89. the ugly truth

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— pandora!

Pandora não conseguira dormir naquela noite. Sua ansiedade era o tique-taque incessante de uma bomba prestes a explodir em seu peito, aumentando progressivamente a cada segundo decorrido. Saber que estava tão perto de ver Michael — o verdadeiro, e não a versão vazia e medonha criada para tomar parte em seu pesadelo infernal — fazia seu nervosismo alcançar um patamar jamais imaginado.

As últimas palavras que trocara com ele não haviam sido exatamente carinhosas. Apesar de o rapaz ter sido um verdadeiro idiota obstinado quando ela tentara fazê-lo entender que não era certo continuar com o plano de se tornar o Supremo, muitas das coisas que despejara sobre ele foram exageradas e injustas. Na época, estivera abalada e magoada demais para perceber o erro na forma como reagira à recusa dele de ir embora com ela.

Não era um jogo justo aquele que jogaram contra o Inferno e o Céu, onde, enquanto todos os seus oponentes enxergavam o tabuleiro, eles possuíam vendas sobre os olhos e tampões nos ouvidos. Foram separados, atirados um contra o outro, apenas peças manuseadas por criaturas teoricamente divinas.

Estava na hora de descobrir, de uma vez por todas, o que Michael faria quando as cordas que Lúcifer usava para controlá-lo como uma marionete fossem cortadas. Ela só podia cruzar os dedos, e esperar que ele não a odiasse de novo.

Todo o seu corpo formigava conforme encarava a porta para o apartamento de Lilith. As batidas do seu coração se atropelavam, seu estômago era uma tempestade de ácido. Ela prendeu a respiração.

— Ele ainda não sabe que está de volta — contara Lilith minutos antes, dentro do carro. A híbrida não precisara perguntar, pois logo a mãe emendara: — Imaginei que você iria querer que ele soubesse apenas quando estivesse pronta para vê-lo.

Típico dela simplesmente assumir os desejos alheios. A adolescente não reclamara, entretanto, pois de fato preferia as coisas daquela forma.

Ela tocou a maçaneta, os dedos trêmulos, e girou-a. Hesitou, a mão sobre a porta entreaberta, o coração retumbante, conforme sentia a proximidade da magia de Michael. Aquela marca que ele deixara em sua alma esquentou-se, como se estivesse começando a entrar em combustão.

Era impossível que ele não o tivesse sentido também. Sendo assim, não havia mais razão para atrasar aquele encontro.

Abriu a porta, não tardando em adentrar a cobertura, com Lilith ao seu encalço. O demônio foi rápido em contorná-la, alcançando a enorme sacada fechada e abrindo-a. Pandora não soube ao certo de que maneira reagir àquele ato, e certamente tinha dificuldades em acreditar que a mãe havia deliberadamente feito aquilo para impedir que a filha se sentisse sufocada de novo — como se ela se importasse.

O pensamento durou uma fração de segundo em sua cabeça, substituído pela ansiedade inebriante quando Michael apareceu no topo da escada espiral de vidro, os olhos de um turquesa elétrico brilhando com lágrimas de surpresa.

Pandora temeu que o coração pudesse parar novamente. Apesar de sobrenaturalmente lindo como sempre, Michael estava mais magro do que se lembrava; mais magro que o cadáver que ela tinha de encarar todos os segundos no Inferno. Os olhos possuíam marcas arroxeadas sob eles, mais fundos do que o normal.

Ela levou a mão trêmula ao peito, um nó se formando em sua garganta. Não conseguia começar a mensurar o quanto ele havia sofrido naquele mês que se passara.

A respiração falhou, e ela só conseguiu dizer uma coisa antes de perder o controle que tinha sobre as lágrimas.

— Sentiu minha falta, Devil Jr?

ME AND THE DEVIL ➸ michael langdonOnde histórias criam vida. Descubra agora