Capítulo 6

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Não foi só a voz de Ricardo que soou nervosa. Ele próprio estava uma pilha de nervos. 

Na noite anterior, por insistência de Ellen, estivera na convenção e cumprimentara o empresário que fechara o aluguel do espaço, deixando claro que estaria ausente nos dias seguintes, por conta de compromissos anteriormente agendados. Mentira bem e sem hesitar, visto não haver compromisso algum em sua agenda.

Não conseguira seguir seu plano de permanecer na torre em que o evento aconteceria, indo para seu quarto, antes mesmo de seu começo. Não estava conseguindo se concentrar em nada e se aborrecendo com qualquer coisa. Para não descontar seu nervosismo em pessoas que nada tinham a ver com o que estava sentindo, preferiu o sossego de seu quarto.

Quando recebera o telefonema da recepção, estava se preparando para tomar um banho e sair. Talvez acompanhado, ainda não havia se decidido. A única certeza era que desejava se ausentar pelas próximas horas; ir para qualquer lugar em que o passado não batesse à sua porta.

- E onde está a Ellen que não pode resolver isto? – perguntou mal humorado.

- Falei com ela, senhor Vidal, porém, respondeu-me que, segundo suas ordens, era para ela se dedicar exclusivamente à convenção. Ela sugeriu-me que resolvesse tudo – Fátima escolheu bem as palavras, visto que só havia escutado um "Vire-se" – Porém, temo que não tenha autoridade, tampouco experiência, para fazê-lo – foi sincera.

- Tudo bem, estou descendo – disse sem esconder o aborrecimento.

Mesmo o banho tendo ficado para depois, livrou-se da gravata e do paletó, optando por um visual ainda sóbrio, porém, muito menos formal.

Desceu o mais rápido que pôde, encaminhando-se à recepção.

- Então, o que está acontecendo? – sua pergunta saiu dura e aborrecida, fazendo com que a jovem se recordasse do motivo pelo qual ele lhe inspirava temor.

- Veja o senhor mesmo – Fátima apontou o lado para o qual ele devia olhar e não foi preciso de muito para perceber que ela não mentira. Uma discussão fazia com que alguns hóspedes se aproximassem para entender o que acontecia. Não podia ver além disto, porque o número de pessoas que se juntavam para entender o que estava acontecendo só fazia aumentar, diminuindo seu campo de visão.

- Hoje a noite promete! – inspirou e expirou lentamente, como se pedisse paciência. Tinha a intenção de resolver o mal entendido, fosse ele qual fosse, apaziguar a situação e voltar para seu quarto. Por isso caminhou com passos largos e decididos na direção em que se dava o desentendimento. Queria entender a natureza do conflito, pois a recepcionista não tinha conseguido se fazer entender, quando ligara aflita para ele.

Sua confiança o abandonou no exato momento em que, não tendo mais a visão bloqueada pelos curiosos, pôde enxergar as pessoas envolvidas na discussão. A cor fugiu de sua face ao notar que seus planos resultaram inúteis: uma delas era Júlia e estava furiosa com o segurança que tentava intimidá-la, segurando-a com força pelo braço.

Ao enxergar a cena, a racionalidade foi a segunda a deixá-lo, não conseguindo pensar em mais nada, nem mesmo nos motivos de não querer encontrá-la. Só via aquele homem, muito maior do que ela, segurando-a daquela forma.

- Você não ouviu a senhorita? Largue-a imediatamente, se não quiser que eu mesmo o obrigue a fazê-lo – exigiu e por segundos desejou que o segurança o desobedecesse, pois queria ver como ele se saia com alguém de seu tamanho.

Ao ouvir sua voz, Julia virou o rosto imediatamente e seus olhares se encontraram por uma fração de segundos. Ricardo entendeu a razão de ter querido evitá-la a todo custo: apesar de tanto tempo longe, um simples olhar ainda tinha o poder de deixá-lo impactado. Para completar, teve que admitir que ela estava muito bem, talvez ainda mais bonita do que quando estavam juntos.

Doce Sabor de Pimenta (Degustação)Opowieści tętniące życiem. Odkryj je teraz