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" Causa da morte : Asfixia "

" Causa do incêndio: Explosão do botijão de gás"

" vítimas: Zeca Garlhaço e Talia Garlhaço "

" Duas mortes confirmadas."

Isso era o que as vozes ao meu redor diziam, papai e mamãe estão mortos, foram encontrados os dois carbonizados no lugar onde seria o quarto.

E tudo que tenho em mãos, são potes de porcelana com suas cinzas.

Eu não consegui dizer, que eles seriam avós, e também não me despedi.
Essa não foi a morte que imaginei que eles teriam, sempre pensei que seria de velhice, e não por Asfixia, pelo menos isso comprova que quando o botijão explodiu eles já estavam mortos, eles não foram queimados vivos.

- Amor!- A voz de Gustavo nunca esteve tão calma quanto agora. - Vamos deixar eles irem em paz, se despeça.- No automático coloco os vasos sobre as prateleiras do cemitério, uma foto de ambos juntos e então flores.

- Que a luz o guie.- Acendo a velinha do papai.- Que a luz a guie- Acendo a da mamãe.- Pai, mãe, eu não pude dizer antes, vocês vão ser avós, abençoem meu filho.- Peço com a voz embargada e os olhos carregados de lágrimas. - A Valentina ou o Benjamin, eu prometo que vai ficar sabendo de como vocês foram pais maravilhosos.

Sinto os braços de Gustavo me abraçarem por trás, me viro tentando me esconder em seu corpo, desejando que a dor suma de alguma forma.

Gustavo acaricia meu cabelos e então beija minha testa.
- Vamos para casa, você precisa descansar.- Deixo que ele me guie para longe dos meus pais, para fora do edifício e então para fora do cemitério.

Antes de entrar na camionete volto a olhar para trás.
- Está tudo bem amor.- Os braços de Gustavo me envolvem com carinho e proteção, um beijo singelo é deixado em minha testa, e um arfar cansado ou triste.- Vamos...- O caminho para casa foi silencioso, as lágrimas se esgotaram e tudo que eu conseguia sentir era tristeza, eles não mereciam um fim desses.

Eles sempre foram tão maravilhosos, e deram o melhor de si para que nunca nos faltasse nada, e eu queria pelo menos poder ter dito que eles seriam avós.

***

Algumas semanas se passaram desde a morte de meus pais, por quase uma semana, eu não consegui comer, estava sem fome, cansada por não conseguir dormir e ter pesadelos com o fogo.

Sentada no jardim, observando tudo e nada ao mesmo tempo, não percebo alguém se aproximar de mim, e foi só quando ouvi a voz de Ananda que sai do meu mundinho.
- As flores estão lindas! - Ananda se senta ao meu lado no banco.- Não posso dizer que te entendo Alissa, afinal essa dor é só sua, e eu não vou tentar te consolar, isso é inútil.- Olho para ela com deboche.- Eu vim aqui na verdade, pra mandar você parar de querer se enterrar no passado e focar na criança que tem dentro de você, no seu futuro.- A criança...

Passo as mãos em minha barriga ainda sem nem um resquício de inchaço.
- Eu não consegui dizer Ananda...- Meus olhos se enchem de lágrimas novamente.- Eu não consegui dizer, que eles vão ser avós...

- Mas você não precisa dizer.- Ananda segura minha mão com um sorriso carinhosos no rosto.- Tio Zeca e tia Talia com toda certeza vão cuidar dessa criança e você sabe disso... Então para de chorar e comece a cuidar do neto deles.- A voz tem um tom de seriedade, tristeza e dor misturados, eu nunca tinha visto Ananda assim.

- Tem razão, eles devem estar me xingando nesse momento.- Falo com um pequeno sorriso no rosto.- Devem querer me dar boas varadas...

- Isso aí, agora ânimo, sua dor não vai passar, mas com o tempo ela diminui.- Ananda levanta do banco super energética com o enorme sorriso no rosto.- Mas você precisa de um banho, isso vai deixar as coisas um pouco melhor, vamos cuidar do seu cabelo, da sua pele, unhas e tudo em geral, tô cansada de te ver jogada por aí feito uma mendiga...

- Não precisa esculachar.- Dou risada sabendo que Ananda vai querer tudo que falou.

Ela até mesmo supervisionou meu banho, e fez eu me depilar, ela disse que vai ficar difícil depois com a barriga grande, fizemos hidratação de pele e cabelo, enquanto isso ela pintou minhas unhas das mãos e dos pés.

Também recebi uma massagem, dessa vez com a ajuda dos meus sobrinhos, e no fim do dia, eu estava parecendo mais apresentável do que antes.

E quando eu bati na porta do escritório de Gustavo, não demorou para que ele me respondesse.

Os olhos de Gustavo brilharam ao me ver, foi então que eu percebi, meu marido estava com a barba por fazer e o cabelo um tanto comprido, ele também vinha se martirizando, tratei de colocar um sorriso no rosto, afinal eu vou ser mãe, e eu quero ser uma boa esposa.

- Oi amor.- Falo sentindo minhas bochechas corarem com a forma que ele me olha, admiração, paixão, luxúria e amor.
Me pergunto como consegue ser tão bonito mesmo não estando bem cuidado.

- Amor! - Por um momento ele pareceu não acreditar, mas então abriu um enorme sorriso e veio até mim.- Você está tão linda!

- Ananda me ajudou, tivemos um dia de garotas.- Dou um sorriso fraco e me sento em uma poltrona de frente para a mesa dele.- tivemos um dia de mulheres...

- Como está se sentindo?- Gustavo sai de trás da própria mesa e para de pé em minha frente.

- Acho que, bem melhor do que ontem.

- Estava com tanta saudade de ver seus olhos brilhando desse jeito.- Viro o rosto envergonhada com ele acabou de dizer.- temos uma ecografia hoje, podemos ir ver seus pais, se quiser.

- Não sei se estou pronta, ainda dói, e na verdade, não sei se algum dia vai parar de doer, mas eu tenho que continuar, pelo meu filho.- Falo com convicção olhando nos olhos de meu marido.

Eu AlissaWhere stories live. Discover now