Capítulo 196: Convite

145 26 0
                                    

Três meses depois

POV Luna

As noites eram difíceis, Cristal acordava a gritar em desespero várias vezes e demorava para reconhecer as pessoas e o lugar a volta dela. Durantes alguns dias ela apenas se recusava a levantar da cama ou conversar. Amanda, Chiara e eu tentamos ajudá-la, mas em alguns momentos era como se ela estivesse a parte da realidade, tinha crises de pânico com a aproximação de qualquer homem, por isso os meninos pararam de frequentar a vinícola. Os cortes das costas cicatrizaram, a doutora a liberou da dieta e a aconselhou a praticar exercícios ao ar livre para obter mais vitamina D e fortalecer os músculos, já que a falta duma nutrição correta por tantos anos ocasionou numa atrofia.

O olhar dela ainda estava perdido, os sorrisos se tornaram mais raros. Amanda dizia que antes de melhorar, ela ainda iria piorar muito até conseguirmos lidar com os traumas e gatilhos dela. Um simples abraço conseguia paralisá-la, frases, gestos, toques. Estar na presença dela se assemelhava a um campo minado, não sabíamos o que poderia gerar uma reação ruim ou desencadear uma crise.

Conhecemos algumas facções, civis e policiais da cidade. Revezamos entre bicos para termos uma poupança no banco e crimes com o intuito de fazermos uma reserva de dinheiro sujo. Encontramos uma página na deep web duma facção local responsável pela venda de coletes balísticos. Deixei Maju e Renata responsáveis por buscar essas informações, principalmente sobre às três que Clara nos alertou. Elas descobriram a localização do bar dos Bloods onde ocorrem lutas clandestinas, mas só é liberada a entrada de convidados, e que não produzem nenhum produto. Pelo que entendi o lucro deles vem de festas, roubos e das apostas das brigas, são mediadores quando ocorre algum conflito entre facções. Os líderes Kuro e Umi, nomes respeitados e conhecidos. Já os Vagos expulsaram todos os concorrentes de drogas da cidade. Maconha, LSD e, principalmente, cocaína, eles produzem, embalam, vendem, comandam os traficantes e recebem uma porcentagem por cada venda. Kátia, Arthur, Paola e Carlos são alguns membros com quem as meninas já tiveram contato, mas não temos informações sobre a hierarquia deles.

Os meninos perceberam estarem com uma desvantagem grande no quesito número e possuíam um concorrente na cidade, por isso, poucas semanas após chegarmos na cidade, Din e Spok viajaram. Renata contou que eles iriam a uma convenção do The Lost buscar alguns recrutas e quando voltaram estavam com seis pessoas a mais. Shay, já a conhecíamos, mas não éramos próximas, uma garota de cabelos longos, platinados e trançados. Live Page ou como prefere ser chamada Candy, cabelos escuros, curtos, lisos, voz doce e um pouco desajeitada. Eva, poderíamos confundir a aparência dela com a da Shay, mas as personalidades eram opostas, calma, quieta e reclusa. Gustavo, cabelos ruivos, olhos escuros e as mãos fortes e machucadas pelo tempo. Luís, olhos castanhos, cabelos escuros com fios brancos destacados, barba bagunçada e longa, uma cicatriz do lábio ao meio da bochecha esquerda e reclama muito, não conseguíamos entender se ele gostava da própria vida. Por fim, Tobias, mais jovem, simpático, não o daria três anos a mais que a Chiara, enérgico e possuía um dom para encontrar confusão.

Assim que Thomas transferiu a cede das agências de advocacia para a cidade, não perdeu tempo ao se mudar e o primeiro trabalho que recebeu foi reverter a imagem de Lúcio diante ao tribunal para recuperarmos a guarda das gêmeas. Fora alguns dias de estresse com papelada e aulas comportamentais até conseguirem uma segunda audiência. Lúcio foi chamado à frente do juiz para declarar aptidão, consciência e responsabilidade ao cuidar das meninas. Um depoimento das duas sobre a forma que eram tratadas na casa da Embucete nos garantiu a vitória. Exubaquira e Konsheleva chegaram a vinícola a poucas semanas, discutiram sobre dividirem um quarto com as outras meninas e sempre tramavam uma forma de invadir o quarto principal, o qual mantinha trancado. Com as crises da Cristal, que preferia se manter isolada, optei por afastar algumas crianças dela para evitar qualquer incômodo e juntas decidimos deixar a porta trancada. Apenas ela, Amanda e eu possuíamos uma cópia da chave.

