Capítulo 10

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— Não me lembro de ter visto um homem mudar para melhor em tão pouco tempo — o conde murmurou as palavras que foram um eco dos pensamentos de Anastasia.

Os dois estavam sentados à uma mesinha em um dos cantos da biblioteca, endereçando convites para o baile. No outro lado, lorde Grey e o vigário entretinham-se em uma partida de xadrez.

— Mudar talvez não seja a palavra certa — o conde corrigiu a si mesmo em voz baixa, para não ser ouvido pelo neto. — Voltar ao que era antes seria o mais correto. A sua influência sobre ele, minha querida, tem sido muito mais benéfica do que eu poderia imaginar que seria.

Anastasia continuou com a cabeça abaixada sobre o que estava escrevendo, para que o conde não pudesse adivinhar-lhe a dúvida no olhar. Ela sabia muito bem que não fora por sua influência e nem em seu benefício que lorde Grey fizera um esforço para mostrar-se mais sociável.

Mas que ele se esforçara, não restava a menor dúvida.

Anastasia vira os olhares e escutara os sussurros naquela primeira manhã em St. Owen. Embora Christian Grey houvesse escondido os sentimentos com a habilidade costumeira, ela pudera entender a profundidade da aversão de milorde por estar servindo de espetáculo. Muitas vezes

ela mesma passara por situações semelhantes em idade mais jovem. Quando cometia algum erro, não faltavam olhares e cochichos desaprovativos.

Depois daquela manhã, ela nem mesmo teria culpado lorde Grey se ele retornasse ao interior da concha protetora, pronto para ferroar quem ousasse penetrá-la.

Anastasia passou a admirá-lo por ele ter enfrentado a realidade.

Aos poucos, lorde Grey começara a envolver-se no pequeno mundo de Grafton Renforth. Comparecia à igreja regularmente e até estivera presente na pequena festa de despedida de Miles.

O conde fitou os dois homens curvados.

— Ele parece ter-se afeiçoado ao vigário, o que muito me surpreende.

Anastasia considerou que o contraste entre ambos, o vigário loiro e milorde moreno, era como o rei branco e o negro do jogo.

— Eles têm a mesma idade — ela comentou — e muitos interesses em comum. Não vejo por que não poderiam ser amigos.

Contudo aquela não era uma verdade. Apesar de o sr. Michaeljohn haver-se tornado um visitante habitual em Helmhurst, Anastasia não estava convencida de que lorde Grey realmente gostasse da companhia do vigário. Era bem possível que milorde estivesse preocupado com um futuro próximo, quando o avô fosse precisar do conforto de um religioso.

— Não se sente bem, minha querida? Ficou tão pálida de repente.

— Apenas um pouco cansada da nossa viagem a Londres — Anastasia sorriu para tranqüilizá-lo.

Nas últimas semanas, ela se convencera de que a saúde

Do conde melhorara. Essa esperança tornava-lhe possível visitar Helmhurst sem trair nenhum sinal de pesar ou preocupação. Animada, partilhava dos projetos ansiosos do conde para o baile, o que o deixava muito satisfeito.

Contudo Anastasia estava consciente de que suas fantasias róseas eram frágeis e não poderiam sustentar-se.

Volta e meia, a verdade, na forma de uma tosse cavernosa ou de uma expressão de dor, rompia suas ilusões. Era um lembrete de que o futuro sobre o qual o conde e ela falavam com freqüência talvez não o incluísse.

E quando se esgotasse o prazo, abrir-se-iam fendas em seu coração, como acontecia naquele momento.

— Cansada, minha querida? — O conde mirou o relógio de pedestal. — Não é para menos. Veja que horas são. O resto dos convites pode esperar até amanhã. Christian, meu filho — ele chamou o neto —, é preciso levar Anastasia para casa. Creio que a deixei exausta com os preparativos para o baile. Tornei-me tão amolante como uma criança com um brinquedo novo.

Lord Christian GreyWhere stories live. Discover now