A morte do papai

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Na diretoria eu chorava muito, eu não quero que minha mãe se decepcione comigo, briguei logo no primeiro dia de aula. Será que vou ser expulsa da escola?

- O que vocês fizeram foi muito errado! - gritou a gorda, quer dizer, a diretora, batendo na mesa. - Clara, você acabou de chegar na escola e já está desse jeito. E você Yoko, é a segunda vez que você vem pra diretoria em menos de quinze dias, que vergonha!

- Mas diretora, eu estava quieta comendo e ela veio e derrubou meu prato. - falei enxugando as lágrimas

- E você acha que socar o nariz da sua colega iria resolver? - disse ela me encarando, estava tão perto que senti seu bafo

- Aposto que foi o amiguinho dela que mandou! - Yoko disse limpando o sangue do nariz com um lenço

- Cala a boca, vadia! - gritei indo em sua direção para lhe bater novamente, ninguém precisa saber sobre o Fred.

- Clara! - gritou a diretora, me segurando para que eu não batesse na Yoko. - Chega! Amanhã vocês só entram acompanhadas dos pais.

Meu Deus, onde está Fred em uma hora dessas?
Tivemos que ficar de castigo no banco da diretoria, enquanto as outras crianças se divertiam no parquinho. Depois de muito tempo bateu o sinal da saída, me levantei e fui correndo esperar a mamãe no portão. Todos já haviam ido embora, só havia eu, por que mamãe estava demorando tanto? Será que ela me esqueceu? Ótimo, no meu primeiro dia de aula, fui mal recebida, briguei na escola e só entro com meus pais, e pra piorar minha mãe me esquece!
A professora estava ao meu lado, esperava ansiosa para que minha mãe chegasse, afinal, ela também queria ir embora. Finalmente vejo um carro preto, não sei o modelo, mas reconheço o carro da mamãe de longe. Ela parou na frente da escola, seus olhos estavam vermelhos e inchados, estava na cara que ela chorou bastante, mas por quê? Era pra ela estar feliz, pois se o plano de Fred tiver dado certo, papai voltou a gostar da mamãe.
Bom, entrei no carro e mamãe saiu cantando pneu na velocidade máxima, ela nem quis ouvir o que a professora iria dizer sobre o meu comportamento. Enquanto Fred tentava controlar o riso.

- Mamãe, hoje foi um péssimo dia! Odiei a escola...sabe, tem uma meni... - tentei me explicar, quebrando o silêncio, mas ela me interrompeu

- Filha, depois a gente conversa. - ela disse sem conseguir conter o choro. - Tenho uma coisa muito triste para te contar.

Maria - flashback on
Após levar minha filha à escola, fui para o centro da cidade fazer minha entrevista de emprego. Era como atendente de uma simples mercearia,(cidade pequena é assim), e alguns serviços extras de doméstica na casa da dona, mas o salário era ótimo. Chegando lá fiz uma demostração de limpeza e fiz o que eu mais sabia, atender, afinal fui secretária. Não tinha como eu não passar, dito e feito, consegui o emprego, já eram 09:30, então comprei pães para Armando e voltei pra casa.
Tudo estava silencioso, por um momento estranhei, mas depois, é claro, imaginei que Armando estivesse dormindo. Entrei e fui diretamente para o quarto, Armando não estava lá, apenas seu celular em cima da cama, resolvi dar uma olhada e vi uma mensagem de uma tal de Cinthia dizendo "Bom dia meu amor", resolvi checar a caixa de mensagens e li uma em especial que Armando dizia amar a tal mulher e queria se divorciar de mim, não tive coragem de ler o resto, já com lágrimas no rosto fui procurá-lo, mas o que me esperava era bem pior. Encontrei meu marido estirado aos pés da escada que levava para o sótão, gritei em desespero e um fazendeiro que passava por perto me escutou e entrou na casa. Morto. Sim, o amor da minha vida está morto. Foi o que a polícia disse e o IML confirmou, pior do que descobrir que ele não me ama, é descobrir que eu nunca mais vou vê-lo. Meu Deus, hoje é o pior dia da minha vida, o resultado da autópsia sai amanhã e o enterro será quarta-feira.
Flashback off

- MAMÃÃÃE!!! - gritei desesperadamente, mamãe estava prestes a bater em um caminhão.

Ela tentou frear, mas isso não adiantaria, pois já estávamos muito próximas, foi aí que Fred pulou a janela e empurrou o carro para trás, fazendo com que o mesmo parasse e evitando a batida. Mamãe e todos em volta ficaram assustados, não com o que aconteceu, pois só eu posso enxergar Fred, mas sim, com a incrível marca do corpo de um garoto, que ficou amassada na traseira do caminhão. Na tentativa de nos salvar, Fred ficou entre nosso carro e o caminhão, e mesmo assim não se machucou, ao contrário, ele parecia mais forte.
Depois de nos recuperarmos do susto, fomos embora, antes que as pessoas nos cercassem e viessem nos interrogar. Chegando em casa, mamãe sentou-se no sofá e me colocou em seu colo.

- Filha, tenho uma coisa muito ruim para te contar, eu te peço para ser forte. - mamãe disse, tentando conter o choro, que insistia em vir.

- Cadê o papai? - perguntei sem entender nada, enquanto isso Fred foi para o meu quarto, para nos deixar a sós.

- É sobre ele mesmo que eu quero falar. Seu pai foi para o céu filha... - disse ela me abraçando em seguida, enquanto eu comecei a chorar.

"Foi para o céu", os adultos falam isso como se eu não entendesse o que é morrer, papai morreu, isso quer dizer que eu nunca mais vou vê-lo. Eu não entendo, ele não devia ter morrido, era para ele estar aqui agora, apaixonado pela mamãe, o que deu errado nos meus planos?
Depois de muito tempo abraçadas, mamãe me deu um banho e me levou para o quarto, eu não quis ir lá fora, queria tanto o papai aqui agora, mesmo depois do que ele fez.
Sem perceber me deitei na cama e comecei a chorar, até me esqueci que Fred estava presente.

Fred, o Amigo ImaginárioOnde as histórias ganham vida. Descobre agora