7 - A pele morena refletida sob a luz

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"Você teve sorte em me encontrar, provavelmente sou uma das únicas pessoas neste mundo que conseguiria te ajudar, nem mesmo o curandeiro do rei possui essa habilidade." Ela continuou a sorrir, ignorando minha indagação, permitindo que eu intensificasse meu aperto em seu pulso. Arqueei as sobrancelhas, esperando-a continuar. "Quando o conjurador do feitiço fortalece a maldição, os efeitos que ela causará em sua vítima serão potencializados, mas eu sou capaz de absorver essa energia fortalecida, diminuindo o poder da maldição sobre você. É simples."

"Com que método você faz isso?" Finalmente, liberei seu pulso.

"É segredo." Ela piscou. "Mas, posso fazer uma pequena demonstração agora, se preferir."

"Então, faça."

Meish se aproximou de mim, suas duas mãos tocando, cada uma, os padrões negros espiralados, ela os tocou de cima a baixo.

E eu senti novamente, a sensação calmante e tranquilizadora, me trazendo uma tênue onda de prazer, e as marcas, antes escuras, começaram a emitir um brilho fraco e dourado, lentamente assumindo um tom amarelo e reluzente, a luz irradiada iluminou ainda mais o rosto de Meish, adicionando um pouco de cor em sua pele pálida.

Senti algo se movendo em meus braços, era uma sensação muito sutil, como se fossem fios fracos de energia caminhando através das marcas, eles as circundaram sem direção por um momento, e então, como se atraídos por alguma coisa, reuniram-se em um único filamento cintilante que se moveu para as mãos da mulher que tocava meus braços, penetrando sua pele e desaparecendo aos poucos.

Alguns segundos depois, Meish retirou suas mãos, e o brilho anterior sumiu, olhei para as marcas, e de fato, a tonalidade negra havia se suavizado, como se alguém tivesse tentado apagá-la.

Um momento de silêncio se passou vagarosamente, continuei a olhar para as marcas, em transe.

Minha mente estava uma confusão, tentei parar o nevoeiro que começava a se formar em minha cabeça e me afundar em perplexão. "Qual o seu preço?" Olhei para ela, repetindo a pergunta anterior.

Ela pareceu saber que eu perguntaria aquilo novamente, e finalmente pude ter uma resposta direta.

"A maldição em você é vantajosa para mim. Vou precisar atravessar as montanhas do norte para lidar com algumas coisas, e quero que venha comigo, em troca, vou te manter viva. Posso dizer pela magia acumulada que a sua vida está por um fio, se quiser continuar viva, vai precisar estar por perto. É uma troca justa, você não acha?"

Me mantive encarando-a enquanto ela dizia aquilo. Eu tinha alguma escolha? O que mais eu poderia fazer para sobreviver?

Não confiava nela, mas não tinha outra opção a não ser concordar com sua proposta. Eu sabia que ela estava me dando o direito de escolher seguir com ela ou morrer, não precisava, mas ainda assim me deu uma.

Certamente ela deveria saber que eu não suportaria permitir minha morte sem lutar contra isso.

"Tudo bem". Eu disse simplesmente, não havia como negar, não me restava mais nada para fazer aqui, eu seguiria para o lugar no qual pudesse viver.

Meish não parecia surpresa com minha concordância, ela assentiu e então se levantou.

"Bem, você dormiu bastante, já é quase hora do almoço. Não tínhamos muito dinheiro, então não consegui uma estalagem boa como gostaria, mas ao menos os quartos aqui são separados, você pode ficar tranquila e descansar pelo restante do dia, em breve a comida chegará e você poderá comer."

Balancei a cabeça em sinal de concordância, ela então afastou-se de mim e tornou a sentar na cadeira, fechando os olhos logo em seguida, parecendo desligar-se do mundo exterior.

Olhei para o teto de madeira enquanto refletia observando as fissuras minúsculas na superfície imperfeita, certamente este lugar era melhor do que a maioria das estalagens nas quais eu já havia estado.

