19; 𝐠𝐫𝐨𝐮𝐧𝐝

1.6K 194 0
                                    

   Minutos depois estávamos dentro de uma sala de aulas vazia enquanto observava o garoto andar de um lado para o outro a medida que afagava seus fios loiros com certa brutalidade.

   — Thomas...

   — Como sabe sobre mim? - Indaga parando abruptamente a minha frente. — Quem é você, afinal?

   — Eu sou Mallory Rose, e caso não saiba, sou como você. - Ele me encara confuso e pouco perturbado.

   — Você... Como sabe!?

   — Thomas, quando começou a... Se sentir estranho? - Não sabia exatamente quais palavras usar, mas ele entende e coça a nuca nervoso.

   — Bom, eu só lembro de acordar em uma espécie de clínica. Não havia ninguém além de mim mesmo, eu estava assustado e confuso, afinal, não lembrava de nada. Eu fugi, corri e percebi que corria mais rápido do que jamais pensei. - Ele fez uma pausa dramática e olhou pela janela, começava uma leve chuva, os pingos fracos e em pouca quantidade enquanto o céu permanecia nublado. — Minhas habilidades começaram a se manifestar enquanto ainda corria pela floresta. Eu sentia fome como nunca antes, e me senti ainda mais assustado quando perdi todo controle sobre meu corpo ao escutar o sangue fluir das veias de um urso.

   Minha cabeça girava, era como se eu tivesse voltado ao dia e lugar onde matei pela primeira vez. Me sentia assustada e impotente ao não ter o controle desejado sobre meu próprio corpo, e ainda mais quando não consegui me controlar ao ver o cervo inocente caminhar vagamente por entre aquela floresta. Me senti segura quando encontrei a família Cullen, e penso o quão desamparado ele deve estar se sentindo agora.

   — Faz alguns meses que treino sozinho na clareira próxima a minha casa, não foi fácil de controlar no começo, mas agora consegui me adaptar melhor a "sociedade". - Ele falava mais calmamente agora, como se a tensão de antes tivesse se dissipado no ar.
 
   — Eu te entendo, e como entendo. - Digo me apoiando em uma das carteiras ali. — Pode me mostrar seu dom?

   Ele pareceu apreensivo, passava sua mão por entre os cabelos em sua nuca e me olhava desencorajado, mas logo cede e afirma com a cabeça.
Indica com a cabeça a saída da sala. Não fazia a menor ideia de onde estávamos indo, mas vejo quando paramos em um local diferente de toda escola. Era como um jardim, um grande e bonito jardim.

   — É aqui que praticamos jardinagem, e onde eu pratico...

   Ele faz um movimento leve com a mão e logo uma flor de pétalas avermelhadas surge por entre o marrom da terra. Por mais que fosse uma habilidade que eu também possuísse, não me impediu de parecer surpresa diante dele.
Ele riu ao me observar com as sobrancelhas erguidas e um leve "o" entre meus lábios, e com outro movimento a grama verde rala começa a expandir-se.

   — Consegue saber a dimensão dessa habilidade? - Pergunto. No fundo também era uma dúvida sobre mim, que não sabia quase nada sobre minhas habilidades.

   — Bom, até onde eu sei posso controlar o elemento terra, incluindo areia, pedras, minerais, rochas, ou poeira. É possível levitar rochas, causar tremores de terra, saber onde as falhas tectônicas estão e derivados. - Ele me olhava orgulhoso, mas ao mesmo tempo seu olhar continha um certo pesar.

   E então ele fecha os olhos, a pequena ruga em sua testa indicava o quão concentrado ele estava, além da energia que conseguia sentir vinda de seu corpo. Sinto um tremor ao redor de chão onde eu me mentinha em pé e  me assusto quando uma pedra diferente perfura a grama esverdeada e voa em minha direção, e como reflexo a seguro com precisão.
Eu o olhava admirada assim como ele me olhava orgulhoso pelo que acabara de fazer. Apesar de toda a terra que a rodeava, era uma pedra de cor violeta e se intensificava ainda mais com a luz branca do céu nublado.

   — É uma ametista, da família das pedras de Quartzo. - Ele diz enquanto se aproximava. — Ela limpa a energia negativa.

