oito

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𝗤𝗨𝗘𝗠 𝗗𝗜𝗥𝗜𝗔 𝗤𝗨𝗘 𝗨𝗠𝗔 𝗦𝗘𝗠𝗔𝗡𝗔 poderia passar voando, mas que alguns pares de horas em um carro poderiam se transformar em eras. Em uma morte lenta, dolorosa, quase sufocante.

Quando foi que começou a ficar tão quente aqui? Por que diabos concordei em embarcar nessa merda? Isso foi uma péssima ideia. Péssima. E eu já estou farta de péssimas ideias.

– No que você está pensando? – pergunta Meri, de repente, me fazendo dar um pequeno sobressalto no lugar e fitar seu pescoço voltado para mim, meus olhos arregalados. Passei tanto tempo calada, com o mundo silenciado ao meu redor, que a atenção repentina me fez ficar perdida por alguns instantes. Como se eu tivesse acabado de acordar ou coisa assim.

Estávamos em seu carro, rumo à Providence. Luke estava dirigindo, Meri no banco do carona, vez ou outra sintonizando as estações da rádio para alguma música do seu gosto, e eu me encontrava sentada confortavelmente atrás de seu assento — eu estava bem desconfortável, na verdade, porém, esse status tampouco estava relacionado ao conforto do veículo. Era a situação como um todo, nada boa.

Apenas assistia a paisagem invernal, que se desenrolava como as cenas de um filme, do lado de fora da janela fechada do SUV branco. Meus pensamentos vagavam para longe enquanto observava as luzes dos faróis dos automóveis que passavam por nós, refletindo no asfalto molhado. Minha mente vazia estava criando uma conexão com tudo aquilo, a qual o questionamento de Meri acabou de romper. Tenho vontade de xingá-la por isso.

– Estava pensando na minha falta de privacidade até para pensar, Grande Irmão. – respondo, ácida, minha voz saindo rouca pelo tempo sem uso. Meri revira os olhos para mim e torna a se sentar direito, tronco virado para frente e tudo o mais. Tenho o vislumbre de quando Luke ergue um dos cantos dos lábios, naquele meio-sorriso que quase não denuncia a covinha na bochecha esquerda.

Ele não desvia a atenção da pista à sua frente, e eu não desvio a minha do retrovisor. Por isso, vejo quando suas íris passam rapidamente por mim, através do reflexo. Ergo uma sobrancelha, inquisidora, desafiando-o a dizer algo. Sua única resposta é alargar o sorriso, ainda sem mostrar os dentes. Ele sabe o que tentei fazer. Luke não me olha de novo, mas continua com o sorrisinho idiota — ainda mais inabalável após eu chutar as costas de seu assento. Apenas pare, imbecil.

– Sua mãe sabe que você está indo? – quis saber Meri. Dessa vez, minha amiga não faz questão de entoar a pergunta olhando diretamente para mim. Entretanto, o silencioso momento que rolava anteriormente é quebrado. Não é como se eu me importasse dessa vez.

– Deus, não.

– Seu pai...?

Dou de ombros — mesmo que ela não possa ver — e retorno a acompanhar a hipnótica paisagem em movimento. Descanso a lateral da cabeça na janela e acho graça de quando o vapor da minha respiração, juntamente com o aquecedor do carro, embaça o vidro de insulfilme. Desenho um asterisco ali, que logo some, restando apenas as pequenas gotinhas de chuva que escorriam do lado de fora, como uma estampa viva.

– Eu não pretendia vir até os últimos três minutos antes de entrar no carro — praticamente arrastada, vale dizer — e acompanhar vocês, então...

O rosto de Meri Carter aparece no meu campo de visão. Minha amiga me encara, meio chocada ou horrorizada, ou os dois. Faço uma expressão conhecida como o que foi?

Você vai chegar de surpresa?!

– Sim? – respondo devagar, enfatizando cada sílaba, naquele tom usado quando o ouvinte está agindo feito um idiota.

Sempre Foi Você #1 [REESCRITA]Where stories live. Discover now