Capitulo 16

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Caleb me coloca no carro e me leva para casa. Ele não diz mais nada o caminho todo, e quando chegamos, limita-se a me levar até meu quarto e dizer que vai me trazer algo para comer.

Estou imunda e suada, mas não me movo em direção ao banheiro. Encolho-me na cama, da mesma maneira infantil e assustada que fiz nos meus primeiros dias ali, e assisto às horas passarem. Quando a porta reabre, contudo, não é Caleb quem entra — é Christine.

Ela entra em silêncio e coloca uma bandeja sobre a mesa de cabeceira ao lado da cama. Há um copo de suco, um pedaço de pão e um prato de sopa ainda fumegante. Ela dá meia volta, e acho que vai me deixar sozinha, mas apenas fecha a porta do quarto. Então vira-se para mim.

— Acho que precisamos conversar. — declara.

Não digo nada. O silêncio que tanto recusei nos tempos em que estava trancafiada naquele laboratório tem sido meu melhor amigo nesses últimos tempos. Christine não se incomoda. Ela vem até a cama e senta-se na beirada, mantendo uma distância segura entre nós duas.

— Primeiro, eu quero que você saiba que eu não queria que meu irmão trouxesse você para cá. — ela diz, sem rodeios, sua sinceridade bruta e direta atuando como um soco em meu estômago — Quando ele te encontrou, no metrô, e apareceu com você aqui, eu achei que ele estava enlouquecendo.

Não podia culpa-la. Qualquer pessoa normal teria pensado da mesma forma, e agido de acordo.

— Mas aí eu te conheci, e senti pena de você. — ela continua, respirando fundo — Não é um sentimento muito bom de se ter sobre alguém, mas é a verdade. Senti pena de você, Mayumi, e uma certa curiosidade pelo que descobriríamos se começássemos a cavar o seu passado. Então deixei você ficar. Cuidamos de você. E eu me afeiçoei a você.

Franzo a testa, surpresa. Não é o que eu esperava, vindo de Christine. Ela jamais foi algo além de simpática comigo, mas ainda assim. Ela passa a mão pela cabeleira escura e se inclina levemente na minha direção, o rosto mortalmente sério.

— Mas isso não é nada comparado ao que meu irmão sente. — diz, e suas palavras me causam um frio inexplicável na barriga — Não sei se você sabe, ou mesmo se ele percebeu, mas Caleb gosta de você. Não é saudável, não é recomendável, mas está lá. E eu posso suportar tudo, menos que alguém brinque com os sentimentos dele, está me entendendo?

Ela faz uma pausa, esperando e exigindo uma resposta, e tudo que consigo fazer é balançar a cabeça com veemência.

— Se toda vez que alguma coisa acontecer você der um show e fugir, então pode pegar uma muda de roupa e ir embora de uma vez. — Christine prossegue, sem um pingo de piedade — Mas se for ficar, vai agir como uma adulta e ficar. Estamos tentando te ajudar. Caleb quer o seu melhor. E se fizer alguma coisa para ferir os sentimentos dele, eu cuidarei pessoalmente para que você se arrependa disso.

Então, dando nossa conversa unilateral por encerrada, ela se levanta. Está prestes a sair quando recupero minha voz e digo:

— Estou com medo.

Christine se vira, a mão já na maçaneta.

— Medo do quê?

— Do que posso fazer. De quem eu era. De quem eu posso ser.

Ela respira fundo, a expressão profundamente aborrecida.

— Se tem medo dos seus... poderes ou sei lá... — ela faz uma careta ao dizer a palavra — Então domine-os. Pratique. Deixe a gente te ajudar, droga.

— Mas eu... eu não sei por onde começar. — falo, torcendo os lençóis da cama entre as mãos. Christine solta um suspiro.

— Comece não tendo medo. Nem do que você pode fazer nem de quem você era. — ela hesita, e então completa — Só você pode escolher quem vai ser daqui pra frente, Mayumi. Aproveite essa oportunidade e escolha ser alguém melhor.

E então sai, me deixando completamente sozinha outra vez.

No EscuroWhere stories live. Discover now