A Antiga Nova Casa

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O céu estava com pesadas nuvens cinzas e pequenas gotas suaves começavam a cair. Imaginei que o meu primeiro dia de volta ao mundo real poderia ser um pouco mais colorido, mas como tudo na minha vida era obscuro, o cinza cairia muito bem. O bairro parecia mais sombrio do que conseguia me lembrar, poucos carros nas ruas, poucas pessoas, e a garoa fina dava um ar mais gótico ainda. A floresta ao longe parecia tão misteriosa com um suave nevoeiro que lhe abraçava. Era verde. Verde e sombria. Aquela floresta era familiar, eu costumava brincar ali e de certa forma ela agora parecia sorrir pra mim. Voltei a olhar pra rua e as casas que passavam, já estava perto, só mais algumas ruas e estaria de volta em minha casa, mas não com meus pais, não com as pessoas que eu queria que estivessem ali, tirando o fato que finalmente iria abraçar meu irmãozinho, o resto era tudo desconfortante.

O carro parou e fiquei sentada por alguns segundos antes de sair e encarar minha antiga nova casa, meu coração estava mais acelerado que o normal, entrelacei meus dedos e olhei para baixo. Eu estava com medo. Medo de como seria de agora em diante.

— Eu vou tirar suas malas. – o motorista falou e saiu de dentro do carro. Finalmente tive coragem e fiz o mesmo. A casa continuava a mesma de sempre, rosa e grande. Me trouxe um sentimento nostálgico e triste. A porta se abriu e uma mulher alta de cabelos loiros e muito sorridente saiu de lá e correu para meu encontro.

— Coral! – ela me abraçou com força. – Senti tanto a sua falta!

— Também senti sua falta, tia Mikaella. – falei tentando esboçar um sorriso convincente, mas naquele momento o máximo que conseguia era um sorriso amarelo e sem vida.

— Mikaella? Nããoo! Você sempre me chama de tia "Mika", não quero que nada mude.

— Desculpe, é que... ainda é difícil.

— Entendo querida, mas não se preocupe, logo, logo tudo voltará a ser como antes. Agora venha, tem alguém querendo lhe ver.

Fiquei parada por um segundo, não tinha como tudo voltar a ser como antes, meus pais nãos estavam mais ali, eu nem mesmo sabia como era o antes. Minha cabeça parecia estar mais nublada que aquele céu. Um vento gelado tocou meu rosto subitamente, parecia a mão de um fantasma me tocando e por algum motivo me fez virar o rosto para a casa que estava atrás de mim, a casa do outro lado da rua.

A casa era branca com uma linda varanda, mas não tinha movimento de ninguém ali. Eu sabia perfeitamente quem morava ali e lembranças fragmentadas começavam a surgir. Um garoto que era tão branco como papel, o sorriso de lado de quem parecia sempre estar com a razão, a amizade. Mas eu não lembrava o rosto, não lembrava a voz e nem o jeito que andava. Também lembrei quem mais morava ali. Um arrepio percorreu meu corpo fazendo-me estremecer com as pequenas lembranças. Dra. Elza era minha vizinha, era avó do meu ex melhor amigo e era o monstro dos meus pesadelos.

— Não se preocupe, Coral. – Mikaella colocou a mão no meu ombro me fazendo voltar a atenção pra ela. – Dra. Elza prometeu que vai fazer um acompanhamento discreto. Ela só quer se certificar que você está bem. Agora vamos, tem alguém querendo lhe ver.

Acompanhei minha tia e entramos dentro de casa finalmente, logo na entrada dei de cara com um banner escrito "seja bem vinda ao lar, estávamos com saudades" e um lindo bolo na mesa. Olhei ao redor e então meus olhos bateu na única pessoa presente no local.

Um garotinho de cabelos marrons e encaracolados estava em pé timidamente no meio da sala.

— Toby... – sussurrei e corri para abraça-lo. Era o conforto do abraço que mais desejei enquanto estive presa no hospício. Ele hesitou por um momento, mas depois também me abraçou e apoiou sua cabeça em meu abdômen. – Senti tanto sua falta. – falei.

Coral RosesWhere stories live. Discover now