iluminada pelo sol, os longos cílios se mexendo de leve.

 Não que não a achasse bonita antes, mas era diferente o modo como eu reparava nisso antes.

 Acordei-a ao chegarmos, apesar de não querer. Achei que seria vítima de alguma explosão de mau-humor por ser acordada, mesmo que por um motivo válido, porém ela só bocejou e piscou antes de descer do ônibus.

  Se estivesse chovendo, eu poderia colocar meu casaco numa poça para ela pisar. Esse seria um nobre gesto do qual ela faria piada pelo resto do dia.

 A verdade era que eu não fazia ideia do que estava fazendo.

 Hesitei quando passamos por Candice a caminho da nossa primeira aula. Ela mal me olhou. Newt, nosso amigo, acenou.

 A escola já via os primeiros sinais das decorações do Halloween, que aconteceria dali a dois dias. A nossa festa começaria no fim da tarde do dia trinta e um.

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