- Capítulo 27 -

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Greenville - 15/04/2019

Despertei de um sono turbulento, abrindo meus olhos de súbito. Tive saudade de ter a familiar irritação no olho por conta da claridade, mas ali estava mais escuro que meus pensamentos.
Tentei levantar, mas soltei um gemido de dor com a tentativa inútil.

Eu não estava morta, até porque ainda sinto dor. Mas também não estava no meio do chão gelado, pois sinto algo quente e macio embaixo de mim. Viro-me devagar, tentando tirar minha cara da parede.
Ao virar, encontro o que eu já esperava: nada.

Olhei ao redor, tentando encontrar algo familiar. O lugar era pequeno, com paredes de madeira e uma enorme janela ao canto, tudo que clareava o local era a fraca luz da lua. Olhei para o que estava debaixo de mim, e deparei-me com uma pele de animal. Era macia e quente, tudo o que eu precisava no momento, então não iria surtar por estar deitada em um animal. Ou pelo menos no que sobrou do pobre animal.

A estreita porta abre fazendo um rangido, e isso me fez virar para o lado novamente e fechar os olhos. Passos leves caminham pela madeira escura, e após um barulho, o lugar se ilumina. Provavelmente acenderam uma lâmpada, não tem como ter energia no meio do nada...espere, eu nem sei estou realmente no meio do nada.

__ Não tenha medo, pode levantar. - estremeço - Sei que está acordada.

A voz é extremamente doce, e eu diria ser de uma mulher. Ousei levantar, ainda sem encarar o que estava mais na frente. Levantei a cabeça lentamente e encarei o ser. Não era uma mulher, era...o lobinho. O lobinho estava vivo! Espere, se era o lobinho que estava ali, então quem falou? Ah, que seja!
Corri até o pequeno lobo e tomei-o em meus braços, sem temer qualquer coisa. Eu me sentia segura ali, o lobinho não poderia ser um perigo.

__ Tudo bem, sei que está feliz por me ver, agora solte-me. - arregalei os olhos e soltei o lobo - Droga, assim não!

Dei dois passos para trás, esbarrando em alguma coisa. Levo minha mão até a boca, demonstrando todo o meu espanto. O lobo falou, O LOBO FALOU!

__ Demorou para cuidar desse ombro, não arrebente o ferimento!

Olhei para meu ombro, que tinha uma faixa enrolada no mesmo. Ainda doía, mas não tanto quanto antes.

__ Como você consegue falar?

__ Ué, você não fala? Achei que falar fosse algo normal, não sabia que demonstrava tanto espanto ao encontrar outro alguém que fale no mundo. - o lobo sentou-se perto da janela. - Fique quieta aí, não se pode fazer tanto esparro durante a noite.

A loba tinha razão, eu não deveria estar tão surpresa...espere aí, eu estou no direito de estar surpresa. Certamente eu morri, só assim para ouvir animais falando.

Levei as mãos até meu bolso e encontrei meu celular, pegando-o rapidamente para olhar a hora. Como eu presumia, não tinha sinal de telefone, então se a loba resolvesse ficar ruim do nada, não teria como pedir ajuda...se bem que eu nem sei onde estou, então não adiantaria de nada um celular com área.

__ O que pensou que estava fazendo? Andar por aí e tentar entrar nos limites do inimigo poderia te causar a morte.

__ Hm... - me aproximei cautelosamente - qual seu nome?

__ Klestmen. - ela me olhou, fazendo-me ter a perfeita visão dos seus olhos violeta.

__ Eu lembro de você. - sussurrei - retirei a flecha de sua pata.

__ E agradeço por isso. Mas minha dívida com você já está paga, então dá próxima vez que colocar sua vida em perigo, eu não irei ajudá-la.

__ Eu estava procurando alguém.

__ Bellamy da segunda alcatéia, eu presumo. - assenti confusa - Ele não estará aqui nos próximos dois dias, mas irá encontrá-la assim que voltar.

__ Voltar? De onde?

__ Não importa.

Klestmen levantou e caminhou até a pele em que eu estava deitada, deitou-se e fez sinal para que eu fosse deitar também. Eu já estava me sentindo mais a vontade na presença dela, apesar de ser peculiar, Klestmen era agradável.

