Capítulo 3

3.8K 406 220
                                    

Quando Naruto saiu e retornou com uma bacia de água, eu nem acreditei. Sério, por que meu vizinho estava sendo tão adorável comigo, se nem éramos tão próximos até, tipo, hoje? Certo, não fazia tanto tempo que me mudei para esse apartamento, eu morava em uma quitinete horrível e poupava tudo o que podia — e o que não podia — para o tratamento do meu pai. Quando recebi um aumento de salário na loja em que trabalhava como gerente, finalmente pensei que estava na hora de procurar um lugar melhor para ficar ou adoeceria mental e fisicamente. Não havia condições de permanecer naquele ambiente.

Todavia, devido ao meu equívoco de outrora, sempre fiz questão de manter uma relação cordial, porém, meio fria com Naruto, visando respeitar um relacionamento inexistente. Não obstante, o fato de eu descobrir, ainda que tardiamente, que Shion e ele eram irmãos, contribuiu em partes, para que caíssem às escamas dos meus olhos. Explicando melhor, era como se antes eu o visse, mas não o enxergasse por completo. Agora, em contrapartida, eu conseguia observar com sutileza todas as características físicas de Naruto. Como, por exemplo, que seu cabelo possuía um tom de dourado, que se assemelhava a queimado do sol. Já os cachos tão bem feitos, lembravam várias molinhas amontoadas em sua cabeça.

Enquanto Naruto colocava a bacia com água morna em minha frente. Aquele mesmo cacho insistente teimava em pular para sua testa, dando a ele um charme quase infantil. Aliás, quando Naruto levantou os olhos para me questionar se a água estava muito quente, eu consegui vislumbrar pequenas pintinhas escuras em seus olhos azuis. Para completar, que suas mãos eram um pouco ásperas em contato com a pele do meu tornozelo.

Naruto ergueu razoavelmente a barra da minha calça social, para que eu não molhasse ao descansar os pés. Esse gesto foi extremamente adorável.

— Desculpa, sério. — mordi o lábio inferior, muito envergonhada por estar tomando esse tipo de liberdade com meu vizinho. — Estou aqui te incomodando tanto, provavelmente você tem mil coisas a fazer, melhor eu ir embora. — fiz novamente menção de dar no pé, mas os olhos pidões e magoados de Naruto me fizeram recuar.

— Ei, eu quero te ajudar, que mal há nisso?

— Nenhum... — me ouvi dizer muito baixo, quase um sussurro.

— Então, não precisa fugir. — revidou e um sorriso despreocupado adornou seus lábios. — Você é sempre tão arisca, era difícil eu conseguir me aproximar.

Não tenho certeza, mas tive a impressão de que ele falou mais para si mesmo do que para mim.

— Você me considera arisca? — arrisquei, achando graça daquela situação.

Naruto olhou-me debaixo e corou. Céus, ele corou na minha frente?

— Bom... — clareou a garganta antes de continuar. — Você estava sempre correndo, atrasada, não tivemos muito tempo para mantermos uma conversa que durasse mais do que dois minutos.

— Na minha cabeça você tinha uma esposa e isso era mais do que motivo para eu ficar na minha. — forcei uma piada e Naruto riu.

— Está me dizendo que a culpa era da Shion, por você sempre fugir de mim? — devolveu divertido e foi minha vez de sorrir. — Eu também ficava muito constrangido por ela sempre bater na sua porta, em busca de alguma coisa que aparentemente faltava aqui.

— Bom, em partes sim, mas eu não tinha muito tempo para interagir com ninguém, de qualquer forma. — expliquei com um certo pesar, por estar desempregada e desocupada agora. — Ah, sobre o outro tópico, nem sempre eu tinha o que Shion procurava mesmo. — dei de ombros.

Enquanto conversávamos, meus pés estavam imersos em água morna e eu mexia os dedos delicadamente, tentando trazê-los de volta à vida. Além de sentir uma sensação de conforto tão gostosa nos pés, que fiquei em dúvida se tal efeito foi causado apenas pelo contato com a água morna.

— Tem algo mais nessa água? — questionei, atraindo o olhar de Naruto para mim.

Ele já estava sentado ao meu lado no sofá, mas com uma certa distância entre nós.

— Tem sim, é um gel relaxante. Eu sempre fazia essa mistura pra Shion, quando ela voltava do trabalho, devido ao uso constante de salto. — ponderou e tentei buscar em sua voz, algum sinal de tristeza, ou mágoa pela irmã ter se mudado.

Contudo, não encontrei nada. Naruto estava simplesmente respondendo minha pergunta.

— Nossa, se eu tivesse um namorado que fizesse isso por mim, grudaria nele feito o Yoda nas costas do Luke. — deixei escapar e mordi a língua por ser tão tagarela.

Só aí ouvi a gargalhada alta que Naruto deu.

— Uma referência nerd. — constatou, parando de rir aos poucos. — Sabia que você era especial.

Nossos olhares se encontraram.

— De-desculpe, eu não quis insinuar nada... sabe... com o que eu disse sobre ter um namorado assim e... — tentei me justificar, mas dei uma leve gaguejada no processo.

Conclusão, me enrolei toda. Eu fazia essas coisas quando estava nervosa ou envergonhada. E eu estava ambos, registrem nos autos. Continuei a balançar freneticamente meus pés naquela água relaxante e como que por milagre a dor em meus dedos praticamente evaporou. Nesse período, com minha visão periférica, eu conseguia espiar Naruto observando por longos segundos. Até que ele levantou num átimo e abandonou o cômodo. Ao vê-lo se afastar eu me senti uma idiota, o cara é todo bacana comigo e eu meto o louco desse jeito. O que ele pensaria de mim? Melhor eu me mandar daqui rapidinho, antes de pagar um mico pior e maior.

Contudo, quando mentalizei a ideia e pensei em colocar em prática, ele ressurgiu na sala. Segurando uma toalha e um pote do que parecia ser um creme em mãos.

— Te deixo um segundo sozinha e você já quer fugir. — sua voz soou divertida e por um momento me perguntei se ele podia ouvir meus pensamentos.

— Não ia fugir. — menti e abri um sorriso sem graça.

— Sei — devolveu e se abaixou na minha frente. — Posso fazer uma coisa que eu sei que vai aliviar o incomodo nos seus pés? — perguntou todo educado e eu só consegui fazer que sim com a cabeça.

Absorta demais naquele homem que estava sendo tão fofo comigo.

Com calma, Naruto retirou um dos meus pés da água e pousou em sua perna direita, por cima da toalha felpuda. Depois de enxugar com delicadeza, pegou o creme que ao seu lado, colocou uma quantidade razoável na palma; e, após espalhar um pouco entre as duas mãos, depositou no dorso do meu pé.

Senti um arrepio bom no corpo, devido a temperatura gelada do creme. Soltei até um suspiro, quando as mãos de Naruto passaram a trabalhar em meu tornozelo e seguir para meus dedos sofridos.

— Isso é bom — balbuciei de olhos fechados. — É muito bom!

Consegui ouvir o som da risada rouca de Naruto, mas sequer visualizei. Estava viajando para algum lugar no qual eu o tinha massageando meus pés em todos os dias da minha vida.

E imaginar algo assim me deixou extremamente feliz.

Naruto terminou o trabalho e passou a repetir o mesmo processo em meu pé esquerdo. Enquanto eu só me deliciava com a sensação de ter seus dedos desfazendo todos os nós dos meus pés e jogando a dor de antes no limbo do esquecimento, até que a porta abriu.

Quando o amor aconteceWhere stories live. Discover now