Não tivemos tantas notícias da Tríade, mas Octavius nos fez pelo menos uma visita por mês, sempre com a mesma pergunta: "como ela está?". Ainda não sei o que pensar sobre ele, alucinado, estranho, arrogante. Já fizemos algumas encomendas com eles, todas foram entregues na vinícola. Tentamos trocar informações e marcar uma reunião, mas os nossos pedidos eram negados. Priscilão estava desconfiada dessa situação, eles não aparentavam estar tão amigáveis quanto antes.

Estávamos a almoçar, as crianças foram colocadas num colégio interno local até conseguirmos erguer a facção, Lúcio era o único que continuava na casa, mas passava mais tempo com os meninos.

— Temos compromisso essa noite. — Maju avisa ao sentar na mesa.

— Compromisso? Onde? — Gabi questiona curiosa e Maju olha na direção da dona Marli que estava distraída com a louça e já havia comido.

— É, encontrei esse convite entre as cartas no nome da Cristal. — Ela estende um folheto para mim.

— Cristal? — Leio em voz alto.

— Também tem uma assinatura de caneta vermelha, Kuro Sanches

Ops! Esta imagem não segue nossas diretrizes de conteúdo. Para continuar a publicação, tente removê-la ou carregar outra.

— Também tem uma assinatura de caneta vermelha, Kuro Sanches. — Era um folheto bem feito. — Por que querem a Cristal?

— Não sabemos, mas podem estar interessados em nós como estamos neles e ela ainda é a nossa líder, mesmo que não atue como. — Renata pensa como se estivesse no lugar deles.

— Nós vamos nisso aí? — Ivete questiona desinteressada.

— É uma ótima oportunidade de juntar informações. — Priscilão pede o papel nas minhas mãos.

— Também não é como se tivéssemos muito ocupadas para negar uma festa. — Ivete diz animada.

— Mas eles querem a Cristal, isso ficou claro. — Gabi me encara.

— É, mas ela não está em condições de nos acompanhar e... — Tento procurar mais um argumento para que Cristal não vá.

— Eles também não devem saber a aparência dela, qualquer uma de nós pode fingir ser a chefe. — Maju sorri.

— Certeza que é dos Bloods, Pacify é a fachada deles, o coração no centro do papel é o símbolo que picham durante as revoltas, sem contar que já sabemos quem é Kuro, agora também temos o sobrenome e um número. Então é isso, vou mandar uma mensagem para esse número, quem vai ser Cristal Giorno por uma noite? — Priscilão ri enquanto digitava algo no celular.

As meninas se entre olham.

— Ninguém aqui é parecida com ela. — Alicia diz o que se passava na cabeça de todas.

— Mas eles não sabem como ela é, essa é a nossa vantagem, né? — Maju afirma, mas sentimos uma pontinha de dúvida na voz dela.

— Deixa comigo. — Assumo a responsabilidade.

— Se eles sabem que a Cristal é a líder, a chance de também conhecerem você é alta, Luna. — Gabi andava de um lado para o outro, próxima à mesa.

— Renata é a mais nova de nós. — Ivete dá mais uma garfada no que restou da montanha de comida que havia no prato dela.

— Na verdade, é a Júlia. — Maju a corrige.

— Júlia não faz parte desde que nos mudados. — Digo e Ivete dá um sorriso vitorioso para Maju. — Gabi, você vai ser a Cristal essa noite, não precisa tentar a imitar exatamente, mas se esforce o mínimo.

— Consegui a localização, a festa começa às nove, confirmei que iremos em sete pessoas. — Priscilão guarda o celular e deixa o convite sobre a mesa.

Nem a distância nos separaOnde histórias criam vida. Descubra agora