Capítulo 9

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— Você está cerrta disso? — Os olhos de Louise estavam cheios de preocupação. — As nossas passagens estão datadas para amanhã a noite.

Nós duas já havíamos nos despedido de Julia e Dulce. A mãe de Daniel pode até ter acreditado que eu só estava muito cansada e entristecida por ter que partir, mas não tenho tanta certeza quanto a Julia, que me olhava com cuidado, como se pudesse fazer um raio-x de minhas emoções com seus olhos.

— Quero ir hoje. Acabar logo com esse sofrimento... — falei já pegando as minhas malas no canto do quarto e as colocando sobre a cama. — Acho que vou solicitar uma regalia de princesa. O jatinho da família.

— Foi tão rruim assim? — Enrugou o nariz.

Ruim?! — Dei risada querendo desabar. — Ele é um... imbecil, cretino, idiota, sem noç...

— Vossa alteza... tenha calma. — Tocou em meu ombro para me conter em meio à bagunça que eu estava fazendo, atirado peças de roupas grosseiramente nas malas. — Porr acaso a senhorrita sabe o que vai dizerr quando Vossa Majestade, seu pai, perrguntar o motivo da sua volta antecipada?

— Eu... eu não... faço a mínima ideia... — Sentei-me na cama e, depois de ficar por quase dois minutos olhando para o nada, desabei. Chorei como uma criança descontrolada. Extravasei toda a frustração que eu estava sentindo por: 1) ter que voltar para Woodland Castle, onde eu teria que fazer o papel de robô, programada a ser uma dama sem graça; 2) ter brigado com Daniel; 3) ter ouvido injustiças da parte dele; 4) ir para longe dele.

Louise ficou totalmente deslocada, sem saber se dizia alguma palavra de conforto, se me abraçava ou apenas ficava assistindo a cena mais constrangedora e dramática da minha vida.

— Sabe... a senhorrita está nerrvosa agorra, mas prrocurre não tomarr decisões com as emoções à florr da pele assim. — Tocou em me ombro, tentando apaziguar o meu estado emocional. — Vocês são jovens, tendem a agir com o corrração... sem querer ofendê-la. A senhorrita sabe que não o odeia... 

Aquelas palavras conseguiram colocar panos quentes no meu humor. Ela estava certa, afinal. Daniel e eu dissemos coisas muito ruins, como os piores inimigos, e eu estava muito ofendida, mas... eu sabia que não seria tão fácil não vê-lo nunca mais, como pensei quando estava no ápice da raiva. Eu não queria admitir, mas minhas últimas ações haviam sido um tanto quanto imaturas. Senti pena do reino de Âmbar, se essa era a sua futura rainha.

Na manhã seguinte, acordei com a cabeça latejando e os olhos inchados, por ter passado boa parte da noite chorando baixinho para não acordar Louise

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Na manhã seguinte, acordei com a cabeça latejando e os olhos inchados, por ter passado boa parte da noite chorando baixinho para não acordar Louise.
Vi que havia umas cinco ligações perdidas de Daniel, mas não retornei. Ainda estava muito ressentida pela forma como ele havia agido no almoço em sua casa. Mas o meu motivo principal para evitá-lo era o medo de sentir que tudo entre nós havia mudado, por eu ser a porcaria de uma princesa. Eu não podia suportar sequer a ideia de Daniel também começar a me ver de outra forma, porque tinha me apaixonado pelo jeito como ele me tratava e pelo que éramos juntos. Não queria que a realeza fosse mais uma vez a pedra no meu sapato. Queria que ele me visse como a simples garota por quem se apaixonou. Não poderia suportar mais uma pessoa projetando suas expectativas irreais em mim, querendo que eu agisse como uma dama "engessada". 

