vinte e seis.

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— Como foi a vossa conversa? — Greta perguntou, genuinamente curiosa.

Depois da minha pequena conversa com o seu irmão, quando subi as escadas e entrei no quarto a encontrei deitada na cama a mexer o celular.

— Nem um pouco produtiva.

— Você escutou o que ele tinha para dizer?

Coloquei o penúltimo dominó numa curva com cuidado para não estragar todo o meu trabalho.

— Mais ou menos — murmurei, com os olhos presos na ilustração. — O seu irmão gosta muito de meias verdades e eu de certezas — a encarei. — Ele sempre fala de forma enigmática. Nunca me diz nada por completo e isso irrita.

— Ele tem medo de você não compreender.

— A sério? — fingi estar surpresa.

— Sim — ignorou o meu tom. — Eu queria tanto te contar tudo, mas esse não é um direito meu e ele ficaria bravo comigo.

A afirmação dela atiçou a minha curiosidade.

— Então você sabe de tudo? 

— Claro. Eu vivo aqui e ele é o meu irmão — revirou os olhos. — O único com a mente distorcida mesmo é o meu pai — encarou-me com atenção. — Não querendo comprar briga nem nada, mas generalizar certas coisas não é legal — não esperou por minha resposta. — Voltando ao assunto inicial, eu tenho a resposta para todas as suas perguntas e muito mais, mas não quero quebrar a confiança que nós dois temos. Entende?

— Infelizmente , sim — murmurei.

Eu também faria o mesmo pelo Keanu e fiz. Não contei a ninguém sobre ele raptar garotas em troca de dinheiro. E apesar de tudo isso, tenho saudades dele. O considerei — e ainda considero — a minha família durante muito tempo. Mesmo que quisesse guardar rancor não conseguiria.

Ele deve estar devastado com o meu sumiço. Nunca parei para pensar em como ele se sentia a estar no lugar dos pais que tiveram as suas filhas raptadas, mas acredito que nós os dois estejamos a desfrutar do que preferimos manter em segredo.

Só espero que Bethany esteja a fazer um bom trabalho como namorada e ser o porto seguro dele, nesse momento.

— Finalmente — comemorei quando coloquei o último dominó, terminado de fazer o pássaro com as asas abertas. Ou quase isso.

— Falyn, meu Deus, isso está incrível — ela saiu da cama e parou ao meu lado.

— Eu sei — joguei os meus cachos para trás. — Dizem por aí que ser perfeita em tudo que faço é uma das minhas qualidades.

Ela empurrou o meu ombro de leve e em seguida deu uma risada alta a fazer-me rir também.

— Não sabia que o seu ego não tinha medo de altura para subir tão alto — provocou, a fazer-me lembrar-me de Haden. Ele também disse uma coisa parecida com isso.

E por pensar nele, não vejo a hora do mesmo chegar de madrugada no quarto para levar-me e sairmos. Para eu poder respirar um ar diferente desse.  Mesmo que isso só durasse algumas horas, para mim, é o suficiente. É algo.

E cumpriria com a minha promessa de não tentar fugir. Não me sentiria bem em saber que coloquei a vida de uma pessoa que ele ama tanto em perigo.

— Não empurra o dominó agora — ela andou até a sua cama, para levar o celular. — Quero filmar essa obra de arte — elogiou. — Pode empurrar.

E com essas palavras empurrei o dominó e vimos uma sequência a acontecer. Tudo estava muito lindo e eu orgulhosa do meu trabalho porque demorei séculos para o fazer.

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