Vila dos orfãos

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Amélia

O menino de recados estava demorando, olhei mais uma vez para a rua de terra batida procurando avistá-lo entre os tantos que circulavam por ali. Comecei a ficar preocupada se ele tinha mesmo ido levar o recado ou fugiu com o pagamento.

Ele havia pedido o dinheiro adiantado, talvez por ver o estado das minhas roupas e desacreditar que receberia depois do trabalho feito. Bom, se eu olhasse pra mim mesma no espelho também desacreditaria que eu tivesse condições de pagar qualquer coisa. Pelo menos o disfarce era bom, se funcionaria eu só descobriria se o menino fizesse a parte dele.

Estava sentada no chão perto da estalagem com o chapéu puxado no rosto. A mulher toda suja de gordura não tinha me deixado esperar lá dentro porque segundo, ela eu estava fedendo e ia espantar os clientes.

Que insolente! Ela também não estava com o cheiro melhor que o meu, e a estalagem dela nem tinha clientes!

— Está a minha procura, senhor?

Levei um susto, ele tinha chegado sem fazer nenhum barulho, mas estava ali. Marcos finalmente estava ali, restava agora ele aceitar me ajudar depois da animosidade do nosso primeiro encontro.

Levantei a cabeça preocupada com sua reação, mas ele não me reconheceu! Por fim ao olhar mais de perto seus olhos se estreitaram desconfiados, praguejei mentalmente, ele tinha me reconhecido sim, então o disfarce não era tão bom assim.

— O quê! Menina o que faz aqui? E porque está usando essas roupas?

Levantei devagar, ele menção de me ajudar, mas depois de pensar um pouco desistiu e abaixou a mão. Pisquei algumas vezes tentando encontrar as palavras certas, por fim não havia.

— Preciso de sua ajuda.

Ele cruzou os braços em desafio e falou debochado. — Precisa é? Vai me empurrar agora até que eu aceite te ajudar?

Ah que ótimo! Orgulhoso até a raiz dos cabelos. Cruzei também os braços na defensiva e rebati no mesmo tom.

— Você mereceu, destratou o homem que está tentando te ajudar e ainda veio com grosseria para cima de mim sem nem me conhecer.

Para minha surpresa ele assentiu e com o rosto amenizando um pouco a carranca ele falou mais suave.

— Tem razão, exagerei um pouco, mas o que quer de mim?

Marcos era conhecido por todas as crianças, ainda assim nenhuma delas havia aceitado me levar até ele, somente aceitaram trazê-lo a mim se ele assim decidisse. Ele podia ser rabugento, mas claramente tinha o respeito daquele povo mais humilde, se todos o conheciam então ele poderia realmente me ajudar.

— Preciso saber onde é esse lá que meu pai não quis me contar.

Ele apertou os olhos tentando entender. — Lá? Que lá é esse?

Revirei os olhos sem paciência. — Se eu soubesse não estava desesperada para descobrir, não acha?

Ele continuou confuso. — Olha não estou entendendo nada moça.

Respirei fundo e decidi esmiuçar a questão. — Quando ele te falou sobre seu pai aqui na estalagem ontem, lembra?

Ele assentiu e eu continuei.

— Você perguntou a ele se era por isso que ele insistia tanto em te tirar de lá, só que não deu detalhes. Contratei um informante e ele vasculhou a vila dos procriadores procurando por Marcos filho de Uzias. Depois ele procurou na casta neutra, ninguém sabia de sua existência.

Tratado dos Párias- O rei rebelde. ( Degustação)Onde as histórias ganham vida. Descobre agora