Conto 6 - Permafrost - parte 3

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-Precisam ser francos um com o outro agora, ou todo este trabalho de anos não terá serventia.

Sasuke se remexeu no sofá, pousando uma mão perto de Naruto, por cima da almofada.

-Eu não... - limpou a garganta e olhou para o ômega. - Não me sinto confortável com essa solução. - Naruto o fitava de canto de olho. - Nós somos marcados. E eu... - diga, pensava o terapeuta, diga de uma vez o que está em seu coração. Desabafe. - Eu... - ele massageou uma das têmporas e depois a testa com os dedos. - Eu... eu amo ele. Se Naruto quiser se separar, eu não me oponho e nem causarei confusão, mas não é a minha vontade.

O terapeuta quase deu um pulo de alegria, mas permaneceu em seu lugar. Sasuke é muito introspectivo e tem imensa dificuldade de abandonar a fachada de alfa forte, sério e raivoso para mostrar o que há de mais sensível e verdadeiro dentro de si, onde a ferida mais dói. Ser ele o primeiro a confessar o óbvio de maneira tão limpa é um passo poderoso para os dois se endireitarem.

Seja para que fiquem juntos ou não.

Naruto corou até as orelhas e ficou esfregando as mãos entre as coxas, nervoso demais.

É tão raro que Sasuke fale dos seus sentimentos mais profundos que sempre causa uma situação em Naruto com a qual não sabe lidar.

-E você, Naruto?

-Eu o quê?

-Agora que sabe que seu marido apoia qualquer decisão que tomar, o que quer fazer?

O ômega esfregou os cabelos com força, respirou fundo e enfim relaxou a postura, deixando um braço descansando sobre a mesma almofada onde está a mão de Sasuke.

Eles não se tocam, mas é como se estivessem de mãos dadas.

O terapeuta quase esboçou um sorriso porque os dois estão, mais uma vez, sincronizados sem saber, provando que a compatibilidade genética não é tudo, mas é um bocado de coisa.

-Não quero ficar sem ele. Fico doente só de imaginar Sasuke com outra pessoa. - Naruto sempre foi mais franco, mas nunca o bastante para falar sem trazer um discurso narcisista. É sempre "eu", nunca "nós" ou "ele" sem que esteja culpando Sasuke por algo. - Nós tentamos, uns dez anos atrás, sair com outras pessoas. Abrir o relacionamento, como sugeriu. Experimentar novas coisas na intimidade. E deu tudo errado porque odiei saber que Sasuke beijava outra boca e eu senti o nojo dele no meu estômago por saber que eu estava com outra pessoa. Foi um desastre sem fim. - arfou e olhou de soslaio para o marido. - Eu aprendi a amá-lo com tudo o que eu tenho. Se ele se for...

-... eu fico sem nada. - Sasuke completou e, pela primeira vez em alguns dias, sorriu sem deboche ou malícia para o loiro. Quando completaram 25 anos de casamento, eles "casaram de novo" e esta pequena frase que um completava sempre que o outro iniciava era um dos votos. Talvez o mais importante. Eles perceberam depois de tantos filhos chegarem e irem que, no fim, só tinham um ao outro, seja na amizade ou no amor. Por isso escolheram estas palavras para pôr na aliança nova.

Sasuke ofereceu sua mão.

Naruto aceitou e entrelaçou os dedos.

O terapeuta pensou em soltar fogos, mas manteve a postura contida.

-É a primeira vez em 20 anos que eu vejo vocês se declararem em pouco tempo de conversa. - um sorriu para o outro com certo carinho e depois fitaram o senhor. - Já que nenhum dos dois é a favor da separação, temos que trabalhar a comunicação.

-Comunicação? - indagou Naruto curioso.

-Ao que me consta, vocês sustentam uma profunda dificuldade em ser francos um com outro sem a minha ajuda para intermediar um diálogo que não culmine em ofensas.

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