Guia Daniel

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Não imaginei que Tiago encontraria tempo em meio as suas obrigações reais para jantar conosco duas vezes nessa semana, e foi justamente isso que aconteceu, ele bem que tentou ser agradável comigo, isso foi até eu comentar sobre minha excursão ao museu, depois disso o humor dele azedou e isso me deixou irritada, por fim acabamos tendo uma discussão calorosa durante o jantar. Parecia que se dependesse dele eu não podia colocar os pés fora de casa.

Acabei sendo ríspida na segunda noite quando ele perguntou se eu tinha saído novamente para outra excursão perigosa. Seu tom autoritário me enfezou tanto que o larguei no meio do jantar e subi para o quarto. Não entendia essa obsessão dele com cada passo meu. Por isso evitei contar que tinha mandando um bilhete ao rapazote do primeiro dia pedindo para ele aparecer em casa, não me senti a vontade de contar. Se com um passeio sem correr nenhum perigo algum o rei surtou, como ele reagiria ao saber que eu esperava receber em minha casa um dos arruaceiros e assaltantes das ruas? Com certeza mandaria enforcar o pobre garoto.

Já fazia dois dias que eu tinha mandado o bilhete a Daniel e ele ainda não tinha enviado uma resposta. Hoje o dia parecia mais chato que o normal, eu queria fazer algo mais do que observar os transeuntes pela janela, mais do que simplesmente observar os pobres pedindo ajuda na rua e recebendo como resposta chutes e ofensas. Já estava ficando incomodada com esse descaso com a fome dessas pessoas.

Logo ouvi palmas e corri atender, imaginei que fosse Tiago já que ele não apareceu desde o jantar nada agradável, e apesar de todos os nossos encontros não terem sido maravilhosos, eu queria vê-lo. Mas minha alegria chegou igualmente ao ver os olhos verdes e joviais me encarando.

Daniel me olhava com curiosidade e com um sorriso maroto nos lábios. — Muito cedo para cobrar uma dívida, Amélia.

— Perdoe-me, não o chamei para cobrar nada, na verdade eu gostaria de pedir um favor.

Os olhos verdes brilharam maliciosos. — Ou seja, uma cobrança.

Apertei os lábios pesando cada palavra, não queria que ele negasse o que eu ia pedir, mas também não queria que ele pensasse que eu estava cobrando alguma coisa, isso não seria certo. Ele era um comerciante, então o mais certo com ele seria agir da mesma forma.

— Não sabia que oferecer emprego era uma cobrança de dívida.

Isso o pegou de surpresa porque ele pareceu ligeiramente nervoso, talvez não tivesse a expectativa de algo assim acontecer, e isso me mostrou um pouco mais sobre ele, e eu gostei daquela reação.

— Que tipo de trabalho eu poderia lhe oferecer? Não sou homem formado para ser um carregador de valia, ou pelo menos um que alguém estaria disposto a pagar pelos serviços, nem mesmo posso me alistar agora que a idade não mais permite rapazes da minha idade, e também não sou criança o suficiente para que confiem em me mandar entregar bilhetes.

Senti pena na angústia da voz dele, o pobre não tinha nenhuma expectativa realmente.

— Venha tomar chá comigo Daniel. Acabei de tirar um bolo do forno e então lhe direi para qual função eu gostaria de contratá-lo.

Ele me olhou desconfiado e esperançoso ao mesmo tempo, suspirei um pouco chateada com essa desconfiança.

— Não está acostumado com alguém o tratando com respeito, pois não?

Ele levantou os ombros e passou por mim indo em direção a porta. — Você é a primeira a me oferecer isso, na verdade ando achando que você é a primeira a ser gentil com esse povo, você não pode ser desse reino Amélia, pois não age como os outros.

Segui atrás dele com um sorriso de lado, ele não poderia estar mais certo, mas também fiquei preocupada, não podia agir diferente das pessoas desse reino, ou eu faria olhos curiosos se virarem para mim. No entanto pensei no que meu pai falou sobre não ser refém do medo, então abri a porta e sorri para Daniel.

Tratado dos Párias- O rei rebelde. ( Degustação)Where stories live. Discover now