UM

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UM ANO DEPOIS

ZOE



- Você está pronta? - Marina pergunta ao meu lado.

- Sim. - murmuro.

- Então, vamos lá querida.

Acompanho Marina até a sala de espera onde meus pais estão me esperando. Faz um ano que eles decidiram me internar numa clínica psiquiátrica, depois do incidente na cozinha. Onde eu feri minha mãe, deixei seu rosto com cicatrizes da queimadura, não ficaram muitas, mas o suficiente para serem vistas.

Não me opus com a internação, no fundo, eu sabia que era para o meu bem.

Hoje estou tendo alta, não sei o que vai acontecer quando eu sair. Durante esse ano não falei muito com meus pais, eles até vinham com certa frequência, porém, eu não queria vê-los. Doía muito saber que eu causei aquela sequela na minha própria mãe, chorei sem parar por dias.

- Você tem meu número quando tudo estiver ficando difícil me ligue o mais rápido. - Marina fala apertando minha mão direita.

Ela é uma das psicólogas da clínica, ela me ajudou bastante durante esse período. Suas conversas me fizeram refletir sobre minha vida.

- Eu ligo.

- Não tenha medo.

- É difícil não ter. - sussurro.

- Seus pais estão ansiosos para vê-la.

- Não tenho certeza.

- Sei que estão.

Chegamos até a sala de espera, vejo meus pais sentados no pequeno sofá de couro preto no canto esquerdo da parede.

- Olá. - digo baixinho.

- Filha! -papai é o primeiro a vir me abraçar. Seus braços me trazem conforto imediato.

- Como está? - mamãe pergunta. Abraça-me rápido e ligo se afasta.

- Bem.

- Vamos para casa? - ela fala olhando diretamente para o papai. Sei que está difícil me encarar.

Mamãe entrelaça os dedos com os do papai e o puxa para ele andar. Respiro fundo, pois, o sentimento de raiva sente vontade de aparecer.

Não posso demostrar que não gostei, se não ficarei presa aqui mais tempo.

- Obrigada por tudo. - falo para Marina.

- Ligue-me se precisar. Lembre-se das aulas de ioga, podem ajudar.

- Pode deixar, adeus.

- Adeus, querida.

Sigo meus pais até a saída, entramos no carro. O silêncio reina, papai toda hora olha para trás.

Chegamos em casa, pego minha mala e vou direto para o meu quarto. Me jogo na cama, fecho os olhos, inspiro fundo o cheiro de roupa limpa enche meu nariz.

- Sei que você ficou fora por muito tempo, mas não se sinta uma estranha na sua casa. - escuto meu pai dizer.

- Meio difícil.

- Estamos aqui para o que precisar.

- Obrigada.

- Vou deixá-la sozinha, quando o jantar estiver pronto venho chamá-la.

- Okay.

Fico sozinha novamente. A ansiedade toma conta de mim, inspiro e expiro várias vezes até me controlar.

Na hora do jantar, sentamos os três a mesa. Mamãe não ergue a cabeça em nenhum momento.

Fico ainda pior, eu causei toda a situação. Fui a culpada por ela me odiar.

-Vou deitar, com licença. - falo já me levantando.

- Você mal comeu. - papai encara meu prato.

- Estou sem fome.

- Zoe...

- Se eu sentir fome depois eu tomo um leite.

- Certo.

Saio da cozinha, não estou muito longe quando escuto papai falando mais alto.

- Você poderia ao menos tentar olhar para sua filha.

- Não é fácil, ainda mais sabendo o que ela me causou. - mamãe responde.

-Tente.

- Não consigo.

- Ela é sua filha!

- Eu sei, mas não consigo olhar para ela.

- Em algum momento terá de encará-la, já que ela mora aqui.

- Esse não foi o combinado. Você disse que iria convencê-la a procurar uma faculdade em Nova York.

- Não vou mandar a Zoe embora agora.

Sem conseguir ouvir mais saio correndo para o meu quarto.

Eles não me querem aqui, e mais uma vez por minha causa eles estão brigando.



Já são três da manhã, a casa está silenciosa, meus pais já foram dormir.

Termino de arrumar minha mochila, coloquei nela só o essencial. Blusas, jeans e roupas íntimas.

Decidi ir embora no meio da madrugada, não quero ser um fardo para meus pais. Sei que talvez papai possa tentar me procurar no começo, mas depois ele vai desistir.

Deixei uma carta explicando os motivos da minha partida, não vou levar meu celular, eles não conseguiriam me rastrear, mas não quero arriscar. Quando eu decidir para aonde ir, entro em contato.

Espero que meu pai me perdoe, mas tive que pegar dinheiro dele. Sei a senha do cofre que fica escondido no quarto dele, peguei uma quantia suficiente para me virar por um tempo.

Não sei para aonde ir, só preciso sair daqui quanto antes depois resolvo o local que chamarei de lar.


Vejo que o carro que pedi pelo aplicativo já está aqui, saio de casa.

Dou o endereço do hotel que vou ficar hoje para o motorista, vinte minutos depois ele me deixa em frente. Peço um quarto só por essa noite, o lugar não é dos melhores, mas servirá para dormir.

Ligo a televisão, passo pelos canais. Desisto de procurar algo que me prenda, vou para o banheiro tomo um banho rápido, visto meu pijama e vou para a cama.

Meus olhos são atraídos para a televisão, fala sobre o Austin, nunca pensei em conhecer.

Mesmo morando em San Antonio, nunca viajei para lá, pois minha mãe nunca quis ir. Sempre que papai tocava no assunto sobre ir, ela ficava nervosa e recusava.

Desligo a televisão decidida, partirei para o Austin- Texas pela manhã. Sei que lá eles nunca me procurariam.

MINHA OBSESSÃOWhere stories live. Discover now