__ O que eram aquelas criaturas que me atacaram? Você é tipo um filhote deles?

__ Eram lobisomens, e só lhe atacaram pois estavam defendendo o território de uma inimiga.

__ Inimiga? Eu não sou uma inimiga!

__ Eu conheço sua história, garota, mas você não. E por isso não lembra, mas acredite, você é um inimigo.

Eu tinha tantas perguntas para fazer, mas Klestmen simplesmente virou as costas para mim e começou a roncar.
Eu estava cheia de dúvidas, e odeio perguntar coisas complexas - pelo menos para mim - para "pessoas" - nesse caso, lobas - e ser respondida com respostas curtas e sem sentido.

Aquela loba poderia até ser comparada com Bellamy, os dois respondiam uma pergunta e deixavam três dúvidas em minha mente.
Mas, por hora, eu não podia fazer absolutamente nada além de dormir. Procurei uma posição aceitável para dormir, e quando encontrei, fechei os olhos e tentei dormir.

Espera aí, ela disse lobisomem? Tipo...humanos misturados com lobos? Isso faz sentido em relação aos fatos, mas não faz o mínimo sentido quando o assunto é realidade. Na verdade, eu nem vou me encabular com isso, eu não duvido mais de nada. É estranho? Absurdamente estranho! Mas é verdade, e eu vi isso, e...estou com uma lobisomem do meu lado agora, e isso explica muita coisa. Ela está em um corpo de lobo, mas fala como um humano...bizarro!

Acordei com lambidas quentes em meu rosto, sentindo algo molhado nos rastros da língua. Baba! Eca!
Abri os olhos e levantei rapidamente, observando o par de olhos que me encarava.

__ Está na hora de ir embora.

Olhei pela janela, vendo que ainda estava escuro lá fora. Peguei meu celular e vi que o relógio marcava 04:50. Apenas assenti e segui a loba para fora de sua cabana.
Ainda é cedo, então se Deus quiser eu estarei em casa antes do amanhecer.

Klestmen andava calmamente, como se conhecesse tudo ao redor, como se soubesse onde estavam todos os galhos que ela não deveria pisar. Acontece que ela esqueceu que, além de não estar enxergando nada, eu também não sabia nem onde pisava. Então acabei pisando em um galho que fez um barulho alto, fazendo com que a loba grunhisse em descontentamento para mim.

__ Droga, eu é que não vou arriscar ser picada por uma cobra. - liguei a lanterna do celular, suspirando aliviada ao conseguir enxergar bem.

Aquela pequena loba foi minha salvação hoje, se não fosse por ela eu estaria LITERALMENTE na boca do lobo.
Eu não sei quantos minutos de caminhada foram, mas enxergar o calçamento degradado da rua me deixou extremamente aliviada. Meus planos era agradecer e abraçar a loba, mas ela sumiu antes mesmo que eu percebesse.

Desliguei a lanterna do celular e corri pelas ruas da cidade, acompanhando o nascer do sol. Alguma pessoas já caminhavam pelas ruas e, obviamente, estranhavam uma louca descabelada e suja correndo por aí. Até aí tudo bem, só piorou tudo quando um cachorro começou a correr atrás de mim, mas ainda bem que eu já estava bem próxima de casa, e que vovó sempre acorda bem cedo.

Foi um alívio ver a senhorinha com cabelos tingidos de vermelho varrendo a frente da casa. Abracei ela, inalando seu perfume forte.

__ Por Deus menina, onde você estava? - ela me analisou - Tome um banho imediatamente, e depois vá comer! Estávamos preocupadas, por Deus!

__ Eu estou bem, vovó, e é disso mesmo que eu preciso. Um banho e um bom café da manhã. - ela negou com a cabeça e continuou a varrer a calçada.

Eles provavelmente pensavam que eu tinha passado a noite em uma balada, e isso me alivia bastante.

Enfim, a hipocrisia

A Sucessora Perdida • Livro 1Место, где живут истории. Откройте их для себя