A Alcateia

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Em um pátio de escola, um menino de oito anos desviou do olhar da mãe. Com o uniforme sujo de lama e sangue, o rosto machucado e os punhos fechados, o pequeno Andy se preparava para ouvir o sermão. A mulher tinha cabelos de um loiro escuro e olhos claros — assim como os herdados pelo filho — e usava um conjunto social, com um salto alto que batia nervosamente no chão.

— Eu não acredito que você fez isso de novo, que vai ser expulso de outra escola! — Olhos cheios de raiva, pausa para fumar. — O que você tem nessa cabeça, moleque? Merda!?

— Eles que provocaram — respondeu ele. — Se alguém me provoca, eu bato mesmo! — Sorriso desafiador no rosto.

Um tapa fez o menino dar um passo para trás. Sua mãe tremia de raiva quando se aproximou, apertando o rosto dele com força, olhos com lágrimas e voz tremida.

— Quem tá provocando aqui é você! — gritou ela, sua voz ecoando pelos corredores da escola. — Será que não consegue ficar um dia sem arrumar problemas, seu merdinha!?

Ela largou o menino, que abaixou a cabeça para esconder as lágrimas que tentavam forçar saída, enquanto a mãe se recompunha e limpava o rosto.

— Foram duas escolas já, Andy, duas. Você não pode ser expulso dessa também. Tudo por insistir em mandar as crianças dos outros pra enfermaria. — Pausa para apagar o cigarro com a ponta do sapato. — Por sua causa vou ter outra conversa com o escroto do diretor.

Ela parou um instante e olhou para o menino, e com ar de culpa, disse:

— Me espera aqui fora como um bom menino, tá bem? — E foi na direção da professora de olhar recriminador, enquanto o garoto finalmente deixava as lágrimas saírem.

***

Andy voltou a si sentindo cheiro de carne assada, de mato e saliva. Quando abriu os olhos, percebeu estar deitado na relva, sentindo dor na nuca e enjoo. Já era noite, e havia um cão lambendo seu rosto, ao que ele se ergueu, sentando e enxotando o cão com os braços.

"Gatas acusadoras e cães lambedores... minha vida virou um zoológico", pensou. E logo riu, lembrando que ele mesmo era um bicho muito pior que qualquer animal de estimação.

A sua volta, um acampamento: barracas montadas, grelha acessa, a carcaça de um cervo, uma caminhonete e duas motos estacionadas. Cuidando do churrasco havia um homem enorme, gordo e imponente, com cabeleira e barba grossas e ruivas, além de muitos pelos no dorso descamisado. Próximo a ele, o careca cheio de piercings do bar, mal humorado e entornando vodca. Sentados em troncos tombados, haviam o tal Malcom, com um prato com a carne numa mão e uma cerveja na outra, além de uma mulher apoiada em seu peito, com cabelos curtos e mal tingidos de loiro, um cigarro na mão e fumaça saindo dos lábios. Ela usava um vestido largo que cobria uma barriga de grávida de vários meses.

Escorado em uma árvore, um garoto aproximadamente da idade do Andy cuidava do cabelo da bela negra que o rendeu no bar. O rapaz vestia uma calça justa, um colete com blusa branca por baixo e tinha uma franja caída sobre o rosto levemente maquiado. A jovem foi a primeira a notar que o estranho acordou, e fez um gesto para o amigo deixar o que estava fazendo.

Já de pé, Andy só enxergou escuridão e árvores em volta do acampamento, até que a garota fez um gesto que o convidou a se aproximar.

— Andy Valentine, dezesseis aninhos e sem grana, o que você faz por essas bandas, gatinho? — perguntou, jogando de volta para ele sua carteira e documentos.

Era a segunda vez em uma semana que alguém pegava sua carteira. Ele não estava gostando nada daquilo.

— Resolvi dar um rolê por ai. Agora me diz, o que você tem a ver com isso?

Filhos da NoiteWhere stories live. Discover now