Pessoas pobres como eu não podiam se dar ao luxo de reservar um quarto inteiro, sempre fora assim, era um quarto enorme que continha várias camas, e por algumas moedas poderíamos dormir em uma dessas camas por uma noite.

Mais algumas moedas e era possível até mesmo garanti-la por uma semana, dependia sempre do humor do estalajadeiro.

Não era incomum alguém ser roubado enquanto dormia nesses locais, frequentemente pessoas eram agredidas e tinham seus pertences levados, a segurança era por conta de cada um, foi então que eu aprendi que não seria capaz de sobreviver naquele ambiente violento sendo uma mulher.

Não havia como contornar, mulheres eram alvo fácil para eles, não importava a aparência. E embora ser um rapaz franzino não garantisse segurança, era melhor do que deixá-los saber que eu era uma mulher, afinal, eu já tinha visto-os fazerem mais do que apenas roubar, sem sequer poder interferir com a minha força insignificante.

Então tive que aprender a me defender e estar sempre atenta, não era fácil sobreviver de caça, e não poderia me dar ao luxo de perder as poucas moedas que conseguia com a venda de carne de caça.

Minhas noites nunca eram tranquilas, e com o tempo, meu sono se tornou cada vez mais leve, o menor farfalhar de folhas me despertaria, e a pequena faca de cortar carne estava sempre em mãos ou em algum lugar próximo, pronta para que eu pudesse desferir um golpe certeiro em quem quer que se aproximasse de mim.

E se tornou um hábito, não tão saudável quanto gostaria, mas eu não podia evitar, precisava disso.
Desviei meu olhar para os pequenos móveis no quarto, interrompendo os pensamentos que rondavam minha mente, e me levantei.

Dei uma volta pelo local, dando uma olhada de perto em tudo. Me voltei para o armário e o abri, não havia nada exceto por um espelho de tamanho médio. E não pude evitar me assustar um pouco com o que vi no reflexo do espelho.

Era uma mulher com um rosto oval e bronzeado, olhos castanhos em um tom que se assemelhava a mel, cabelos curtos e também castanhos, levemente ondulados e, de alguma forma, sedosos.

Era bonita, não tanto quanto as mulheres da realeza ou as belas feiticeiras e necromantes, mas havia uma beleza rústica naquelas feições pouco delicadas.

Não combinava com o que eu costumava parecer, não, meus cabelos não eram sedosos e tampouco brilhantes, produtos de beleza eram caros demais para alguém como eu. Olhei para Meish, que permanecia tranquilamente sentada e estática, como uma estátua irreal e bela, não parecia humano.

Finalmente, olhei para as minhas roupas, e novamente, minha mente ficou em branco. Eu não estava usando as usuais roupas surradas e grosseiras, em vez disso, eram roupas muito parecidas com as minhas, mas o tecido era confortável demais para se comparar.

Estive tão concentrada em falar com Meish e tão distraída em minha mente que não percebi que minhas roupas haviam sido trocadas.

Devido ao problema com a maldição em meus braços, me habituei a não olhar para o meu corpo com frequência, não via o meu rosto há muito tempo, e o reflexo há pouco não parecia algo que eu esperava ver.

Tornei a olhar para o espelho, analisando o meu físico, e como eu tinha imaginado, os anos de treino e prática haviam me roubado a feminidade que as mulheres consideradas bonitas nessa região deveriam ter, dando-me um físico bruto e rude, músculos se destacavam em meus braços, e o tempo gasto sob o sol havia tornado minha pele um pouco escura, cobrindo a tonalidade clara que eu tive na infância.

Mas não importava, eu não precisava ser bonita, só precisava estar viva. Voltei para a cama e me deitei, esperando o almoço, não importava o que viria a seguir, eu sabia que meu destino dependeria de Meish, então não tive escolha a não ser confiar em suas palavras.

Olhei para ela, que continuava sentada, os olhos ainda fechados realmente a faziam parecer uma estátua, senti meus braços queimarem um pouco, mas ignorei.

Misty (Girl's Love)Where stories live. Discover now