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Ouço o som dos trilhos e o vagão balança. Tento me acomodar no acento e fico por momentos extensos analisando os três anéis enfiados em meus dedos da mão esquerda, sei cada um de seus significados e imagino que agora que estou casada em algum momento possa refletir melhor sobre isso bem longe de tudo quando tivermos a oportunidade de falarmos.

Lealdade, Honra e Confiança.

Em nenhum deles existe amor, não na prática, e aqui sentado diante de mim está o homem que me deu esses anéis e fez um juramento diante de uma Anciã de sangue sobre tudo isso, sobre cuidar de mim e zelar, sobre ser tudo o que sei que ele nunca será.

Não sei se foi pior ter me casado na ausência dos meus pais ou de saber que a Anciã já sabia que tudo isso iria acontecer e que ela mesma guardava as joias de casamento consigo, como se estivesse pronta para realizar a cerimônia exatamente ontem.

— Chegaremos até o anoitecer.

— Está bem.

Eu não sei o que falar ou se devo falar, fato é que saber que não pude ir até a casa dos meus pais me despedir me entristeceu ainda mais, as últimas horas de viagem depois que saímos dos estados do norte, me fizeram sentir como se estivesse de alguma forma fugindo deles e isso me fez muito mal.

Eu gostaria que papai me levasse até o altar, que mamãe me entregasse em casamento e que toda a minha família estivesse lá para me ver celebrar um dia feliz como qualquer outra noiva, nem tive direito a noivado.

Mesmo sabendo que isso não fará diferença alguma, não é um casamento que será de verdade, não é algo que envolverá nada além do que já era, uma conveniência e agora muito pior, planejada.

Observo os túneis que nos levam as diversas cidades de forma subterrânea, os trens se movem a energia solar graças a painéis instalados nas camadas e camadas de placas instaladas em pontos estratégicos da nossa terra.

Também há passagens para carruagens e cavalos, pessoas, bicicletas, apenas assim para que nós pudéssemos nos movimentar durante o dia em Navie. Apesar de sentir um pouco de calor está sendo até rápido.

— Mamãe irá nos receber e nos hospedar de boa vontade — Virgo fala e mostra a tela do comunicador. — Está entusiasmada.

— Obrigada.

Me sinto retraída, violada, como se algo houvesse se quebrado e não tivesse conserto, nunca mentiram para mim, jamais me colocaram numa posição tão constrangedora, meus pais sempre me ensinaram sobre a lei e apesar de em muitos momentos achar tudo muito absurdo fiz o que tinha que fazer, fui honesta, sincera e nunca menti.

Acredito que pior foi ter me permitido acreditar que Virgo estava de fato interessado em mim, mas ele mentiu sobre isso também, ela ama a tal da Olívia e não consigo pensar que ele está sorrindo assim para mim de forma sincera além do fato de que estamos voltando para sua cidade natal e que ela estará lá.

— Poderá vestir as roupas de minha irmã e ficaremos em meu quarto — comunica com pouco mais contente. — Terá conforto e boas refeições.

— Agradeço pela gentileza.

Ele estende a mão e segura a minha, fico olhando para nossas mãos juntas e não vejo sentido nisso, concordei com o que a Anciã disse porque sabia que minha casa não pegaria fogo do nada, que se eu voltasse para lá talvez isso pudesse colocar meus pais em risco mesmo não sabendo ao que.

— Sei que está triste e depressiva, mas já comuniquei aos seus pais, eles aceitaram nossa viagem e seus dias de folga foram concedidos por seu patrão — ele diz. — Poderá descansar e desfrutar de alguns dias de laser, na casa da minha mãe estará mais segura.

— Segura de quê? Você não me disse! — exijo.

Ele suspira e olha em volta, mas estamos completamente sós.

— Há alguns meses tivemos algumas denúncias de que rebeldes estavam formando uma rebelião para dar um golpe de estado, eles exigem reformulação nas leis de casamento e reprodução, são pessoas que foram banidas ou que cumpriram com sentenças de confinamento — ele diz muito baixo. — Meu avô interceptou um dos líderes e recebeu uma mensagem na qual repudiou, os rebeldes já sabem da chegada do Oráculo e planejam sequestrá-la.

— Mas eu não estou grávida — retruco bem surpresa com a revelação.

— Você está destinada a ser a mãe do Oráculo, mas se não engravidar ele não nascerá e, portanto, não será mãe dele porque ele não existirá, rompendo assim um ciclo que colocará toda Navie em risco — Virgo revela bastante tenso. — Por isso meu avô interveio, ele temeu que se você se casasse com Sven ele não pudesse oferecer a proteção que um matrimônio comigo oferecerá.

— Ah e você me protegeu tão bem, não foi? — questiono nervosa só de lembrar que ele interrompeu um possível envolvimento meu com Sven, não que eu quisesse, mas seria muito melhor do que um "amo Olívia".

— Atearam fogo na sua casa porque viram você saindo, foi apenas uma represaria para mostrar que eles estão por perto e para tentar nos intimidar — responde sério. — Eu quero que você fique segura, lá eles poderiam facilmente te sequestrar e na casa dos seus pais colocariam eles em risco com os seus irmãos e sobrinhos.

Mordo o lábio com medo dessas palavras.

— Seria mais simples se me matassem — revelo.

— O que poderia acontecer ao homem que ousasse matar a mãe de um Oráculo antes dela concebê-lo? Quais dores ele carregaria durante a vida? Esta seria a decisão certa? — Virgo está reflexivo. — Eles nunca irão te encostar um dedo.

— Sei.



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