Conto - O Policial - Parte 1

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Acho manifestação em prol de boas causas um direito de todos, mas eles poderiam levar esse protesto para rua ao lado. Impossível sair de carro com todas essas pessoas e seus cartazes, terei que ir para o trabalho caminhando. São cerca de 2km, melhor escolher um calçado confortável. Vesti saia longa, tênis e uma camiseta cinza sem estampa. Para dar um toque profissional, joguei um blazer soltinho cima. O colar de contas azuis e o brinco de argola completam o visual. Prendi as tranças box em um coque alto. Apanhando minha bolsa e a garrafa com água, parti para encarar a caminhada.

Deixando o prédio onde está meu apartamento, quase fui atingida por uma bandeira.

- Desculpe irmã, irá marchar conosco? – A moça portando a bandeira questionou.

Por aqui é comum, uma mulher negra chamar a outra de irmã. Afinal nós somos, dividimos histórias semelhantes e dores iguais.

- Eu gostaria, mas preciso chegar ao trabalho em alguns minutos. – Continuei a caminhar. – Qual é a motivação deste protesto?

- O de sempre, ricaços tomando o que é nosso. – Ela falou. – Espero que não se atrase, tenha um bom dia!

- Obrigada, vou torcer para que a manifestação tenha sucesso. – Sorri para ela.

Apertando o passo desviei de outros manifestantes, será difícil chegar no horário. O dia está ameno aqui em Los Angeles, mesmo assim removi o casaco. Espero que meu desodorante seja amistoso comigo, não quero chegar no escritório parecendo que me esqueci do banho.

Ouvi o meu celular tocando, vasculhei a bolsa sem olhar. O encontrando vi que a ligação é do escritório.

- Alô, Gina, estou a caminho. – Me antecipei.

Outra bandeira. Essa parte do quarteirão está ainda mais cheia.

- Então corra, Val adiantou a reunião. Ela está surtando com alguma coisa sobre fotos e prazos. – Ela avisou.

- Estou a caminho. – Desliguei.

Droga, de certo que alguém esqueceu o prazo para entregar as fotos da nova edição da revista. Sou jornalista e trabalho como editora de uma revista feminina. Val é a diretora da revista, filha do dono e cheia de melindres.

Não posso continuar por esse trajeto, vou cortar caminho pela rua paralela e tentar pedir por carro. Desviando da multidão, atravessei em direção a outra. LA enfrenta muitos problemas, um deles são os moradores em situação de rua. Este pedaço do bairro entrou para rota deles, que usam as calçadas dos prédios vazios para montar suas barracas. Outro problema é que alguns são viciados, vez por outra cometem furtos e roubos na região. Consegui me afastar da multidão, apenas algumas pessoas passando a caminho da manifestação. Procurei uma esquina, ainda com o celular nas mãos abri o aplicativo para pedir um carro. O motorista mais próximo está a 10 minutos daqui, se ele cumprir o prazo chegarei em tempo no trabalho.

Ouvi alguém se aproximando, olhei para o lado e um homem muito sujo se aproxima de mim. Me afastei um pouco, mantendo a cautela. Ele continuou andando até mim, Deus o cheiro que parte dele é ocre.

- O que faz aí? – Ele questionou.

Não respondi, andando um pouco para longe de dele.

- Ignorante ou surta, provavelmente ignorante. – Resmungou. – O que faz aí? O que faz aí?

Ele não parava de repetir e se aproximar.

- Pare! Não é da sua conta o que faço aqui, agora me deixe em paz. – Explodi.

Ele deu uma gargalhada espalhafatosa.

- Está na esquina, eu sei o que mulheres fazem na esquina. – Ele gesticulou um gesto obsceno com a boca. – Aceita feijão enlatado como pagamento?

Coletânea Fardados - ContosWhere stories live. Discover now