Despedaçado

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Seus dedos tocaram a fechadura gelada cautelosamente, ainda amedrontado com o que encontraria no rosto de Yoo Kihyun. O mais novo esperava por decepção, fúria, uma expressão acusatória, absolutamente entristecida por sua causa e consigo. Essas eram todas as opções que se passavam pela mente transtornada do fisioterapeuta, esperando encontrar seus próprios sentimentos sendo refletidos nos olhos de Kihyun. Ao finalmente tomar coragem, permitiu-se respirar fundo e destravar a porta, empurrando-a suavemente e entrando no quarto cheio com os olhos baixos. Queria buscar por Kihyun, pela confirmação de que ele estava bem e também por seu carinho e por sua proteção, entretanto, seu momento de coragem havia sido ínfimo. Quando os sons do quarto se encerraram de modo súbito e Changkyun sentiu todos os olhares em si, ele precisou encarar os próprios pés. O sapato ainda manchado com seu próprio sangue e o de Hoseok.

Por um instante, Changkyun sentiu que todos os presentes estavam prendendo a respiração, assustados com a possibilidade de lhe passarem o choque que sentiam ao ver seu rosto. Eles não queriam que Im os visse chocados, da mesma forma que Changkyun não gostaria de encontrar aquela expressão em seus rostos. De modo quase instintivo, ele guiou suas mãos em direção ao rosto arruinado, escondendo-o com seus dedos trêmulos e igualmente surrados – resultado de uma pisada particularmente dolorosa em sua mão direita. Caso Hoseok não tivesse aparecido naquele beco, em pouquíssimo tempo, Changkyun não duvidava que estivesse morto naquele momento. Ele nunca havia levado tantos golpes em um período tão curto. Estavam ficando realmente impacientes.

Se seus amigos e Jinseo estavam tentando esconder suas reações, Kihyun não tentou o mesmo. Ele foi o primeiro a emitir qualquer som naquele quartinho, não por meio de palavras ou através de seu choque, mas por conta da dor genuína que o atravessou ao ver Changkyun daquela forma. O mais novo não soube descrever com exatidão o que escutou, algo que estava entre um grunhido doloroso e um soluço estrangulado, o som que indicava que uma tempestade estava prestes a deixar os olhos do homem que estava apaixonado. Finalmente, ele ergueu seus olhos, encontrando o rosto de Kihyun e descobrindo que não havia um único sentimento de rejeição, raiva ou acusação na figura do mais velho. Yoo Kihyun não parecia odiá-lo, muito pelo contrário, ele parecia verdadeiramente preocupado consigo, de uma forma tão que Changkyun sentiu-se verdadeiramente amado.

Sentiu quando seus olhos transbordaram novamente suas emoções, dessa vez ligadas ao agora. Fora do seu ataque de pânico e das lembranças vívidas que rasgaram sua mente, fazendo-o sentir-se preso em outro momento, Changkyun agora podia focar-se no presente. E, naquele instante, ele era tão doloroso. Espelhando sua ação, Kihyun também passou a chorar ao vê-lo daquela forma, erguendo os braços finos, em um claro sinal para que ele se aproximasse e se reconfortasse ali. O fisioterapeuta imediatamente o fez, dando passos largos e firmes em direção à cama que Kihyun estava sentado, esperando-o ansiosamente.

Sentir o abraço do mais velho era tudo o que Changkyun queria naquele momento, era tudo o que ele precisava. Os braços finos confortavelmente o puxaram para mais perto, acolhendo-o no mais delicado e gentil dos contatos. Sentir o cheiro familiar de Kihyun, depois das sensações de pânico que o tomaram naquele beco, era como respirar pela primeira vez depois de um afogamento. Ter suas mãos macias e gentis secando seu rosto – que ardia mais e mais a cada nova lágrima – era como ser banhado pela luz, tirando-o da escuridão sufocante e eterna. Retribuir aquele abraço, sentir o coração de Kihyun, tocar sua face quente e escutar sua voz terna eram sensações que se assemelhavam ao paraíso.

Im, entretanto, precisava se recordar que ainda estava amarrado ao inferno.

Seus olhos e seu coração podiam contemplar uma saída desse, deslumbrados com a possibilidade de uma vida feliz e normal, ao lado do homem que estava apaixonado, mas seu corpo ferido e sua razão o diziam que talvez ele nunca conseguisse deixar seu passado para trás. O fogo que sempre o manteve otimista, confiante de que acharia uma saída da situação em que estava preso havia se extinguido, a única brasa sendo apagada com o som daquele tiro, com o sangue de Wonho sujando suas mãos e sua alma.

Flores de Inverno ♡ changkiOnde as histórias ganham vida. Descobre agora