Capítulo 1

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RAQUEL

As batidas fortes na porta se misturaram aos sons do meu sonho, mas pelo barulho seco e insistente, tudo estava prestes a virar pesadelo.

A última hora antes do despertador tocar sempre foi sagrada para mim. Então quem ousava fazer aquilo? Quem me conhecia o suficiente para saber o meu endereço, mas não o bastante para cometer essa façanha?

Abri um olho só e esperei o barulho se repetir, na esperança de que o som não fosse real. Mas quando mais uma batida veio, eu gemi de frustração. Apenas três pessoas conheciam o truque para abrir o meu portão por fora. Duas delas eram os meus pais aposentados, que estavam em algum lugar da costa espanhola a bordo de um motorhome. Então aquela batida só podia significar uma coisa.

Por favor, não.

Afundei a cabeça no travesseiro, mas meus ombros pularam ao ouvir mais uma pancada na porta. Desci as escadas, ainda zonza, me atrapalhando para vestir o meu robe e tirar a touca de cetim da cabeça. Todos os dias eu agradecia aos céus por essa invenção sagrada que deixava meus cachos intactos pela manhã. Entrei no banheiro do andar de baixo, tentando ignorar as batidas insistentes. O mínimo que a visita indesejada podia fazer era esperar enquanto eu escovava os dentes. Quando terminei, me olhei no espelho da pia e soltei um suspiro. Lancei um olhar encorajador para o meu reflexo, invocando a santa paciência.

Você consegue, ela é sua irmã.

— Abre essa porta antes que eu arrombe — a voz estridente me fez fechar os olhos e arquear as sobrancelhas.

Peguei as chaves na bancada da cozinha e respirei fundo. Encarar Lorelay às sete da manhã era tão bom quanto tirar um dente sem anestesia. Aliás, mentira. Tirar o dente era muito melhor.

Abri a porta com a bronca na ponta da língua, mas minha voz sumiu diante do meu espanto ao vê-la. Ela estava tão magra que suas saboneteiras estavam pontudas, como se estivessem prestes a me dar um tiro.

— Por que essa demora toda para atender? — ela bradou, invadindo a sala. — Tá sol aqui fora. Eu fiz peeling há menos de sete dias.

A insolência fez minha breve compaixão pelo seu estado cadavérico ir embora.

— O que você quer, Lorelay? — cruzei os braços e a encarei.

— Quantas vezes eu tenho que te pedir para não me chamar assim?

— Até onde eu sei, esse é o seu nome.

— Mas eu não uso ele inteiro e você sabe disso.

Tranquei a porta e me virei de volta para ela, respirando fundo.

— O que você tá fazendo aqui, Lore Houston? — ironizei seu bendito nome artístico, que renegava nosso sobrenome verdadeiro.

Ela se sentou no sofá, cruzando uma perna sobre a outra de forma elegante, ainda que aflita. Olhando para a minha irmã, me perguntei se ela vinha comendo na mesma frequência que aparava o seu chanel loiro batido na nuca. Lorelay estava parecendo uma caveira de peruca.

— Eu estou com um problemão e só você pode me ajudar.

Soltei o ar pela boca. Encrencas não eram uma novidade quando o assunto era Lorelay, mas há muito tempo nós não éramos mais crianças. Fazia anos que eu não era mais a irmã que resolvia tudo para ela, muitas vezes pagando o pato em seu lugar.

— O que você aprontou dessa vez? – perguntei.

— Eu conheci o amor da minha vida.

Gargalhei e joguei a cabeça para trás. Não era possível uma coisa dessa. Ela tinha batido na minha porta àquela hora para me contar piada?

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