— 14 anos atrás —
PassadoEra inverno, havia neve sobre a grama esmeralda do lado de fora da mansão e grandes flocos que se moviam em redemoinhos com o vento gélido, os coqueiros e as palmeiras os acumulavam sobre suas longas folhas e a neve prendia-se em seus troncos como tinta derramada, junto às trepadeiras idênticas às dos muros ao redor.
O pequeno lago artificial estava congelado sob uma camada fina de gelo azul-cinzento. Jaehyun tinha passado por lá de manhãzinha só para cutucar o gelo com gravetos longos que encontrava enterrado na neve.
Os seguranças que estavam de olho nele, estavam agasalhados com luvas e cachecóis pretos junto ao terno e casaco habitual, o único sinal de cor neles eram os rostos queimados pela exposição ao frio e o pingente de diamante que brilhava em seus peitos em cores distintas. Mas nenhum deles usava vermelho. Vermelho era especial, era o diamante da família Jung. O diamante que Jaehyun deveria estar usando para ir até a sala ao oeste da mansão e ter suas aulas como fazia todos os dias.
Jaehyun tinha oito anos na época, e havia acabado de se arrumar após muita insistência dos adultos. Depois de ter sido repreendido e apanhado de cinto enquanto sua mãe o assistia, tudo por se recusar a ter as aulas do dia, sua raiva era justificável. Tudo o que ele queria era estar sozinho em seu quarto, mas ninguém o deixou fazer isso, pelo contrário. Contra sua vontade, ele tomou banho e se aprontou para a chegada de seu pai após mais uma longa viagem de fim de ano a trabalho.
Os olhos castanhos do garoto estavam na paisagem mais longe, sem prestar atenção aos guarda-costas principais que também aguardavam a chegada do chefe do lado de fora da zona central. As montanhas íngremes ficavam longe demais para Jaehyun conseguir ver o tecido branco que cobria o pico delas. A mãe dele estava ao lado, vestida como uma primeira-dama e inexpressiva como sempre. O branco de suas roupas era quase mais branco do que a neve, e Jaehyun podia sentir o frio verdadeiro quando ela respondia aos empregados em ordens tranquilas, habituada.
A movimentação dos guardas nos degraus avisou a Jaehyun que ele havia chegado, o segundo aviso foi a sensação da mão enluvada de sua mãe em seus ombros. Ele observou em silêncio junto a ela a chegada de um Aston Martin preto que deixava marcas na neve. Um dos guardas abriu a porta com um guarda-chuva para poupar seu chefe dos flocos que insistiam em cair nas roupas de todos eles ali.
Ao primeiro passo para fora, parecia que ninguém — nem mesmo os vinte e poucos guarda-costas — estava respirando. Jaehyun viu o reluzir dos sapatos caros na neve, a roupa que usava quando estava no escritório — ocupado demais para dar atenção ao único filho —, e então o diamante vermelho pregado ao casaco. E um sorriso.
A mão de sua mãe apertou seu ombro um pouco mais forte quando o marido sorriu, e então ele virou para trás, estendendo a mão para a pessoa que o acompanhava.
Jaehyun apertou o maxilar e conteve um gemido de insatisfação pelo aperto dela em seus ombros, mas ela não parou.
Do carro, um garoto um pouco menor do que ele desceu com a ajuda de seu pai, vestido em um casaco verde escuro e usando luvas brancas, seu cabelo loiro e longo caia nos olhos fazendo o menino ter que empurrá-los para trás da orelha com as luvas. Jaehyun continuou olhando para a criança enquanto sua mãe olhava para seu pai, insatisfeita, mesmo que ele sorrisse para ela.
Os dois se aproximaram junto ao guarda que carregava o guarda-chuva para eles e pararam apenas a três passos de distância.
Jaehyun olhava para a mão enluvada de seu pai envolta dos dedos pequenos do menino. Seu pai não tinha tempo para ele, mas estava ali com aquela criança ridiculamente magricela e pequena, com um sorriso no rosto. Segurando sua mão. Jaehyun olhou para a paisagem de novo, forçando desinteresse neles dois.
— Jaehyun — chamou seu pai, um pouco inclinado na direção dele, pronunciando as palavras como se falasse com uma criancinha. — Esse é o seu dongsaeng. Vocês devem cuidar um do outro a partir de agora, tudo bem?
Jaehyun olhou nos olhos castanhos idênticos aos seus, os dois compartilhavam muitas características e viviam dizendo que Jaehyun seria assim quando fosse mais velho. Sua mãe dizia que tudo bem serem parecidos de aparência, mas ele não devia ser nada igual ao seu pai em personalidade, porque seu pai era fraco e tolo e aquela seria a sua própria ruína. Jaehyun só iria descobrir por conta própria, que isso era verdade, anos depois.
O garoto soltou a mão de seu pai e deu um passo na direção dele, atraindo seu olhar para aquela pele pálida e os fios loiros que pareciam brilhar mesmo num dia como aquele. O menino estendeu a mão para Jaehyun e seus olhos pareciam sérios, mas seu sorriso era doce e cheio de inocência juvenil. Jaehyun focou em seus olhos amendoados, negros e delineados como se alguém os tivesse desenhado e focado tanto em deixá-los perfeitos que aquele era o ponto mais interessante para olhar.
— Oi, hyung! Meu nome é Kim Doyoung — ele se apresentou com ênfase na separação silábica de seu nome: Kim-Do-young; e sorriu com dentes fofos que lembravam um coelhinho.
Jaehyun virou para sua mãe sem fazer nada além de ignorá-lo. Estava chateado com sua mãe por fazê-lo ir até ali contra sua vontade, e com seu pai por nunca ter tempo para ele. Uma vez ele havia dito que o levaria para viajar e conhecer seus primos, disse que era importante Jaehyun crescer com eles, conhecê-los, analisá-los. Ele adiou todas as vezes.
— Ele já chegou, posso voltar? — perguntou Jaehyun, tremendo um pouco de frio com o vento. Doyoung estava mais firme do que ele, apesar de parecer bem fraco e suscetível.
A mulher o encarou com o mais próximo de orgulho que ele já vira vindo dela, e assentiu. Jaehyun gostou da sensação. Ela ficou orgulhosa porque ignorara seu pai e aquele menino? Só por isso? Ele podia fazer isso de novo, era fácil. Só para vê-la orgulhosa dele.
Quando ele deu as costas aos recém-chegados e foi para dentro, ainda podia ouvir seu pai dizendo para o garoto com gentileza:
— Você deve se apresentar como Jung Doyoung agora, está bem? Jung. — Uma pausa silenciosa seguiu e então ele continuou: — Somos a sua família agora. A família cuida uns dos outros.
Jaehyun olhou por cima do ombro para o menino loiro e para o guarda segurando aquele guarda-chuva, mas agora fechado. Seus olhos voltaram ao menino loiro que sorria para seu pai, logo em seguida ele o viu se virar em sua direção.
Os dois se encararam sem sorrisos por um único instante, mas pareceu o suficiente para conversarem com os olhos. Doyoung mostrou os dentinhos da frente novamente, em um sorriso para ele, e Jaehyun foi embora.
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Ruthless » dojae
FanfictionHá anos atrás, Jaehyun fugiu de casa com a perspectiva de ter uma vida diferente da que sua família preparou para ele. Ele acreditou dia após dia que poderia ter uma vida normal e ser quem queria ser, mas sempre que dava um passo adiante, alguma coi...