16 de Junho de 1986 (Segunda-Feira)

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Acordei e tomei um duche para lavar o suor do dia anterior, mais o suor da noite. Encharquei a ligadura do tornozelo e talvez não o devesse ter feito, mas logo iria à procura do Jacques Blanche e perguntava-lhe. O mais certo seria ele fazer-me uma nova ligadura. Como não tinha outras roupas, tive de vestir as mesmas e voltei a sentir-me suja.

Bem, precisava de um pequeno-almoço reforçado. Não tinha jantado, não comia nada desde aquele almoço apressado perto do estádio e estava esfomeada. Abri a porta do quarto e fui à procura do elevador que me tinha trazido até àquele piso.

Desci para a sala das refeições, seguindo o meu nariz. Cheirava muito bem a café, a bolos, a torradas, a doces, a ovos mexidos e a salsichas. Eram por volta das nove da manhã.

Jean-Marie Pfaff encontrou-me.

Bonjour ma petite Tina! – cantarolou muito feliz. – Dormiste bem?

– Muito bem. Agora quero comer.

– Vamos comer os dois. – Passou-me o braço pelos ombros. Reparou no meu coxear. – E como está o tornozelo?

– Molhado. Tomei banho e...

– Vais ter de ir falar com o Blanche. A ligadura não pode estar húmida. Precisas de calor para te curar mais depressa.

– Eu sei. Sim. Falar com o Blanche. Certo.

A sala estava cheia e eu depreendi que fossem belgas. Mais velhos e mais novos, seriam dirigentes, técnicos, pessoal de apoio, os jogadores. Jean-Marie sentou-me numa mesa vazia. Apertou-me os ombros e segredou-me:

– Não fales com ninguém, não respondas a ninguém. Vais comer descansada e pronto. Comigo e com os meus amigos. Está bem? – Assenti. – Eu trago-te o pequeno-almoço. Assim evitas de andar a cirandar pela sala e a dar nas vistas.

– E o Jacques?

– Primeiro comemos. Depois falas com o Blanche.

Fiquei quieta a olhar para o bonito arranjo de catos que ornamentava o centro da mesa. Dois homens sentaram-se e eu fiquei hirta como uma tábua. Não podia falar com ninguém, nem responder a ninguém e estava disposta a levar esse conselho a sério.

– Ei... de certeza que não estás enganada na mesa? – perguntou o mais novo.

– Como é que vieste aqui parar? A sala está reservada em exclusivo para nós. Olá? Estás a perceber o que te estamos a dizer? – disse o loiro.

– Acho que não te está a compreender...

– Mas como veio ela parar aqui?

Uma bandeja foi posta à minha frente. Tinha uma chávena com café, um prato com torradas e croissants, outro prato com fiambre, queijo, pacotinhos de açúcar, manteiga e compotas, um copo com leite e outro com um sumo alaranjado. A minha boca encheu-se de água. Estava realmente faminta.

– Claesen. Ceulemans. Ela é a minha convidada. Não a incomodem, por favor. Ela vai ficar connosco.

– Connosco... connosco como? – perguntou o homem loiro.

– Connosco. Com a equipa.

O mais novo soltou uma gargalhada. Eu comecei a comer, fingindo que não estava ali. Se não podia interagir com ninguém, era como se não estivesse. Continuei, contudo, a escutar a conversa.

– E qual a razão de termos uma rapariga a acompanhar a equipa? – quis saber o homem mais novo.

– Ontem à noite tive um sonho...

Sonho de VerãoWhere stories live. Discover now