   — É muito bonita. - Encaro ele e por um momento esqueço do que realmente fui fazer ali.

   Ele abaixava o olhar vez ou outra, e escutava também as batidas do seu coração acelerarem. Em seus pensamentos rondavam algumas dúvidas, o medo de que eu o atacasse era um deles. Ele provavelmente havia sentido a energia que emanava do meu corpo, assim como também sinto a dele.

   — Então você... Você é como eu? - Ele pergunta aparentando nervosismo em mencionar o assunto, com Jasper aqui poderia bem enviar uma onda qualquer de calma.

   — Sou, e também precisa saber que você não está sozinho. - Me aproximo dele, seu nervosismo era quase palpável, mas mesmo assim não afasta minha mão que se aproximava juntamente ao seu ombro. — Minha família em Denali, no Alaska, me ajudaram a controlar minhas habilidades, aprendi mais sobre elas e posso dizer que as domino melhor por agora.

   — Habilidades? Mais de uma? - Seus olhos estavam arregalados agora.

   — Alguns dons se manifestaram no decorrer dos últimos meses, habilidades como a sua e a capacidade de controlar alguns elementos da natureza, o ar, o fogo... Além de conseguir ouvir os pensamentos.

   — Espera, tipo ler mentes? - Ele pergunta franzindo a testa, enquanto eu apenas assinto. — Estava lendo meus pensamentos até agora?!

   — Não sou insolente a esse ponto, posso me conter na maioria das vezes. - Ele me olha aliviado, me fazendo soltar uma pequena risada com sua atitude.

   Ele parecia um bom garoto, um bom senso se humor ao contrário de mim. A cada dia que se passava me sentia mais como uma senhora rabugenta de 72 anos – mesmo que a idade não estivesse tão errada assim.

   — Eleazar, meu "tutor", me alertou de que o controle sobre alguns elementos ainda poderão aparecer ao longo do tempo. Me pergunto se os outros também possuirão mais de uma habilidade como eu.

   — Os outros? - Sua postura parece mudar de um segundo ao outro, passando de despreocupado para a tensão de antes. — Há outros?

   Uni minhas sobrancelhas no centro da minha testa, era complicado. Assim como eu, poderia haver alguma outra força os caçando como um exército, isso não dava para saber. Precisava manter isso em sigilo, qualquer outra pessoa pode ser suspeita e poderia acabar com todo meu plano de os levar em segurança até um lugar seguro, recrutá-los e treiná-los.

   — Thomas, tudo que precisa saber é que somos um erro, ninguém pode saber da nossa existência assim como também não sabem sobre outros seres sobrenaturais que rondam todo o estado, ou até mesmo o mundo. - Novamente o toco o ombro, ele parece relaxar ao meu toque, mas mantinha a postura tensa de antes. — Precisa vir comigo, eu tenho uma missão que é trazer segurança a vocês, para isso preciso que colabore.

   — E se... E se eu não quiser? Digo, ir com você? - Ele cruza os braços fazendo os músculos saltarem cobertos pela camisa.

   — Isso não deveria ser uma alternativa. - Viro as costas para ele, me afastando consideravelmente dele.

   Sentia meu corpo quente, e na maioria das vezes isso não era um bom sinal. Meus sentidos parecem mais aguçados agora e mesmo não entendendo o motivo continuo a falar: — Não demorará até que encontrem você, e temo que eles não serão tão calorosos como eu.

   Ele engole em seco e volta a fitar o chão. Não saber exatamente o que estava por trás de tudo me corroia por dentro, isso me assustava e temia que não era só eu. Os olhos arregalados e levemente úmidos de Thomas o denunciava, estava tão desesperado por informações quanto eu.

   — Quando iremos? - Pergunta depois de tanto tempo calado.

   Um dos cantos dos meus lábios sobem em um pequeno sorriso de canto. Mesmo que a ideia de que estava sendo tudo tão fácil e que isso teria um preço me assustasse, de certa forma eu me sentia aliviada por isso.

🌙

༄ 𝐩𝐫𝐨𝐣𝐞𝐭𝐨 17 • 𝐭𝐰𝐢𝐥𝐢𝐠𝐡𝐭Onde histórias criam vida. Descubra agora