Capítulo 36 - Vermelho vivo

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Foi como tomar um forte soco no estomâgo.
Minha respiração ficou descompassada, perdi o controle do meu corpo,dos meus sentimentos e percebi que desde que cheguei naquele lugar, perdi também o da minha vida.

Rick havia me entregado o machado, o apertei firme entre meus dedos e quando me direcionei aos malditos que estavam à alguns metros de distância de mim e dos outros, minha mente me sabotou.

O momento exigia de mim coragem,força. Mas as lembranças me vieram a tona, me deixando novamente paralizada, frágil e vulnerável.

Queria que naquele momento, as pessoas que eu tanto amei e me motivaram a continuar estivessem vivas, inteiras comigo.

Mas aqueles desgraçados acabaram com isso, em suas mãos sujas e cobertas pelo sangue seco estava o motivo de meu ódio e de minha dor.

O crânio amassado de Charlie, resultado das batidas contra o concreto. Algumas gotas do líquido escarlate ainda pingavam no chão, seus olhos em um tom azul acinzentado estavam abertos, e era como se estivessem me encarando. Clamando por socorro, por misericórdia, pela sua vida novamente.

Mey, ela também estava ali.
Ou melhor, parte dela. Sua cabeça, seus cabelos grisalhos desgrenhados e endurecidos pelo sangue que o manchara, que escorria do que ainda sobrou.

Eu quis gritar, quis correr, quis me ajoelhar ali e me entregar ao sofrimento que aquilo me causou, quis que as lágrimas tirassem de mim tudo de ruim que eu estava sentindo, toda a culpa, toda a dor e toda aquela situação que a cada instante se tornava mais dura e árdua.

- Sarah? Você precisa se preparar. Porra, eles estão vindo. - Rick me balançou, tentando me fazer reagir e me fazer tomar alguma atitude.

Não, eu não consegui.

- Ok, entrem no carro logo crianças. Se seus pai souberem que eu vou levá-los para assistir O massacre da serra elétrica quem será massacrada sou eu. - murmurou Mey, como se nos contasse um segredo. Um sorriso estava em seu rosto, ela tinha um jeito leve. Capaz de contagiar qualquer pessoa.

Eu e Charlie apenas a seguimos, adorávamos estar com ela, conversar. Ela era divertida, fazia de qualquer passeio o melhor.

- Vocês já assistiram algum filme do gênero? Quero dizer, com mortes explícitas e psicopatas deformados?

- Sarah tem quatorze anos e eu tenho dez tia Mey, não somos mais crianças. Claro que já assistimos. - retrucou Charlie, seguro do que estava falando, com um ar superior.

- Mentiroso, você morre de medo. Sempre diz que se assistir terá pesadelos, não banque o garoto valente. - revirei os olhos e sorri ao ver o descontentamento em seu rosto pálido.

- Não seja má Sarah. - Mey deu uma risadinha discreta. - É normal sentir medo. Mas claro, como o Charlie disse ele não é mais uma criança. É um homem de dez anos, precisamos respeitá-lo! - a ironia em sua voz desfez até a cara emburrada de meu irmão.

- Eu não tenho medo tá? Só receio.

- E não é a mesma coisa? - indaguei fitando suas bochechas, elas estavam coradas.

- Medo é algo muito pessoal pequena Sarah, todos nós temos algum e isso é tão comum quanto respirar. - ela olhou para nós,  sua voz estava calma. - Mas ele nos priva de muitas coisas também, precisamos nos libertar e enfrentá-lo, por isso quero que assistam o filme, principalmente você Charlie. Pode parecer até mesmo bobo o que eu estou falando, mas de pequenas coisas podemos tirar grandes lições.
Quero dizer, há muito para aprender. - Mey coçou a cabeça por um instante, tentando formular outra frase. - Existem muitas coisas ruins no mundo, elas estão por todo o canto. A maldade existe e sinceramente, pode ser que um dia vocês a encontrem. Eu rezo todos os dias para que isso não aconteça, que vocês estejam sempre seguros e protegidos, porém é preciso que vocês saibam disso. Se algo que os assuste e machuque cruze seus caminhos, enfrente isso. Qualquer um é capaz de vencer, de se fortalecer e enfrentar o que teme, basta acreditar que existe um significado por trás de tudo.

Entre se quiser , saia se conseguirOpowieści tętniące życiem. Odkryj je teraz