Com o Daniel, eu desfrutei de poder ser eu mesma, na minha pura essência, e por mais egoísta que minha atitude de omitir minhas origens tivesse sido, a minha única intenção fora me proteger. E até mesmo, protegê-lo. Ele era um garoto "normal". Ou, como as pessoas de Âmbar diriam, ele era um "plebeu". O fato era que eu sabia que os meus pais me proibiriam de namorá-lo. E eu não queria ter que explicar tais razões a ele. Não queria fazê-lo, em hipótese alguma, sentir-se inferior. Logo a pessoa que fez o meu coração experimentar o que eu só havia visto nos livros. Na verdade, eu ousaria dizer que Daniel me fizera sentir muito mais do que Jane Austen, as irmãs Brontë, o Nicholas Sparks, Camões, ou qualquer outra pessoa dotada das palavras mais bonitas pudesse explicar.

Seguindo o conselho de Louise, decidi que ficaria até o dia seguinte, para não desperdiçar as nossas passagens e nem levantar suspeitas no reino de Âmbar, com a minha volta antecipada.

Fiquei o dia inteiro olhando pela janela vermelha daquele chalé, na esperança tosca de que aquele opala preto apareceria. Ou que Daniel ligaria de novo. Ou qualquer outro sinal de vida. Mas pelo jeito, aquele porto-riquenho era tão ou mais orgulhoso que eu.

"Esquece essa fantasia!", tentei convencer a mim mesma, porque, no final das contas, era extremamente estúpido acreditar que poderíamos ficar juntos, quando havia um enorme abismo entre os nossos mundos. Um abismo chamado aristocracia.

E, então, Louise e eu estávamos de novo naquele aeroporto, deixando Porto Rico para trás

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E, então, Louise e eu estávamos de novo naquele aeroporto, deixando Porto Rico para trás. Deixando, na lembrança, a experiência mais verdadeira da minha vida.

Eu ficava olhando de uma extremidade à outra naquele aeroporto enquanto ela fazia o nosso check-in de embarque.

— Esperrando por ele, não é? — Louise percebeu que eu estava olhando para cada rosto e silhueta naquele mar de pessoas.

Eu?! — Dei uma risada forçada. — Claro que não. Ele nunca...  ele não vem. — Deixei meus ombros caírem de desânimo.

— Sei que não é da minha conta, Vossa Alteza, mas... só um conselho de alguém que já percorreu uma longa jornada: dê tempo ao tempo.

Que outra escolha eu tenho? — Suspirei querendo encontrar algum tipo de esperança nas palavras dela. — E... sério mesmo, não precisa dessa cerimônia toda de "vossa alteza", acho que, depois de tudo, somos amigas, não?

Louise sorriu assentindo com a cabeça como se eu tivesse acabado de realizar o feito mais nobre da humanidade, quando, na verdade, tudo o que eu não queria era ser lembrada de que voltaria a ser a princesa idiota de Âmbar, depois de experimentar a maravilha de ser apenas eu mesma.

Estava voltando para casa — para o reino da minha família, que deveria ser um lar, mas não era exatamente um —, levando comigo uma extensa bagagem, e nem estou falando das malas de rodinhas que minha "babá" e eu estávamos arrastando por aquele extenso hall.

Haviam rostos de todo tipo ali, menos o dele. E eu nem tive a chance dizer "adeus".

Não vou mentir, como uma boa leitora de romances clichês, idealizei Daniel chegando correndo, implorando para que eu ficasse. Ou que me propusesse que fugíssemos, que nem a Louise e o homem que ela amou, Arthur. E eu também não vou mentir dizendo que não me sentiria tentada a aceitar esse convite, por mais que isso pudesse significar que a pobre babá estaria, no mínimo, demitida. E, agora, eu me importava muito com ela, pois fora a única pessoa de Âmbar a me dizer coisas diferentes de instruções de como eu deveria me portar.

Só que Daniel não apareceu naquele aeroporto, porque as pessoas simplesmente não são obrigadas a serem ou agirem conforme as nossas expectativas. Pelo menos, não as pessoas normais. Pessoas como eu não tinham muitas escolhas a não ser seguir o protocolo da realeza.

Não Muito PrincesaWhere stories live. Discover now