6; Medo do medo, pavor.

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     Um grande festival de exposições se aproximava, e cada um dos alunos que frequentava a Belas Artes estava curioso para saber quem receberia a tarefa de produzir a abertura do evento. O ano era 1914, já haviam se passado dois anos desde a sua chegada em Paris, e a cada dia ficava mais farto da presença daqueles ricos mesquinhos. Aos poucos, Park adquiria algumas manias esdrúxulas de algum de seus companheiros de aula, que eram apontadas pelo seu melhor amigo e imediatamente corrigidas. Tudo que não queria era aproximar-se daqules inúteis. E Jean Dubois era ótimo em puxar o tapete de Jimin, comprando-lhe inúmeras roupas de grife, pois o velhote tinha a certeza de que seria ele o indicado para a abertura do festival. E jurou para sí mesmo que se viessem lhe falar sobre aquilo, não iria, jamais, aceitar. Estava até o pescoço com a escultura do maldito Romanov, e não queria mais um peso em suas costas. Mas jurar para sí mesmo e comprir eram duas coisas diferentes, e quando a diretoria lhe chamou, ele rezou para que fosse uma expulsão pelas artes nas paredes, mas a realidade nua e crua lhe devorou quando o Senhor Lafayette, diretor, pediu-lhe que produzisse a droga da abertura. Agora, o recém-loiro batia com a própria cabeça contra a bancada de trabalho do seu ateliê, rabiscando uma folha com algumas ideias do que faria. Seu melhor amigo acompanhava-o, dando apenas apoio moral, já que não entendia absolutamente nada sobre escultura e pintura.

-Por que você não faz uma escultura de gesso, como fazia na Rússia? Você me falou que é bem mais rápido e muito mais fácil do que o mármore e pedra. 

-Tae, o menor dos meus problemas é a porra do material. Eu não tenho ideia do que esculpir, entende, queridinho?- Atirou um pincél na direção de seu amigo.- Eu estou gastando toda a minha capacidade cerebral para esculpir Lúcifer, e eu tenho apenas uma perna e um pedaço da pélvis.- Atirou outro pincél- E já tem dois anos que estou batendo com esses martelinhos ridículos contra esse material resistente, apenas para que o Romanov não corte minha cabeça.- Ameaçou jogar um dos martelinhos, mas não o fez. 

-Estressadinho.- Aproximou-se do menino, que voltou a bater com a cabeça na bancada.- Olha, que tal tentar mudar a estratégia? Por que ao invés de usar isso,- Tocou com a ponta do indicador na têmpora do loiro- você não tenta usar isso.- Tocou com a palma no peitoral dele. 

-Que papinho motivacional baixo, Tae. Se eu esculpir o que está no meu coração, vai sair um órgão genital, e aposto que esse seria o estopím para minha expulsão daquele lugar. Se bem que essa é uma ótima ideia!

-É para esculpir o que está no seu coração, moleque, não aquilo que você queria que estivesse na sua boca!- Suspirou.- Talvez você precise de um tempo sozinho para que as ideias se ajustem em sua cabeça, amigo. Se precisar de mim estarei na Eiffel. O pôr do sol está magnifico hoje, afinal, é verão.

     Park Jimin passou horas consecutivas enfiado dentro daquele lugar, completamente sozinho, com os olhos sem vida de suas pinturas e esculturas olhando-o com uma espécie de julgamento sórdido, e por mais que fosse irracional pensar que aquelas coisas lhe observavam, sua cabeça colapsando fazia-o ter a certeza absoluta de que suas obras de arte estavam vivas e que a qualquer momento pulariam em seu pescoço e matariam-no. Ao fundo, ouvia o som suave de Swan Lake, tão baixa que qualquer mínimo barulho ocultaria sua presença, mas ainda assim, para Jimin, parecia alta demais, a ponto de gerar uma dor de cabeça insana. Tchaikovsky foi um talentoso artista, compositor de uma das mais conhecidas obras dentro de qualquer meio artítistico. As bailarinas dançando lindamente ao som de sua melodia abençoada eram uma joia rara, e Park conheceu aquela arte quando seu melhor amigo chamou-lhe para assistí-lo. E foi belíssimo. Desde então, Swan Lake tocava em todos os seus processos criativos, por quê fazia-o lembrar dos sentimentos conflitantes que a peça de teatro despertou em seu ser. Mas naquele momento, nada além de medo passava por suas entranhas e veias. Medo do medo. Uma sensação de que algo ruim estava para acontecer, um mau presságio ridículo, pois o próprio não acreditava em superstições, mas aquela coisa em seu âmago contorcia-se, implorava para que ele ouvisse seu sexto sentido. 

Sombras do LevanteWhere stories live. Discover now