7 - EnGula | Parte 1

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Capítulo 7

Conto 3 – EnGula



Tempo presente.

O cheiro de bacon queimado empesteava o bar, e isso foi apenas um convite para Marlon entrar. O bar era como um corredor: em uma parede ficava o balcão com as bebidas atrás e com algumas cadeiras na frente, e na outra parede cinco mesas lado a lado. Apenas duas mesas estavam ocupadas. Em uma delas havia um casal conversando, comendo uma porção de fritas e bebendo cerveja. Na outra havia apenas uma mulher sozinha vestida toda de branco. Marlon até pensou em puxar assunto com ela, mas os acontecimentos recentes ainda o abalavam. Não estava ali para paquerar, e sim para beber e tentar, nem que fosse por algumas horas, esquecer a vida.

Mas a mulher de branco o observava.

Marlon não se sentou em nenhuma mesa. Apenas se encostou no balcão e pediu uma bebida. Não sabia que estava sendo observado. Muito menos que eram dois observadores. A mulher não tirava os olhos dele, mas foi um idoso quem entrou no bar após tanto observá-lo do lado de fora. Marlon não deu atenção para o velho e continuou bebendo sozinho. O senhor atravessou o corredor e se sentou na mesa da mulher de branco.

— O que está fazendo aqui? — a mulher perguntou.

— Trabalho — disse Evagrius Ponticus, o caçador de pecados.

— Não venha atrapalhar o meu.

— Morte, pelo amor — Evagrius revirou os olhos. — O meu trabalho vem em primeiro lugar, mas você pode me ajudar.

— Claro... te ajudar — a Morte pegou um celular do bolso e olhou para a tela.

— Me diz, quem vai morrer primeiro?

Ao contrário do que muitos pensam, a Morte não é responsável por matar pessoas. Mas quando elas morrem, o trabalho dela é levar suas almas para o Purgatório, onde serão julgadas e condenadas. Para saber quem está prestes a morrer ela utiliza aparelhos devidos à cada linha temporal. Em eras passadas a Morte usava ampulhetas. Ela apontava a ampulheta para as pessoas e então podia ver quanto tempo faltava para sua morte. Depois passou a usar relógios de bolso, e depois os de pulso. Hoje em dia a Morte usa celulares, e com eles ela analisa o tempo de vida de cada um. E foi o que ela fez naquele bar.

Morte mirou o celular para o casal ali perto. O homem teria mais cinquenta e três anos de vida, uma vida longa pela frente. Mas a mulher que o acompanhava só tinha mais cinco anos de vida. Morte ficava curiosa, mas não podia saber a causa de cada óbito antes que acontecessem. Depois de analisar o casal ela mirou para Marlon, e viu que restavam poucos minutos para o homem.

— Preciso salvar a alma dele — disse Evagrius se erguendo da mesa.

— Fica quieto aí! — Morte o puxa de volta para a cadeira abruptamente. — A alma dele já é minha, não entendeu? O relógio nunca falha. Ele vai morrer ainda hoje.

— Eu não disse que vou salvar a vida dele — Evagrius, na forma de um velho, se ergueu da cadeira. — Eu vou salvar a alma dele. Vou mandá-lo para o Céu, e não para o Inferno. — O caçador de pecados se dirigiu até o balcão e sentou-se ao lado de Marlon. — Opa, amigo, tudo bom? — disse para o barman. — Me vê uma cerveja da mais vagabunda que tiver, por gentileza.

— Não tem dinheiro, ou só quer ficar de porre? — Marlon perguntou, olhando fixamente para seu próprio copo, e não para o velho ao lado.

O Caçador de PecadosOnde histórias criam vida. Descubra agora