Capítulo 3

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E se eu for o primeiro a voltar
Pra mudar o que eu fiz
Quem então, agora eu seria?

O velho e o moço, Los Hermanos

Hoje era mais um dia de treino e eu estava um pouco mais disposta. Havia parcialmente superado o desenho que minha mãe rasgou e já tinha me acalmado. 

Comecei o dia sem comer, eu era proibida pela minha mãe e nem tínhamos nada de café da manhã em casa. Eu deveria ser extremamente magra para ser bonita. No almoço, apenas algumas folhas de salada e água. Às vezes comia algum peixe. Durante a tarde, eu tomava meio copo de leite e na janta comia salada novamente. A mesma coisa todo dia. 

Durante meus treinos, eu equilibrava muitos livros em minha cabeça com um salto alto considerável. Quando caía, minha mãe me repreendia duramente então aprendi a me equilibrar na marra. Também treinava o modo de falar, tinha que ser sempre impecávelmente educada e eu só sentia vontade de ser uma pessoa normal, que age normalmente e fala normalmente. 

Treinava a forma que movia meu corpo, cada pequeno movimento e até às expressões faciais. Minha mãe me obrigava a sorrir por 3 minutos sem desfazer e caso isso acontecesse, ela colocava um punhado de pimenta em minha boca. Precisei aprender a sorrir mesmo sem vontade. Isso seria muito eficiente caso eu precisasse fingir algum orgasmo. 

Cada pequeno pedaço de mim era feito para ser uma boneca perfeita, que não responde, não tem estímulos e apenas é feita para agradar visualmente a outras pessoas. 

Eu era como uma máquina, sabe? Eu me sentia assim e era tratada assim. Minha mãe me via apenas como um troféu para mostrar aos seus amigos de alta classe. E meus sentimentos mais uma vez eram deixados de canto. 

Eu resolvi despairecer e deitar na minha cama. Estava com vontade de quebrar as regras um pouco e por mais bobo que isso pudesse parecer, resolvi comer uma barra de chocolate que escondia às sete chaves em armário. Comi dois pedaços e quando me levantei para guardar, minha mãe entrou. Droga! Tinha esquecido a porta aberta! Ela viu a barra de chocolate em minhas mãos e surtou. Eu era tapada e não era pouco.

— Charlotte, o que você está fazendo?!

— Mãe… eu… eu só quis comer um pouco de doce.

— Você está louca?! Todo o esforço que tive todos esses anos para te transformar na princesa que você é agora e você faz isso? 

— É só um chocolate… - eu suspirei com um pouco de tristeza.

Minha mãe não satisfeita, se aproximou e puxou meus cabelos longos e castanhos. Eu a olhava assustada e ela me deu um tapa na cara. Tomou o chocolate de minhas mãos e saiu, batendo a porta. Ao sair, ela bradou

— Pense no seu pai! 

Me sensibilizei quando minha mãe falou de meu pai pois, lembrei vagamente de como ele era comigo. Tão carinhoso, amoroso. Apesar de ele morrer quando eu tinha meus 5 anos, tenho doces lembranças. Mesmo sem querer, comparei a vida inocente que eu levava antes de minha mãe cismar em me transformar numa modelo famosa. Eu realmente precisava ser aquela pessoa?

O auge dos 20Where stories live. Discover now